São Paulo, sábado, 23 de março de 2002

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LUÍS NASSIF

O caso Opportunity e o Citibank

A sentença da Commow Law (a Suprema Corte inglesa) contra Daniel Dantas -no processo que lhe é movido por seu ex-sócio Luiz Demarco- é a última de uma sequência de decisões da Justiça inglesa, destinada a ampla repercussão não só em âmbito nacional como internacional.
Antes dela, Dantas sofreu condenação criminal pela Grande Corte de Grand Cayman por desobediência a ordem judicial. Com ele foi multado o Fundo CVC/Opportunity. Na condição de único investidor do fundo, o Citibank fica em situação delicada.
Além disso, Dantas foi condenado a escrever para a Procuradoria Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro, confessando dois crimes: uso de documento roubado e difamação caluniosa.
No meio do processo ocorreu furto de e-mail de Demarco. Os e-mails chegaram até o Opportunity. Dantas selecionou um deles -uma carta trocada entre Demarco e a TIW, canadense, que também processa o Opportunity-, divulgou para a mídia a tese de que o e-mail comprovava uma conspiração entre ambos e entrou com uma notícia-crime contra Demarco na Procuradoria Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Na carta, Dantas admite que protocolou a notícia-crime depois de ter sido alertado pela Grande Corte de Cayman de que "o documento da TIW era um documento confidencial, furtado ao sr. Demarco e que evidencia em seu conteúdo nada além de um acordo para o compartilhamento dos serviços dos advogados para a representação das partes TIW/Demarco nos processos perante a Grande Corte das Ilhas Cayman". A carta foi encaminhada à Procuradoria por ordem expressa da Grande Corte de Cayman.
Na sequência de decisões desastrosas, protocolou a carta informando incorretamente o número do processo. A carta fazia referência a uma notícia-crime número 037352. O correto é 027352. Quase se perdeu nos escaninhos da Procuradoria.
A sentença da Common Law permite, em princípio, abrir o processo de dissolução do CVC/ Opportunity. Dificilmente se conseguirá, mas o simples início do processo paralisaria a companhia, daí o fato de o Opportunity ter apelado à alta corte britânica.
Lá só se julgam casos destinados a criar jurisprudência. Assim que a sentença for assinada pela rainha Elizabeth 2ª, o caso irá regular as relações entre majoritários e minoritários do Reino Unido e de países que seguem suas recomendações legais. Na sentença os juizes acusam Dantas de ter alterado sua versão três vezes.

O balanço do Citibank
O ponto mais relevante desse tiroteio se verá no próximo balanço auditado do Citibank, que está para sair. O caso Enron levou as empresas de auditoria a um rigor extremo em suas avaliações.
O questionamento que o caso Enron provocou no mercado e no mundo jurídico norte-americano se deve ao fato de ter usado vários trustes e "limited partnerships", colocados sob controle de terceiros. No caso da Enron, essas empresas eram utilizadas para colocar passivos e ativos em uma espécie de balanço informal. Como eram "controlados" por terceiros, sofriam uma auditoria diferente. Criou-se um "imbróglio" contábil pouco transparente. O balanço da controladora era constituído pela soma de balanços dos trustes e "LPs" que, por já terem sido auditados, não sofriam uma nova averiguação por parte da empresa que auditava a Enron. Se houvesse algum problema, a culpa era do trustes.
A SEC americana mudou sua maneira de avaliar a questão e constatou o óbvio: como quem paga a conta são os acionistas da empresa-mãe, a auditoria da empresa tem que auditar a auditoria das controladas.
E aí se entra em uma questão conceitual complexa, em um mercado com medo pânico de questões complexas. O fundo CVC/Opportunity é uma "LP" cujo único acionista é o Citibank. Por qual valor devem ser contabilizadas as participações do CVC nas teles? Uma visão conservadora diria que é pela soma do valor das ações que o fundo tem nas teles. No caso do CVC existe um prêmio de controle, que teria que ser aceito pelo neoconservador mercado norte-americano.
O Citibank investiu US$ 700 milhões no CVC/Opportunity. Pelos valores de mercado sua carteira soma US$ 200 milhões. Logo deveria realizar prejuízo de pelo menos US$ 500 milhões. O próximo balanço do Citibank poderá desfazer esse mistério, assim como informar o mercado o quanto o banco avançou na constituição de trustes e "LPs".

E-mail - lnassif@uol.com.br



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