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São Paulo, domingo, 23 de março de 2003

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ECONOMIA BOMBARDEADA

Desvalorização reduziria exportações da Europa; EUA podem elevar juros e tirar dinheiro de emergentes

Pacote e guerra devem enfraquecer dólar

DA REPORTAGEM LOCAL

O conflito no Iraque e a insistência de Bush em promover cortes de impostos devem levar a uma piora do déficit fiscal do país e ao enfraquecimento ainda maior do dólar. No futuro, isso pode forçar os EUA a elevar juros, o que prejudicaria ainda mais a combalida economia mundial.
Com o conflito, a fuga de investidores dos EUA deve acentuar a queda da moeda americana. Dólar fraco implicará elevação dos custos das importações do país.
Como rezam as leis da economia, nesse caso, cai o nível de importações e aumentam as exportações, melhorando o saldo comercial. Isso reduzirá o alto déficit em conta corrente dos EUA, equivalente hoje a 5% do PIB.
O lado ruim dessa equação é o seguinte: o déficit em conta corrente reflete o tamanho da poupança externa de uma economia. Um país que compra muito do exterior e, ainda assim, tem dinheiro disponível para investimentos internos recebe geralmente bastante recursos de fora.
Quando esse fluxo se reduz, como nos EUA, uma das três consequências é inevitável: ou o governo aumenta sua poupança pública, cortando gastos; ou a população incrementa sua poupança privada, deixando de consumir; ou o nível de investimento na economia despenca.
Os EUA não parecem estar caminhando naturalmente para nenhuma das duas primeiras direções. Com a iminência da guerra e o isolamento de Bush, o governo está prestes a aumentar gastos. Diferentemente do que ocorreu na guerra do Kuait, quando países aliados bancaram US$ 76 bilhões dos US$ 80 bilhões de gastos militares, agora o ônus do conflito tende a recair quase totalmente sobre os ombros dos EUA.
Além disso, a combinação de incentivos fiscais e juros baixos pode acabar incentivando a população e as empresas a gastar mais, já que haverá sobra de recursos e os incentivos para investimentos estão em baixa.
A solução para esse impasse pode ser inevitável, como concluiu o economista Paul Krugman, da Universidade de Princeton, em artigo publicado no jornal "The New York Times". No médio prazo, o governo norte-americano poderá ter de aumentar os juros e, com isso, criar incentivos para o aumento da poupança privada que seria usada para o financiamento de investimentos.
A alternativa seria o abandono do ambicioso plano de cortes de impostos. Acontece que, assim como a guerra, os incentivos fiscais são a base da plataforma política com a qual Bush tentará se reeleger em 2004. Descartada essa hipótese, restaria ao governo americano assistir impassível à piora da situação econômica.
Para a economia global, todos esses desdobramentos econômicos domésticos nos EUA seriam negativos. A desvalorização continuada do dólar prejudica as exportações de outros países.
"A depreciação do dólar é muito ruim para a Europa. Prejudica as exportações dos países europeus e retarda a recuperação econômica na região", afirma Gerard Walsh, diretor econômico da Economist Intelligence Unit, centro de pesquisa britânico.
Embora acredite numa guerra curta, seguida por uma recuperação da economia global, Walsh admite que a desvalorização do dólar pode continuar, se o conflito durar mais que o esperado.

Brasil
A possibilidade de elevação dos juros nos EUA no médio prazo também prejudicaria os emergentes. Juros mais altos atrairiam investidores de volta para os EUA e representaria uma reversão da recente recuperação dos fluxos de capitais para países como o Brasil.
Além dessa ameaça de longo prazo, a economia brasileira também poderá sofrer com novos aumentos de juros, caso as cotações de petróleo voltem a subir, pressionando a inflação. "As expectativas inflacionárias poderão ser realimentadas, forçando nova rodada de aumento de juros", afirma o economista Carlos Geraldo Langoni, ex-presidente do Banco Central e diretor do Centro de Economia Mundial da FGV.
O lado bom das tensões internacionais para o Brasil, na opinião do economista, pode ser uma possível aceleração das aprovações de reformas: "O Congresso costuma reagir com mais rapidez em momentos de crise".
De toda a forma, para Langoni, a tão esperada recuperação das economias mundial e brasileira fica adiada para 2004.
(ÉRICA FRAGA)


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