São Paulo, segunda-feira, 24 de julho de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MÍDIA
Para o bilionário americano vice-presidente da Time Warner, jornais também perdem com a rede de computadores
Internet rouba audiência da TV, diz Turner

Fabrizia Granatieri
Ted Turner, vice-presidente da Time Warner, no parque Lage


CLAUDIA ANTUNES
FERNANDA DA ESCÓSSIA


DA SUCURSAL DO RIO

A concorrência com a Internet levou parte da audiência de jornais e emissoras de TV, avalia o vice-presidente do grupo Time Warner, o bilionário americano Ted Turner, 61.
Esse foi um dos motivos que levaram a Time Warner ao processo de fusão com a America Online, o gigante mundial da Internet. A megafusão, anunciada em janeiro, está sendo concluída nos EUA, "mas os concorrentes estão gritando até a morte", nas palavras de Turner.
Um dos 20 homens mais ricos dos EUA, dono de mais de US$ 10 bilhões, Turner foi o criador da CNN -canal de TV paga que transmite notícias 24 horas por dia. Turner veio ao Brasil como filantropo e membro do conselho da Fundação das Nações Unidas.
A entidade surgiu em 97 a partir de uma doação de US$ 1 bilhão feita por ele à ONU. Investe em projetos sociais no mundo inteiro e hoje deverá anunciar, em Brasília, novas parcerias no país.
Para Turner, uma das prioridades é controlar o crescimento da população mundial. "Olhe para as pessoas vivendo nos morros. Não há recursos suficientes", diz ele.
Mais interessado em defender causas sociais e ecológicas do que em falar de seus negócios, Turner concedeu a seguinte entrevista à Folha, no Rio de Janeiro.

Folha - Quando o senhor anunciou a doação, havia uma campanha nos EUA contra a ONU. Os congressistas republicanos bloqueavam o pagamento da dívida norte-americana à organização. A doação teve motivação política?
Ted Turner -
Os EUA não estavam pagando seus débitos à ONU, mas o apoio entre o povo norte-americano à ONU era grande. As Nações Unidas não tinham dinheiro para pagar as contas. A idéia foi parcialmente motivada por isso.

Folha - Quais são os principais projetos que a Fundação está interessada em promover?
Turner -
Os que tentam fazer as coisas mais igualitárias e melhores para a humanidade. Nós nos importamos com o estado do planeta, os oceanos, a atmosfera, as florestas tropicais.

Folha - Por que o senhor tem se mostrado tão preocupado com o aumento da população mundial?
Turner -
Claro! Olhe para as pessoas vivendo nos morros. Não há recursos suficientes. Há recursos suficientes se você matar tudo em volta e seguir colocando as pessoas em todos os lugares. Mas que tipo de mundo seria esse sem animaizinhos e flores, exceto talvez cultivadas num canteiro?

Folha - O senhor não acha que, mais do que o crescimento populacional, o problema é a distribuição de renda?
Turner -
Não é assim. Quando eu nasci, havia 2 bilhões de pessoas. Hoje há 6 bilhões, a população triplicou em mais ou menos 60 anos. Durante esse tempo, o número de elefantes caiu 99%, o número de rinocerontes caiu 99,9%. As pessoas estão consumindo mais do que quando eu nasci. Quando eu era um garotinho, poucas pessoas tinham automóvel e, se tinham, só tinham um. Se nós não mudarmos as coisas, metade das espécies do mundo será extinta neste século. Talvez seja possível suportar 10 bilhões de pessoas na Terra, se elas viverem como os indianos, com 70% sem ter o suficiente para comer. Mas seria possível ter 3 bilhões ou 4 bilhões de pessoas numa situação de classe média alta, com o suficiente para comer, sem tanta poluição.

Folha - A fundação prioriza projetos de controle da natalidade?
Turner -
Planejamento familiar, eu diria. Controle tem um conotação ruim, não acha? Estamos tentando ajudar (projetos na área de) mulheres, crianças, planejamento familiar, meio ambiente, paz e segurança. Nos EUA, a maior parte do dinheiro de doações vai para as igrejas. As pessoas acham que receberão um tratamento melhor quando morrerem. Os ricos dão dinheiro para o que os beneficia, como os museus e a ópera. Nós estamos tentando diminuir a desigualdade entre os ricos e pobres.

Folha - O senhor se acha diferente de outros milionários?
Turner -
Pessoas são como flocos de neve, são diferentes. Acho que o que estamos fazendo, no tamanho e no dinheiro, ninguém jamais fez.

Folha - A CNN tem perdido muita audiência. A que o senhor atribui essa crise?
Turner -
Porque temos muita competição. Se há somente um jornal em uma cidade, ele vai ter toda a audiência. Se há dois ou três, a audiência diminui um pouco. Houve um tempo em que tínhamos toda a audiência, assim como o Brasil já teve todo o café e todas as bananas!

Folha - O senhor tem medo da concorrência dos serviços de informação na Internet? Isso é a causa da queda de audiência?
Turner -
Os serviços por computadores vão de fato levar parte da audiência dos telejornais, é claro. E vão levar dos jornais também. Os jornais estarão com problemas muito sérios, na minha opinião, porque você tem as notícias com um dia de atraso, enquanto na Internet você tem as notícias básicas dos jornais hoje. E, além disso, você tem de distribuir os jornais, cortar árvores, pegar os jornais de volta, reciclá-los, é uma confusão.

Folha - Como o senhor avalia o processo de fusão da Time Warner com a AOL?
Turner -
Estávamos com tanto medo de que a Internet tomasse tanto (da audiência) que tivemos de entrar no negócio. Veja o que a Globo faz. Eles eram um jornal, então entraram no rádio, na televisão, na TV paga, agora estão entrando na Internet. Você tem que se manter atualizado.

Folha - Mas há obstáculos nos EUA à conclusão da fusão?
Turner -
Claro que há. Nossos competidores estão gritando até a morte. Mas não deveríamos estar falando disso. É suficiente.

Folha - Pessoalmente, o senhor faz alguma coisa para reduzir o consumo no mundo?
Turner -
Claro, faço o que posso. Até pego lixo na rua e coloco na cesta. Por que eu daria todo esse dinheiro se não tivesse tentando fazer isso também na minha vida pessoal? Eu dirijo um carro pequeno, e vou ter um ainda menor. Tento viver de modo que seja um pouco de exemplo.

Folha - O casamento com a atriz Jane Fonda (de quem está separado) o influenciou politicamente?
Turner -
De certo modo, sim. Mas eu já era muito liberal. De outro modo, eu não poderia ter gostado dela, porque ela era mais como uma comunista, socialista.

Folha - O senhor é socialista?
Turner -
Não. Mas eu me importo com as pessoas, acho que seria bom se todo mundo vivesse bem. Isso é um socialista, certo?

Folha - Haverá uma CNN em português, já que o Brasil é o segundo mercado estrangeiro da rede?
Turner -
Acho que não, porque somos sócios da Globo na Futura e eles não querem que façamos isso. Eles querem ter todas as notícias em português, é difícil enfrentá-los no Brasil.


Texto Anterior: Opinião econômica - João Sayad: O segundo Brasil
Próximo Texto: Multimídia: Filho norte-americano "custa" US$ 290 mil
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.