São Paulo, sexta-feira, 23 de agosto de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

O risco Lula

Assim como os demais presidenciáveis, a candidatura Lula tem pontos vantagem e de risco. Entre os pontos tranquilizadores está a nova atitude do PT. Hoje em dia, poucos analistas apostam em radicalização do PT em caso de vitória de Lula para a Presidência da República. O partido tem um núcleo de pensamento racional. Por tal, não se entenda um grupo com respostas para tudo, mas apto a ouvir e a debater propostas racionais, sem dogmas.
Há também uma clara preocupação com a estabilidade e a governabilidade. O ponto mais consistente do discurso de Lula, aliás, tem sido o da necessidade de pactos políticos e de negociação. E o próprio Lula parece ter saído de cima do muro e se decidido pelo núcleo moderado que o assessora na campanha.
Em caso de eleição, muito provavelmente o PT optará por um arco de alianças de centro-esquerda, reduzindo as demandas fisiológicas e aprimorando os quadros gestores -uma possibilidade que parece distante de Ciro Gomes, pela falta de um partido político que o sustente.
Nas políticas públicas, de maneira geral, provavelmente haverá pouco conflito conceitual. Desde meados dos anos 90, há um pensamento consistente de centro-esquerda no PT, cujo principal artífice é o candidato ao governo gaúcho Tarso Genro.
Os pontos de risco do partido estão, inicialmente, em sua base corporativa. Provavelmente pouco se conseguirá avançar nessa área, devido às resistências e interesses entranhados na máquina. Ainda há uma ala do partido que considera qualidade total a última forma de exploração do homem pelo homem.
Um segundo ponto é a criação expectativas exacerbadas em alguns grupos mais radicais. Trata-se de um tema administrável, mas que provocará desgastes no discurso do partido. Nada que uma posição firme inicial não resolva. Mas, de qualquer modo, terá que utilizar uma retórica eficaz para explicar porque não haverá grandes mudanças nas políticas sociais atuais.
Lula tem pontos positivos, em sua capacidade de negociar, mas terá dificuldades para dirimir pendências internas e tomar decisões. Mesmo montando uma boa equipe de apoio, terá que decidir. E aí esbarra em duas limitações. A primeira, a sua própria dificuldade em administrar conflitos internos do partido. A segunda, sua falta de preparo para temas mais complexos. Em contrapartida, tem a vantagem de não se considerar dono da verdade e das certezas absolutas. A questão poderá ser resolvida com um superministro abaixo de Lula, preparado e com perfil gerencial. Mas, se não resolver adequadamente essa questão político-operacional, o governo será paralisado.
No plano internacional, haverá uma nítida perda de espaço político, já que Lula está bastante marcado pelos discursos de apoio a Chávez e a Fidel, e pela própria incapacidade atual de captar os grandes temas mundiais -como o combate ao protecionismo nos países centrais ou a posição do país, de líder dos emergentes nos grandes fóruns mundiais.
Um governo Lula poderá suprir essas deficiências utilizando de forma adequada, e sem preconceitos, os bons quadros existentes no setor público -como os negociadores do Itamaraty, os gestores do Avança Brasil. Se partidarizar as escolhas técnicas, terá dificuldades para conduzir o país.

E-mail - LNassif@uol.com.br


Texto Anterior: Trabalho: Quilos a mais emagrecem salários
Próximo Texto: Tarifas: Energia elétrica sobe 14,5% em Brasília
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.