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RECEITA ORTODOXA
Para empresário, alta dos juros é "descabida", afeta imagem do presidente Lula e só beneficia bancos
Lua-de-mel com PT está no fim, diz Ermírio
Ormuzd Alves - 25.set.02/Folha Imagem
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O empresário Antônio Ermírio de Moraes, do grupo Votorantim, que critica a elevação dos juros
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GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.
O empresário Antônio Ermírio
de Moraes, 74, presidente do grupo Votorantim e crítico de primeira hora, na campanha eleitoral, do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva, considerou
"descabida" a decisão do Banco
Central, anteontem, de aumentar
a taxa básica de juros da economia de 25% para 25,5% ao ano.
Os bancos, a seu ver, continuam
sendo os maiores beneficiados
com a decisão. "Quem ganha
mesmo com essa decisão, mais
uma vez, são os banqueiros", diz o
empresário. O maior prejudicado, a seu ver, é o presidente Lula.
"A decisão afeta principalmente a
imagem de Lula."
Para Ermírio de Moraes, decisões como essa podem provocar o
fim da lua-de-mel do novo governo com a sociedade mais rapidamente do que se previa. "A lua-de-mel com o novo governo já está começando a acabar", diz Ermírio de Moraes.
Folha - Qual sua opinião sobre a
decisão do Copom de aumentar os
juros?
Antônio Ermírio de Moraes -
Achei meio descabida a decisão
do Banco Central de aumento da
taxa de juros. Eu achava que eles
iriam manter os juros. Não vejo
razão para o aumento de meio
ponto percentual. Foi uma decisão no mínimo precipitada. Será
que era necessário mesmo esse
aumento dos juros? Mais uma vez
a área financeira foi privilegiada.
Não faz sentido pagar 180% ao
ano de juros no cheque especial.
Quem toma dinheiro no cheque
especial está liquidado.
Folha - Quais poderão ser as consequências dessa decisão de aumento dos juros?
Ermírio de Moraes - A lua-de-mel
com o novo governo já está começando a acabar. O programa da
fome, por exemplo, começa a ficar desmoralizado. Vai acabar parecendo demagogia. Um governo
sensato levanta os pontos onde
tem carência de alimentos no país
e monta centrais de abastecimento próximas a esses locais para a
distribuição dos alimentos. Em
três ou quatro meses, acaba o problema. Se for dar dinheiro, a turma acaba tomando cachaça.
Folha - O sr. acha que o programa
Fome Zero está mal formulado?
Ermírio de Moraes - O programa
ainda nem saiu do papel. O que
acho é que eles deveriam mapear
onde há fome no país, saber quais
são os municípios onde há fome e
calcular a percentagem da população subnutrida. Por tudo que
venho lendo, acho que o total de
subnutridos deve representar
20% da população, cerca de 30
milhões de pessoas. E a concentração maior deve ser no Nordeste, muito mais do que no Norte.
Folha - O Fome Zero pode ficar
desgastado?
Ermírio de Moraes - O problema
é que o programa não anda. Agora, com mais essa decisão de aumentar meio ponto percentual
dos juros, vai acabar irritando todo mundo.
Folha - O aumento dos juros pode
ter repercussões negativas para a
popularidade do presidente Lula?
Ermírio de Moraes - Pelo meu
sentimento, acho que a decisão foi
ruim, principalmente para a imagem do presidente Lula. Ele sempre pregou o contrário disso. O
discurso do PT foi sempre o de
corrigir a tabela do Imposto de
Renda e, agora, está defendendo
os 27,5% de alíquota no IR sem
correção.
Nos juros, a mesma coisa. O PT
sempre defendeu baixar os juros,
e agora decide aumentar. Assim, a
lua-de-mel do novo governo com
a sociedade vai acabar muito rapidamente. O povo vai acabar se irritando com o governo.
Folha - O sr. acha que essa decisão de aumento dos juros irá afetar
a decisão de investimentos das empresas?
Ermírio de Moraes - A decisão de
investimentos das empresas, não.
A decisão prejudica a imagem do
presidente da República. O reflexo é direto.
Folha - O aumento dos juros não
pode ter efeito positivo no combate à inflação?
Ermírio de Moraes - Quem ganha
mesmo com essa decisão, mais
uma vez, são os banqueiros. O aumento dos juros favorece uma
minoria. Uma minoria do ponto
de vista do número de instituições, mas que representa uma
maioria se levar em conta o lucro.
Os bancos ganharam muito mais
do que as empresas industriais e
vão continuar ganhando. Os juros, agora, estão mais altos do que
no período do governo Fernando
Henrique Cardoso.
Folha - Mas a alta dos juros não
indica um sinal de que o governo
está disposto a baixar a inflação?
Ermírio de Moraes - Sempre que
a inflação está alta os banqueiros
ganham mais. Por que os banqueiros não baixam os juros? Os
bancos já ganham porque não pagam quase nada em impostos.
Ninguém vai aumentar o consumo por causa dos juros. O consumo pode muito bem ser disciplinado.
Folha - Como o sr. analisa as mudanças defendidas pelo professor
Carlos Lessa no BNDES?
Ermírio de Moraes - O papel do
BNDES é desenvolver a produção
do Brasil e ponto final. O Brasil
produz apenas 1% do PIB do
mundo e a tarefa do BNDES é aumentar essa participação do país.
É uma vergonha o Brasil produzir
apenas 1% do PIB mundial. O
Brasil não produz quase nada e é
isso que o BNDES deve dar prioridade. O BNDES deve se preocupar em aumentar a produção de
maneira responsável e, com isso,
criar mais emprego no país para
poder melhorar a qualidade de vida da população. Se isso acontecer, o Brasil melhora de vida. Eu
não analisei ainda as mudanças
defendidas pelo professor Carlos
Lessa no BNDES. Só acho que o
papel do BNDES deve ser o de aumentar a produção do país.
Folha - Como o sr. está vendo os
primeiros dias do governo Lula?
Ermírio de Moraes - Não quero
atacar o Lula. Só acho que já está
na hora de ele viajar menos.
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