São Paulo, domingo, 22 de agosto de 2004

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LIÇÕES CONTEMPORÂNEAS

Sustentar o crescimento

ALOIZIO MERCADANTE

A nova política comercial praticada pelo governo do presidente Lula, no marco do processo de afirmação dos interesses nacionais e projeção da presença do Brasil no cenário internacional, produziu resultados notáveis em um período de tempo relativamente curto. As exportações, que no ano passado tinham crescido 21,1%, aumentaram 33,7% de janeiro a julho de 2004 em relação a igual período de 2003, puxadas principalmente pelos produtos básicos e manufaturados, cujo crescimento atingiu 45,3% e 31,7%, respectivamente. O Mercosul, a China e outros destinos não-tradicionais respondem pela maior parte desse crescimento das exportações, que permitiu acumular, nos últimos 12 meses, o saldo recorde de US$ 30,9 bilhões na balança comercial.
Essa expansão, além de suas óbvias implicações sobre a redução das necessidades de financiamento externo -,e portanto, sobre o endividamento externo do país- teve impacto determinante sobre a retomada do crescimento da economia. Nos últimos 12 meses, o PIB cresceu cerca de 4,7%, mais do que em qualquer ano do governo anterior. As vendas do comércio se expandiram a taxas elevadas, reverteu-se a tendência de queda nos rendimentos dos assalariados e, com a criação de mais de 1,2 milhão de empregos formais, um recorde histórico desde 1992, a taxa de desemprego caiu significativamente nos últimos dois meses.
A recuperação industrial tem um papel importante nesse processo. De janeiro a junho de 2004, a indústria acumulou crescimento de 7,7% (4% nos últimos 12 meses), com os segmentos de bens de capital e de bens de consumo duráveis mostrando incrementos de 25,2% e de 23,9%, respectivamente. Os melhores desempenhos setoriais ficaram por conta de material eletrônico e comunicações, veículos, máquinas e equipamentos e outros produtos químicos.
A questão central que o país deve enfrentar no momento é a sustentação desse processo de reativação da economia e de expansão do emprego e da renda. Não há crescimento sustentável sem investimentos que permitam remover os gargalos infra-estruturais existentes, particularmente nos setores de energia e logística, e aumentem a capacidade produtiva nacional. E o aumento dos investimentos requer a expansão do crédito de longo prazo, a custos razoáveis para as empresas. Requer também o direcionamento de maiores recursos do Estado para a implantação e viabilização de setores estratégicos e a coordenação dos esforços dos agentes públicos e privados, até mesmo através de programas específicos -como o projeto de lei das PPPs (Parcerias Público-Privadas) proposto pelo governo, atualmente em discussão no Congresso Nacional- e de uma política seletiva de estímulos aos investimentos, à produção e ao emprego.
Algumas das ações recentes desenvolvidas pelo governo são particularmente relevantes nessa esfera. É o caso, por exemplo, da regulamentação do setor elétrico e da recuperação do papel do Estado no planejamento e na formulação da política do setor, da política industrial, que prevê tratamento seletivo a algumas áreas estratégicas com elevados efeitos difusores do progresso técnico (fármacos, semicondutores, bens de capital e software, estimando-se em R$ 14,5 bilhões, em 2004, os recursos destinados ao financiamento da nova política industrial pelos bancos oficiais), e do pacote fiscal recentemente lançado pelo governo, com vista a desonerar a produção e os investimentos e a atrair para o sistema produtivo os recursos hoje aplicados no overnight. Na mesma direção apontam os dados relativos ao crescimento dos desembolsos do BNDES (aumento de 39% em relação ao primeiro semestre de 2003) e da aprovação e consulta de novos financiamentos, da ordem de 85% e 144%, respectivamente.
A consolidação do processo de crescimento pressupõe, em conjunto com a continuidade da expansão das exportações, a revitalização do mercado interno. É difícil que as empresas optem por aumentar sua capacidade produtiva se sua percepção das perspectivas econômicas é a de um quadro de insuficiente dinamismo da demanda interna. As incertezas em relação à evolução do cenário externo reforçam o caráter estratégico das políticas direcionadas a esse propósito. Com efeito, com o possível esgotamento do ciclo de preços das commodities (até pouco favorável ao Brasil), a previsível desaceleração do crescimento da China, que já é nosso segundo parceiro comercial, e a elevação da taxa de juros nos EUA, poderemos ter dificuldades em manter, em 2005, uma elevada taxa de expansão das exportações. Isso significa que será necessário reforçar os vetores internos de sustentação do crescimento e ampliar e integrar a capacidade produtiva industrial -cuja utilização média está em 84%-, expandir a oferta energética e criar novas externalidades que contribuam para o aumento dos investimentos e da produtividade.
O país tem hoje todas as condições para avançar nessas duas frentes e construir uma trajetória social, econômica e ecologicamente sustentável, que o conduza a um novo patamar de progresso material e bem-estar para o povo.


Aloizio Mercadante, 50, é economista e professor licenciado da PUC e da Unicamp, senador por São Paulo e líder do governo no Senado Federal.

Internet: www.mercadante.com.br
E-mail -
mercadante@mercadante.com.br


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