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OPINIÃO ECONÔMICA
Os juros precisam cair!
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Quem examina os dados fica
com a impressão de que há algo de
errado com as taxas de juro no
Brasil. Como se sabe, apesar da
queda dos últimos meses, elas continuam extraordinariamente elevadas.
Há espaço para diminuí-las? Se
não houver, estamos lascados.
Com juros altíssimos e pesadas restrições à expansão do crédito interno, não teremos meios de fazer a
economia crescer em ritmo suficiente. A crise de desemprego continuará.
A desvalorização cambial, embora fundamental para o ajuste
das contas externas, não é suficiente para reativar a economia como
um todo. Como costuma ocorrer
em economias de porte continental, é relativamente baixo o peso
dos setores exportadores e dos que
substituem importações. Mesmo
que a conjuntura internacional
fosse mais favorável às exportações, os setores beneficiados pela
desvalorização não teriam capacidade de assegurar a retomada da
economia brasileira em seu conjunto.
A retomada depende essencialmente da reativação da demanda
interna. O que fazer para reativá-la? A fragilidade da situação financeira do governo não permite
contemplar reduções de tributos
ou ampliação dos gastos públicos.
Sobra a política monetária. Se o
Banco Central não puder baixar
as taxas de juro e estimular o crédito, a economia continuará patinando. O consumo privado continuará deprimido pelo desemprego,
pela queda do salário real e pelo
custo do crédito. E o investimento
privado, pela capacidade de produção ociosa, pelo custo do crédito
interno e pela reduzida disponibilidade de crédito internacional.
Será que o Brasil precisa mesmo
dos juros extravagantes que pratica? Vejamos os dados. A taxa de
juro de curto prazo alcança nada
menos que 17% ao ano em termos
reais (deflacionando a taxa nominal pela variação dos índices de
preços ao consumidor nos últimos
12 meses). Trata-se de uma taxa
exorbitante para padrões internacionais.
Não me refiro apenas aos países
desenvolvidos, nos quais os juros
reais de curto prazo não ultrapassam 4%. Mesmo economias de nível de desenvolvimento mais ou
menos comparável ao do Brasil registram juros muito, mas muito
menores do que os nossos.
Alguns exemplos. Na Colômbia,
país que enfrenta difícil situação
econômica e até guerra civil, a taxa real é de 8%. A Argentina, outro vizinho mergulhado em grave
crise econômica, pratica juros reais
de 9%. No México, cuja moeda
vem flutuando com certo sucesso
desde a crise de 1994-95, a taxa real
de curto prazo é de apenas 2%.
Os "mercados emergentes" do
leste da Ásia, mesmo aqueles que
sofreram brutais colapsos no passado recente, também praticam juros muito mais civilizados do que
os brasileiros. Na Coréia do Sul e
na Tailândia, por exemplo, a taxa
de curto prazo é de 6% em termos
reais. Nas Filipinas, 2%. Na Indonésia, chega a ser negativa em 6%.
Por que será que os nossos juros
são tão mais elevados? A reação
mais comum a essa indagação é
botar a culpa no déficit público,
que é realmente muito alto no Brasil, bem mais alto do que na maioria dos outros "mercados emergentes". Segundo essa explicação, o déficit gera desconfiança e obriga o
governo a pagar juros excepcionais
para refinanciar a sua dívida. A
redução dos juros dependeria, assim, de uma redução do déficit governamental.
Mas a explicação não parece inteiramente convincente. O curioso
é que o déficit do governo é, em larga medida, produzido pelas exorbitantes taxas de juro que incidem
sobre a sua dívida. No Brasil, a dívida pública é preponderantemente doméstica, denominada em
moeda nacional e de prazo bastante curto. Assim, a taxa de juro
de curto prazo, controlada pelo
Banco Central, é um dos principais
determinantes do déficit público.
O orçamento público primário
(isto é, o orçamento exclusive juros) registra significativo superávit
em 1999, segundo os dados oficiais.
Considerando o setor público como um todo (União, Estados, municípios e empresas públicas), o superávit primário aumentou de 1%
do PIB em janeiro-maio de 1998
para 2,8% do PIB em janeiro-maio
de 1999, um feito considerável para
uma economia em recessão. Se as
taxas de juro caíssem para patamares civilizados, o déficit público
não pareceria tão alarmante.
O déficit cairia não só porque a
despesa financeira do governo seria muito menor, mas também
porque a reativação da economia,
induzida pela queda dos juros,
permitiria a ampliação da receita
tributária e a diminuição de gastos
com o seguro-desemprego.
Vejam o paradoxo. Segundo a
explicação mais comum, os juros
são altos porque os investidores,
desconfiados do déficit público e do
crescimento da dívida, exigem alta
remuneração para ficar com os títulos do governo brasileiro. E, no
entanto, são justamente essas altas
taxas de juro que mantêm o déficit
governamental em nível preocupante!
Em outras palavras, os credores e
investidores exigem juros altos demais e com isso provocam o déficit
que os assusta, justificando o refinanciamento dos títulos a um custo exorbitante! Em última análise,
os juros são altos porque os juros
são altos.
Deu para entender? Parece coisa
de doido? Volto ao assunto na semana que vem.
Paulo Nogueira Batista Jr., 44, economista
e professor da Fundação Getúlio Vargas-SP,
escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjr@ibm.net
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