São Paulo, quinta-feira, 23 de março de 2006

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SONEGAÇÃO

Medida é criticada por especialistas em tributação e direitos do consumidor; Receita diz que tem amparo na lei

Retenção de compra sem nota é contestada

FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL

A decisão da Receita Federal em São Paulo de, em suas próximas ações de fiscalização, apreender mercadorias importadas ilegalmente dos consumidores que não apresentarem nota fiscal de compra causa polêmica é criticada por especialistas em tributação e em direito do consumidor.
Com base na lei nš 4.502, de 1964 e no decreto nš 4.544, de 2002, a Receita entende que as pessoas físicas, assim como as empresas, também podem perder os produtos importados ilegalmente caso não apresentem documentos fiscais que comprovem sua aquisição.
A lei determina que um produto pode ser apreendido "quando estiver desacompanhado de documentação comprobatória de sua importação ou licitação regular se, em poder do estabelecimento importador ou licitante, em poder de outros estabelecimentos ou pessoas".
O decreto estabelece, em seu artigo 513, que a perda da mercadoria se estende também ao consumidor, em caso de não-comprovação legal da importação, como entende a Receita. "A aplicação da penalidade independe de ser, ou não, o proprietário da mercadoria, o contribuinte do imposto." Nesse caso, o imposto é o IPI, incidente sobre a empresa que produz ou importa.
"Não há dúvida. O consumidor que adquire um bem importado ilegalmente sem nota fiscal pratica ato ilícito. Decidimos, já que a lei nos permite, abordar também as pessoas físicas nas próximas fiscalizações. É mais uma forma de coibir o comércio de produtos ilegais no país", afirma Guilherme Adolfo Mendes, superintendente-adjunto da Receita em São Paulo.
Clóvis Panzarini, consultor especializado em tributação, diz que é uma "maluquice" e medida "ineficaz" apreender mercadoria importada ilegalmente de quem não apresenta nota fiscal.
"Essa é uma atitude que não tem amparo legal. A lei é de 1964, do tempo da ditadura, e trata do contribuinte do IPI, não do consumidor. Essa decisão parece mais uma medida que visa a pirotecnia. Não adianta correr atrás de uma velhinha com secador de cabelo na sacola para pedir nota."
Na análise de Panzarini, quem descumpre a lei ao vender um produto importado de forma ilegal é o vendedor -não o consumidor. "O consumidor não tem obrigação de exigir nota fiscal. Quem tem obrigação de dar o documento é o comerciante."
O Código de Defesa do Consumidor orienta o consumidor a pedir sempre a nota fiscal na compra de um produto. Com essa atitude, ajuda a evitar a sonegação fiscal e tem mais chance de se defender se adquirir, por exemplo, um produto com defeito. "Se o consumidor quer correr riscos e não pedir a nota fiscal, essa é uma decisão que cabe a ele."
A Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo informa que existe uma legislação estadual que impede a apreensão de mercadorias dos consumidores que não apresentarem nota fiscal durante uma ação de fiscalização.
"Nós podemos, sim, abordar o consumidor e perguntar se ele possui a nota fiscal do produto. Se ele disser que não, pedimos para nos dizer onde adquiriu a mercadoria. Fizemos isso algumas vezes e notamos que os consumidores estavam sempre dispostos a nos ajudar. Entendo que a legislação que trata da apreensão de produtos não é clara em relação ao consumidor final", afirma Antonio Carlos de Moura Campos, diretor-adjunto da Diretoria Executiva da Administração Tributária.


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