São Paulo, domingo, 23 de agosto de 1998

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PAÍSES EMERGENTES
México enfrenta novos percalços para crescer e ter estabilidade, três anos e meio após o crash cambial
Crise global volta a assustar os mexicanos

RICARDO GRINBAUM
Enviado especial ao México

O primeiro conselho que se ouve ao chegar à Cidade do México é tomar cuidado com os chamados táxis ecológicos. É raro encontrar alguém que não conheça uma vítima de um assalto cometido por um motorista desses fusquinhas pintados de verde.
Os assaltaxistas, como são conhecidos, dividem as manchetes dos jornais com a crise financeira internacional e as fraudes no programa de socorro aos bancos. Muitos mexicanos podem não ter se dado conta, mas os três assuntos estão intimamente ligados.
Três anos e meio depois do colapso do peso, a pobreza e a violência aumentaram. Só agora o país começa a recuperar o padrão de consumo de 1994, mas o medo de uma nova crise econômica volta a assustar os mexicanos.
O México foi um dos países mais afetados pelos choques especulativos da semana passada. Analistas projetavam 9,30 pesos por dólar até o final do ano. Na sexta-feira, um dólar já valia 9,75 pesos.
As oscilações financeiras já estão tocando a vida dos mexicanos. No início do ano projetava-se crescer mais de 5% com inflação de 12%. Os números já foram revistos: o crescimento deve ficar em 4%, e a inflação, em 15%.
"Quando a gente acha que pode começar a resolver os problemas, aparecem outras complicações", diz a vendedora Irma Kurscheka. Na crise de 94, Irma e o marido Johanes perderam emprego, ficaram pendurados num empréstimo para compra da casa e estão sendo processados pelo banco.
Essa é uma história comum no México. Dois anos antes do colapso do peso, os bancos foram privatizados e os novos donos concederam muitos empréstimos, para recuperar o dinheiro rápido. "Havia um clima de euforia no país", disse Guillermo Aboumrad, economista do Citibank no México.
Havia distribuição de cartões de crédito nas portas das universidades e em estandes em supermercados. Uma categoria prosperou: os coiotes - despachantes encarregados de driblar as exigências burocráticas para apressar empréstimos bancários.

Crise de 94
Em dezembro de 94, o governo não conseguiu segurar a cotação do peso e precisou elevar os juros de 17% para mais de 100% ao ano. Uma recessão provocou um encolhimento de 6% no PIB. De cada dez pesos emprestados pelos bancos, seis não voltaram.
Até hoje, milhões de mexicanos estão pendurados nos bancos. Os inadimplentes se organizaram em associações como a El Bárzon, com mais de três milhões de participantes. De acordo com a associação, existem seis milhões de mexicanos inadimplentes.
O número de mexicanos que vivem em pobreza extrema cresceu de 17 para 26 milhões de pessoas, segundo a revista "Proceso". A classe média mexicana emagreceu. Salários de parte dos advogados do serviço público cairam para cerca de 150 dólares por mês.
Uma parte da economia mexicana reagiu rápido à crise. Empresas exportadoras puxaram a recuperação do país, que cresce em ritmo acelerado há três anos. O desemprego voltou a cair, mas os problemas sociais estão sendo superados a passos lentos.
O consumo privado cresceu 2,3% em 1996 e cerca de 5% em 1997, mas ainda está abaixo de 1994. Em 95, os salários caíram 25% e nos últimos dois anos começaram a se recuperar.
"Salário e consumo eram artificialmente elevados, sustentados por um artíficio cambial. O esforço agora é para promover um crescimento consistente", disse Manuel Francia, alto funcionário do Ministério da Fazenda.



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