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OPINIÃO ECONÔMICA
Cenários latinos
GESNER OLIVEIRA
A américa Latina registra fase de forte expansão relativamente ao desempenho da região
nas últimas três décadas. A maratona de eleições até o final de 2006
não chega a representar ameaça.
O maior risco de interrupção do
crescimento continua no plano externo.
Depois dos investimentos concentrados em utilidades públicas
dos anos 90, a região se beneficia
de forte ciclo de commodities sustentado pela formidável expansão
da liquidez internacional e demanda externa. O vigor do crescimento chinês, aliado à política
monetária expansionista dos
EUA, abriu a maior janela de
oportunidade para o crescimento.
Algo parecido não ocorria desde a
interrupção do boom do pós-guerra, com a subida dos preços de petróleo e da taxa de juros, em 1979/
80.
A Alca não se concretizou no
cronograma previsto nos anos 90 e
provavelmente ainda demandará
alguns anos de negociação antes
de se tornar realidade. Não ocorrerá antes da conclusão da Rodada Doha, que, por sua vez, ainda
não registrou grandes avanços.
Mas a expansão chinesa preencheu a necessidade de aumento da
demanda externa.
A combinação de crescimento
elevado, baixa inflação e melhora
das contas externas é inédita. A
América Latina cresceu quase 4%,
em média, nos últimos dois anos,
com uma taxa de inflação de um
dígito e saldo comercial de US$ 28
bilhões.
O desempenho de cada país variou muito. Em contraste com as
décadas de 50 a 70, o Brasil vem
perdendo participação no produto
latino-americano. Em termos de
taxa de crescimento do PIB no período 2002-04, o Brasil está na zona de rebaixamento, em companhia de Haiti, Guatemala, República Dominicana e El Salvador.
A instabilidade política continua sendo um problema no continente, e alguns casos individuais,
como o da Bolívia, justificam
preocupação. No entanto, embora
frágeis, os regimes democráticos
predominam, e a alternância de
poder não é tão traumática.
Os cenários político-eleitorais
não representam grande fonte de
instabilidade por duas razões. Em
primeiro lugar, as chances de guinada da política econômica são
maiores apenas em economias de
menor porte. Argentina, México e
Brasil, que representam mais de
70% da economia da América Latina, dificilmente sofrerão mudanças radicais no período 2005-07.
A julgar pelas manifestações do
candidato de esquerda que lidera
as pesquisas no México, Andrés
Manuel López Obrador, não se
antevê uma guinada em direção a
uma política chavista. Considerando que o México é membro do
Nafta e relativamente integrado à
América do Norte, tal hipótese é
pouco provável, independentemente do ganhador das eleições de
julho de 2006 naquele país.
Em segundo lugar, mudanças de
orientação em economias menores, como a do Peru, com uma
eventual vitória de Alan Garcia,
não teriam grande efeito sobre os
demais países ou sobre as expectativas em relação à região. O efeito
contaminação é atualmente menor do que aquele que se observou
no passado.
Infelizmente, isso não quer dizer
que os problemas tenham terminado. As economias latino-americanas estão longe de preencher as
condições necessárias para o crescimento sustentado. A taxa de investimento relativamente baixa, a
infra-estrutura precária e reduzidos estímulos à inovação e ao aumento de produtividade impedem
a aceleração do crescimento.
Nessas circunstâncias, o dinamismo continua a depender demasiadamente de estímulos externos. Enquanto a fase de expansão
da economia mundial perdurar,
as coisas irão bem. A enorme liquidez internacional oculta todo
tipo de equívoco. Do exagero de
juros altos praticado pelo governo
Lula à irresponsabilidade completa do governo Chávez.
Uma virada no quadro internacional poderia colocar em risco os
ganhos recentes. Uma brusca elevação dos juros americanos ou
uma forte desaceleração do crescimento chinês retirariam o combustível do crescimento atual. O
ciclo de commodities terminaria
com provável perda de termos de
troca e nível de bem-estar. O grande desafio, portanto, reside em
aproveitar a atual fase para construir as bases para expansão mais
duradoura.
Gesner Oliveira, 49, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, presidente do Instituto Tendências de Direito e Economia e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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