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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Em berço esplêndido
A alta cambial persistente solapa o equilíbrio das contas externas e gera dependência de capitais estrangeiros
EM FLORIANÓPOLIS , milita o dr.
Moacyr Pereira, advogado
trabalhista competente e generoso, que luta incansavelmente
por seus clientes, inclusive os mais
humildes. Certa vez, coube-lhe representar um vigia noturno, demitido sumariamente porque, durante
seu plantão, a empresa fora invadida
e saqueada. Na audiência, ficou claro
que o vigia havia dormido. Sua situação era difícil. Vendo que a causa estava praticamente perdida, o dr.
Moacyr dirigiu-se ao juiz e lançou
mão do derradeiro argumento: "O
meu cliente dormiu, Excelência, é
verdade. Mas não abandonou o posto!".
Essa talvez seja a melhor defesa
que se possa fazer dos responsáveis
pela política cambial brasileira. A
valorização do real começa a chamar
a atenção no mundo inteiro. O diretor-gerente do Fundo Monetário
Internacional, Dominique Strauss-Kahn, observou, há poucos dias, que
algumas moedas estão carregando
uma parcela excessiva do indispensável ajustamento do dólar. Referiu-se expressamente à apreciação do
euro, do dólar canadense e do real
brasileiro.
Evidentemente, o nosso problema cambial não é tão grave quanto
sugere a mera observação da taxa bilateral com o dólar. Como a moeda
americana está caindo em relação ao
euro e a outras moedas relevantes
para o nosso comércio exterior, a
apreciação efetiva do real é menor
do que parece. Mesmo assim, ela é
significativa, como mostram as estimativas da Funcex, por exemplo.
Em relação a uma cesta de moedas, a
moeda nacional vem subindo quase
continuamente em termos reais (vide "Boletim de Comércio Exterior",
outubro de 2007, tabelas 8 e 9).
Ninguém ignora que a valorização
da taxa de câmbio tem os seus atrativos e as suas vantagens. Ela favorece
o controle da inflação, aumenta o
poder aquisitivo dos salários, barateia o turismo no exterior. Não é por
acaso que os governos freqüentemente cedem a seus encantos.
Os países que se desenvolvem
mais rapidamente são os que sabem
resistir a essa tentação. Uma valorização persistente do câmbio tende a
minar o dinamismo da economia.
Solapa também o equilíbrio das contas externas, gerando dependência
em relação a capitais estrangeiros.
Esses efeitos podem demorar,
mas acabam aparecendo. A conjuntura internacional superfavorável
dos últimos anos mascarou o problema por algum tempo, mas o impacto do real forte já se faz sentir de
várias maneiras. O setor externo
vem dando contribuição líquida negativa ao crescimento do PIB há vários trimestres, segundo o IBGE. O
crescimento da economia brasileira
está apoiado exclusivamente na expansão do mercado interno.
O balanço de pagamentos do país,
que ainda é um dos nossos pontos
fortes, também mostra alguns sinais
de deterioração. As importações de
bens vêm crescendo quase o dobro
das exportações, 29% contra 16%. O
superávit da balança comercial caiu
mais de 10% no acumulado do ano.
As despesas com serviços (transportes e viagens internacionais, por
exemplo) e as remessas de lucros
crescem rapidamente. Em conseqüência, o superávit em conta corrente registra queda bastante considerável. No acumulado em 12 meses, o superávit corrente caiu de
1,6% do PIB em dezembro de 2005
para 1,3% em dezembro de 2006 e
para 0,8% em setembro último.
A combinação de câmbio valorizado com expansão vigorosa da demanda doméstica levará provavelmente ao reaparecimento de um déficit no balanço de pagamentos em
conta corrente.
Vulnerabilidade e(x)terna?
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
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