|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
PÓS-MORATÓRIA
Proposta prevê ainda perdão de US$ 12 bi em juros atrasados; credores dizem que oferta é "escandalosa"
Argentina oferece pagar 25% do que deve
FERNANDO CANZIAN
ENVIADO ESPECIAL A DUBAI
O governo argentino propôs
ontem honrar apenas 25% de parte dos US$ 94 bilhões que o país
diz dever a seus credores privados
como forma de reestruturar sua
dívida e retomar os pagamentos,
suspensos em dezembro de 2001.
Os 25% seriam pagos em um dos
três títulos a serem criados pelo
governo para trocar a dívida não
paga da Argentina. Os detentores
dos outros dois papéis receberiam percentuais maiores, mas
prazos mais longos.
A proposta prevê ainda que o
país não vá honrar US$ 12 bilhões
de juros atrasados desde dezembro de 2001, quando suspendeu
os pagamentos de seus títulos, até
a data em que os credores aceitarem formalmente o acordo.
"É a reestruturação mais completa da história", disse o secretário de Finanças da Argentina,
Guillermo Nielsen.
A oferta teve uma péssima recepção entre grupos de credores,
que a qualificaram como "inaceitável" e "escandalosa". O valor total da dívida, que exclui os juros
pós-moratória, também foi objeto de forte contestação.
A proposta foi anunciada pelo
ministro da Economia da Argentina, Roberto Lavagna, em clima
tenso, durante encontro com cerca de 50 investidores na reunião
do FMI (Fundo Monetário Internacional) em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
Responsabilizando o governo
do ex-presidente Carlos Menem
(1989-1999) pela insolvência de
seu país, Lavagna procurou demonstrar que a Argentina está
saindo da atual crise.
O ministro deu a entender que
fará apertos fiscais maiores para
pagar os juros da dívida que começará a renegociar em outubro e
disse que o país poderá manter
acordos com o FMI até 2013.
O calote argentino, que envolveu mais de 50% da dívida total
do país, não só foi o maior como
deverá ter a negociação mais
complexa da história. Diferentemente da maioria das dívidas de
outros países, a da Argentina está
pulverizada entre milhares de credores, inclusive pessoas físicas.
Segundo a proposta, a Argentina escolherá um grupo de 12 bancos e credores que poderão optar
por três diferentes tipos de título.
Esses papéis agrupariam 152
bônus distintos, hoje negociados
no mercado, em sete moedas,
prazos e juros diferentes.
O primeiro título, chamado
"bônus de desconto", é o que prevê o deságio de 75% do valor de
face da dívida. Os credores receberiam US$ 0,25 para cada US$ 1 a
que têm direito em um prazo bem
menor, ainda não definido.
Outro tipo de título, o "bônus ao
par", garantiria o valor atual da
dívida, mas alongaria o prazo de
pagamento de maneira significativa e reduziria os juros pagos para até 2% ao ano -segundo algumas previsões.
Uma terceira opção, os "bônus
de capitalização", indexariam os
pagamentos e ganhos ao ritmo de
crescimento da economia. Quanto maior a atividade econômica,
maior o ganho. Cada um dos três
títulos terá cerca de 20 variações
no total, para acomodar prazos,
moedas e juros diferentes.
Logo depois da apresentação de
Lavagna, alguns poucos investidores chegaram a considerar a
proposta "negociável", contanto
que o deságio de 75% fosse "um
ponto de partida" para um acordo diferente.
Sem negociação
Mas Lavagna foi irredutível. "Os
75% [de desconto] não são negociáveis", reagiu depois o ministro.
"O impacto da atual crise é mais
forte no povo argentino do que
nos credores. A oferta pode não
atender às expectativas, mas é o
que estamos dispostos a pagar",
disse durante entrevista.
Lavagna afirmou esperar concluir as negociações em menos de
um ano e deixou claro que a Argentina não fará "nenhum pagamento em dinheiro a curto prazo"
-mesmo para quem aceitar receber só os 25% do total devido.
O ministro argentino sugeriu
que o país pretende aumentar a
meta de superávit fiscal (economia para pagar juros) em 2005 e
em 2006. Para 2004, a Argentina já
se comprometeu com o FMI a fazer um superávit de 3% do PIB
(Produto Interno Bruto).
Light
A meta de 2003 foi considerada
"light" demais por banqueiros e
investidores, que criticaram o
acordo de US$ 12,5 bilhões aprovado pelo FMI com a Argentina
nesta semana.
"A oferta argentina aos credores
é coerente com o acordo fechado
com o FMI, que todos consideraram frouxo. O Brasil vem economizando 4,25% do PIB para pagar
juros, o que mostra que os argentinos poderiam fazer melhor",
disse à Folha David Beers, diretor-gerente para a área de Dívida
e Finanças da Standard & Poor's.
Texto Anterior: Crise no ar: Varig e TAM ainda não protocolaram carta Próximo Texto: Frase Índice
|