São Paulo, domingo, 24 de janeiro de 2010

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ALBERT FISHLOW

A escolha de Obama


O presidente terá de reforçar o centro. É isso o que os líderes efetivos de democracias rapidamente aprendem


EM 2008 , os eleitores dos EUA se voltaram decididamente contra George W. Bush e os republicanos. A Presidência, a Câmara dos Deputados e o Senado foram todos conquistados pelos democratas. Mas a comemoração não durou muito tempo.
Havia muito a fazer em casa: fundos governamentais imediatos para reanimar uma economia em séria recessão, reformas financeiras para reverter a irresponsabilidade do livre mercado, expansão da cobertura de saúde a todos, reestruturação do sistema educacional e redução da dependência quanto ao petróleo, o que incluiria uma lei que limitasse as emissões de carbono e criasse licenças negociáveis de emissão. Internacionalmente, havia as guerras no Iraque e no Afeganistão, o conflito entre Israel e os palestinos e a oposição do Taleban em ascensão no Paquistão.
Em 2009, enquanto a economia se recuperava, Obama decidiu que enfatizaria o esforço pela aprovação da cobertura de saúde universal. Pouca coisa mais foi realizada no plano doméstico. Pelo final do ano, ele parecia ter vencido, apesar da total oposição republicana no Senado. As mais de 2.000 páginas da versão do Senado para o projeto de lei precisavam apenas ser conciliadas com a versão da Câmara; os grandes dispêndios com o novo pacote poderiam começar em 2012.
Massachusetts, o Estado de Ted Kennedy, que trabalhou arduamente e por muito tempo no Senado pela expansão da cobertura de saúde, elegeu na semana passada como seu sucessor o republicano Scott Brown. Algumas semanas atrás, Brown não tinha nenhuma chance em um Estado no qual os democratas têm maioria esmagadora. Agora, ele dará o 41º e decisivo voto contra a aprovação de um texto conciliado entre as duas versões. Eram necessários 60 dos 100 votos no Senado para garantir essa aprovação.
O apoio popular à expansão dos cuidados de saúde está em baixa. A oposição ao novo reforço de 30 mil soldados para o Afeganistão, decidido em novembro, provou ser nova linha divisória. A recuperação econômica pode estar em curso, mas não é muito pronunciada. A recuperação em "V" está rapidamente ganhando forma de "U", e a curva ascendente talvez seja muito modesta. A próxima geração terá de pagar os atuais deficit fiscais da ordem de mais de 10%, mais ou menos o mesmo nível do desemprego. As bonificações recordes em Wall Street causaram ira.
A esquerda e a direita estão ambas muito insatisfeitas, e falta um centro firme. Isso torna muito difícil obter uma maioria confiável que permita avanço. No Brasil, é fácil compreender esse problema.
Possíveis soluções para o dilema da saúde ocupam as páginas dos jornais e excluem os demais assuntos do rádio e da televisão. Elas variam de recomeçar do zero a conseguir que a Câmara aceite a versão do Senado. As reuniões entre políticos são constantes. Muitos democratas estão preocupados com as potenciais implicações para as eleições de novembro. Na mais recente votação, eles perderam dois governos estaduais.
Obama terá agora de decidir como reagir. A decisão será importante não apenas para o seu futuro como para o do país. Restam muitas coisas importantes a realizar. Recuar com relação àquilo que já foi realizado seria um erro. E o mesmo vale para ignorar os sentimentos atuais dos eleitores. Ele terá de reforçar o centro. É isso o que os líderes efetivos de democracias rapidamente aprendem.


ALBERT FISHLOW , 74, é professor emérito da Universidade Columbia e da Universidade Berkeley. Escreve quinzenalmente, aos domingos, nesta coluna.
afishlow@uol.com.br
Tradução de PAULO MIGLIACCI


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