São Paulo, domingo, 23 de agosto de 1998

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MERCADO TENSO
O título da dívida externa mais negociado mostra que os investidores desconfiam do governo brasileiro
Entenda o C-bond, medida do risco Brasil

da Reportagem Local

O C-bond, título da dívida externa brasileira, ficou muito falado nas últimas semanas.
O agravamento da crise internacional, com a Rússia entrando em colapso, jogou o preço do título por terra e o colocou nas manchetes do noticiário econômico, sempre associado ao aumento do risco brasileiro.
Pouca gente sabe, no entanto, o que significa a expressão "títulos da dívida externa", qual a origem dos C-bonds, como funciona a sua negociação diária e porque eles são um termômetro da percepção do risco do país.
O C-bond nasceu em 1994, quando o governo brasileiro assinou o acordo de renegociação da dívida externa brasileira.
Foram renegociados US$ 52 bilhões. Na prática, a renegociação consistiu em trocar uma dívida por outra, de prazo mais longo e de juros mais baixos. Além disso, o país teve um desconto no valor principal do que devia.
Os valores que eram devidos pelo governo brasileiro a bancos, principalmente norte-americanos, foram transformados em seis tipos de títulos com vencimento de até 30 anos.
Esses títulos são conhecidos como "bradies", pois foram negociadas dentro dos parâmetros do Plano Brady, criado pelo ex-secretário do Tesouro dos EUA, Nicholas Brady. Entre eles está o C-bond, que se transformou no mais negociado de todos.
Segundo um boletim do banco ING Barings, no primeiro trimestre deste ano, os C-bond giraram US$ 145 bilhões, quase o triplo do segundo título mais negociado, o Cetes do México, que movimentou US$ 56 bilhões.
O C-bond é um título de 20 anos, com vencimento em 14 de abril de 2014 e remuneração de 8% ao ano.
O título tem um prazo de carência de 10 anos. Ou seja, apenas em 2004 o governo brasileiro deve começar a amortizar o principal da dívida.
Inicialmente, foram emitidos US$ 7,38 bilhões em C-bonds. Por conta da acumulação dos juros, hoje esse valor é US$ 8,57 bilhões.
Os C-bonds não são negociados em pregão de Bolsa de Valores. A negociação acontece no chamado mercado de balcão, em que comprador e vendedor se encontram individualmente, quase sempre por meio de um corretor.
Todas as operações com o título têm que ser registradas em duas centrais de liquidação e custódia na Europa.
Deságio e "spread"
A cotação pela qual o C-bond é vendido e comprado é dada em forma de deságio sobre o valor de emissão dos títulos.
Esse deságio reflete a confiança de que o governo brasileiro vai honrar a dívida no vencimento. Quanto maior o deságio, menor a confiança.
Na sexta, o título era negociado a 55,63% do seu valor de face, indicando baixíssima confiança.
Alguns dos bradies brasileiros têm títulos do Tesouro dos EUA depositados pelo governo brasileiro em garantia de seu pagamento. O C-bond é um título sem qualquer garantia e, por isso, é risco Brasil puro.
Quanto maior o deságio com que o título é negociado, maior aumenta o rendimento prometido. Porque o investidor estará desembolsando menos para comprar um título com mesmo valor de face, sobre o qual incidem os juros pagos.
O mercado financeiro costuma medir o rendimento do C-bond na forma de prêmio ("spread") em relação ao juro dos títulos do Tesouro dos EUA.
Os chamados "treasuries" americanos são considerados os títulos com menor risco no mundo, praticamente nulo e, por essa razão, servem como parâmetro para os demais.
Quanto maior o "spread" que o C-bond paga sobre o "treasury", maior o risco que os investidores estão atribuindo ao Brasil.
Na sexta-feira, o C-bond fechou pagando 11,76% sobre o título dos EUA, o maior "spread" desde abril de 95, quando o país estava mergulhado na crise do México.
(VANESSA ADACHI)



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