São Paulo, quinta-feira, 22 de outubro de 2009

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BC fornece "milho ao bode", ataca Belluzzo

Economista defende IOF para estrangeiro e diz que BC deveria fazer mais no câmbio

Presidente do Palmeiras afirma que a atuação do Banco Central na compra de dólares acaba ajudando bancos a ganhar dinheiro

MARCIO AITH
DA REPORTAGEM LOCAL

Da maneira como foi anunciada, isoladamente, a taxação do capital externo para aplicações em renda fixa e ações não é um remédio adequado para evitar a sobrevalorização do real. Essa é a opinião do economista Luiz Gonzaga Belluzzo.
Em entrevista à Folha, Bel- -luzzo criticou duramente o Banco Central por não tomar, ao lado do que decidiu o Ministério da Fazenda, medidas adicionais para segurar o câmbio.
"O ministro Guido Mantega [Fazenda] usou corretamente o único instrumento do qual dispunha para lidar com o problema, que é o IOF. Medidas adicionais deveriam ter sido tomadas pelo Banco Central."
Segundo Belluzzo, o BC deveria operar no mercado futuro, por meio da exigência de margens maiores nas operações de mercado futuro, o que coibiria a especulação.
Além disso, segundo ele, deveria instituir uma política de compra de dólares minimamente racional e inteligente, que se antecipe aos mercados, em vez de alimentá-los com a "ração" do dia. "O Banco Central, com todo o respeito, está simplesmente dando milho a bode", afirmou.
Presidente do Palmeiras, Belluzzo é amigo de Mantega, com quem almoçou na sexta-feira passada, antes do anúncio da implantação de IOF.

 

FOLHA - Bolsa e real voltaram ontem a subir. É sinal de que o IOF de 2% sobre a entrada de capitais já fracassou?
LUIZ GONZAGA BELLUZZO -
O ministro Mantega usou corretamente o único instrumento do qual dispunha para lidar com o problema, que é o IOF. Ele tomou a medida adequada. Minha opinião é que medidas adicionais deveriam ter sido tomadas pelo Banco Central.

FOLHA - Que medidas?
BELLUZZO -
O BC deveria operar no mercado futuro, por meio de mais margens nas operações com dólar nesse mercado, coibindo a especulação. Além disso, deveria instituir uma política de compra de dólares minimamente racional e inteligente, que se antecipe aos mercados em vez de alimentá-los.

FOLHA - Mas o Banco Central já comprou R$ 3 bilhões à frente do fluxo de dólares desde janeiro e, mesmo assim, o real só fez valorizar.
BELLUZZO -
O Banco Central, com todo o respeito, está simplesmente dando milho a bode. Ou, como escreveu adequadamente o colunista da Folha Vinícius Torres Freire, o BC está tratando o complicadíssimo mercado de câmbio como uma feira de bananas. Eles ficam comprando a sobra de dólares no dia. Isso é bom para os bancos. Eles ganham até mais dinheiro com isso, por meio de arbitragem. É preciso ser mais ousado, antecipar-se à estimativa de fluxo. É preciso comprar não só acima do fluxo, mas antes dele. Não pode deixar o investidor se adiantar.

FOLHA - Como fazer para adiantar-se ao mercado?
BELLUZZO -
Os efeitos da intervenção do BC têm que passar por dentro dos mercados e, sobretudo, por dentro do mercado futuro, talvez por meio de maiores margens, como já mencionei. Não se pode deixar espaço para arbitragem no mercado. Hoje, além de vender seus dólares para o governo, o mercado ainda ganha na arbitragem, no mercado futuro, com a sobra. Todo mundo sabe disso, não é novidade.

FOLHA - Então o IOF, isoladamente, era uma ideia fadada ao fracasso.
BELLUZZO -
Eu não diria isso. O ministro Mantega fez o que podia fazer. O problema é que a medida fiscal é insuficiente, não tem a eficácia adequada.
Veja, por exemplo, a cotação do yuan [a moeda chinesa] frente ao dólar. A variação foi de apenas 0,03%. Por quê? Porque o Banco Central chinês trabalha com um volume (de compra de dólares) muito maior e se antecipa aos mercados, domina a situação.

FOLHA - O sr. almoçou com o ministro Mantega na sexta-feira. Conversaram sobre o assunto?
BELLUZZO -
Falamos sobre economia em geral. Eu dei minha opinião sobre câmbio, mas não fui previamente informado sobre as medidas que seriam tomadas.

FOLHA - Qualquer intervenção no câmbio parte do pressuposto de que existe uma cotação correta e outra errada. Qual seria a correta?
BELLUZZO -
Quando o dólar foi a R$ 2,50, estava muito bom para a maioria das empresas. O problema é que deixaram o real se valorizar.

FOLHA - De onde o sr. tira a convicção de que intervenções do governo no câmbio funcionam, a médio e a longo prazos?
BELLUZZO -
Não funcionam? Eu não sabia. Então vai ver que é um problema de temperatura. Só não funciona nos trópicos, no Brasil. Só funciona nos climas temperados. É isso.

FOLHA - O senhor aceitaria a presidência do Banco Central caso Henrique Meirelles deixe o posto em março para candidatar-se a algum cargo eletivo?
BELLUZZO -
Eu não tenho a menor condição de fazer isso. Sou presidente do Palmeiras. Meu mandato vai até dezembro de 2010. Aliás, estou agora na concentração para o jogo contra o Santo André.


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