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OPINIÃO ECONÔMICA
Limites da Alca "light"
GESNER OLIVEIRA
A 8ª Reunião Ministerial da
Alca (Área de Livre Comércio das Américas) terminou anteontem em Miami sem impasses
nem conclusões.
Foi um desfecho diplomático.
De um lado, a reunião não pode
ser considerada um fracasso como a da OMC (Organização
Mundial do Comércio) em Cancún. Um sem-número de declarações de boa vontade reafirmaram
o compromisso dos participantes
com o cronograma da Alca.
De outro lado, não se definiu
grande coisa, adiando a discussão
para a reunião de vice-ministros
em Puebla, no México. Esse encontro deverá servir para aparar
as arestas, preparando a última
reunião ministerial de negociação antes do início da implementação da Alca, em janeiro de
2005.
A reunião de Miami só geraria
maior atenção em hipóteses extremas, altamente improváveis
na atual conjuntura. Uma primeira seria uma indicação de
convergência das delegações em
torno de uma Alca abrangente, a
ser implementada com maior rapidez.
Esse era o desejo de países mais
abertos, como o Canadá e o Chile.
O volume de comércio (isto é, a
soma das exportações e das importações) sobre o produto dessas
economias representa 81% e 61%
da produção, respectivamente. O
México também sustenta uma
posição desse tipo, porém com a
intenção não-declarada de manter o status quo e se beneficiar de
um acesso privilegiado ao mercado da América do Norte por meio
do Nafta.
Na hipótese de uma aceleração
da Alca, o Brasil e o Mercosul passariam naturalmente a representar uma área relativamente mais
atraente para a recepção de investimento direto, com efeitos positivos sobre as exportações e o
crescimento.
No entanto esse cenário é pouco
provável, pelo menos no curto
prazo. A disposição de concessões
significativas por parte dos EUA é
pequena, e a subordinação da
discussão sobre os temas mais relevantes para o Mercosul -como
o da agricultura- à rodada da
OMC limita as possibilidades de
avanço imediato. Assim, o compromisso em torno de uma "Alca
light", isto é, um acordo restrito a
temas de consenso, parece mais
realista na atualidade. Nesse caso, não haveria efeitos significativos sobre as expectativas dos
agentes ou sobre as perspectivas
de crescimento do país e da região.
A reunião de Miami despertaria atenção em uma segunda hipótese de absoluto impasse das
negociações. Isso levaria a prognósticos de retrocesso grave na
política comercial com possíveis
repercussões sobre a avaliação de
risco de países de situação econômica mais frágil.
Porém essa segunda hipótese é
igualmente improvável. Por razões distintas, as conjunturas políticas tanto dos EUA quanto do
Brasil não recomendam uma situação de impasse na condução
da política externa e da Alca em
particular.
Para a administração Bush, isso
representaria mais uma situação
de conflito e frustração na área
externa. Para o governo Lula, o
rompimento com a Alca seria demasiadamente audacioso, algo
incompatível com a nova plataforma do Partido dos Trabalhadores no governo.
Ao mesmo tempo, em nenhum
dos casos há condições ou determinação política de concessões
substantivas para acelerar a constituição da área de livre comércio.
Em ambos os países, convém levar a Alca em banho-maria.
Em princípio, não há limites para tal estratégia, a não ser, é claro,
a tarefa de refazer o cronograma
de implementação da Alca. Persiste, no entanto, o problema de
crescimento insuficiente de países
como o Brasil, para o qual falta
uma estratégia e a mera protelação não constitui resposta satisfatória.
Gesner Oliveira, 47, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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