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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
A crise financeira e o Brasil
Mesmo num cenário mais
perverso, os US$ 160 bilhões
de reservas serão um eficiente guarda-costas para todos nós
A CRISE nos mercados financeiros tem provocado um intenso debate sobre suas conseqüências para a economia brasileira.
Como sempre acontece, encontramos posições polares, que variam da
imagem da blindagem total às previsões pessimistas sobre nosso crescimento econômico. O presidente
Luiz Inácio Lula da Silva disse que a
crise é norte-americana e que o Brasil não tem nada com isso. Seu ministro da Fazenda participou até de
talking shows para vender a imagem
da blindagem construída nos últimos anos pelo governo petista.
Do lado pessimista, estão principalmente os investidores estrangeiros e outros participantes do mercado.
Hoje, a curva de juros locais indica uma rodada de aumentos das taxas, já refletindo certa insegurança
na perspectiva do câmbio e, conseqüentemente, da inflação. Nas Bolsas de Valores, as ações de setores
que dependem do crédito de longo
prazo a taxas de juros decentes, como a construção civil, chegaram a
cair mais de 25%. O real, hoje uma
moeda musculosa com os US$ 160
bilhões das reservas do Banco Central, perdeu no pior momento quase
15% de seu valor.
Para que se possa fazer uma avaliação correta dos impactos dessa
crise sobre nossa economia, é necessário que algumas premissas sejam
estabelecidas de início. A primeira
delas é que a crise de confiança que
abala os alicerces mais importantes
do mercado americano vai ser controlada em um espaço de tempo não
muito grande. Apesar de toda a loucura que tomou conta de partes importantes desse mercado, é necessário entender que existem mecanismos institucionais eficientes -e que
já estão funcionando- para lidar
com esse tipo de crise.
A segunda questão a ser considerada é que as economias de mercado
modernas criam mecanismos compensatórios que funcionam no sentido de corrigir as forças que criaram
a própria crise. Não há dúvida de que
a crise atual foi semeada por anos de
juros baixos no mundo. Quando a
inflação passou a ser um risco sério
na maior economia do mundo, o
custo do dinheiro começou a subir.
Os mercados, acostumados há vários anos de dinheiro barato, ignoraram esse ajuste e continuaram a viver dias de euforia, principalmente
nos mercados de crédito. Mas, como
o dito popular, água mole em pedra
dura tanto bate até que fura.
Agora, com os mercados elevando
o custo de crédito para patamares
mais normais, estão sendo criadas
forças de desinflação nos Estados
Unidos. Além disso, a taxa de desemprego iniciou um claro movimento de elevação e a economia
americana já está crescendo menos,
aliviando as pressões inflacionárias,
o que em breve permitirá ao Fed
(Federal Reserve, o banco central
norte-americano) iniciar um processo de redução dos juros. Isso já
vinha ocorrendo mesmo antes dos
acontecimentos recentes.
A dúvida que ainda fica é se nesse
processo a economia americana vai
perder sustentação e entrar em uma
fase de crescimento muito baixo.
Nesse caso, o resto do mundo, mesmo com a China funcionando com
todos os cilindros de seu motor, pode ter uma desaceleração forte. Esse
cenário negativo afetaria também o
Brasil, adiando o sonho de um período mais prolongado de crescimento
da ordem de 5% ao ano.
Mas, mesmo nesse quadro mais
perverso, não espere uma crise grave como vivemos no passado. Os
US$ 160 bilhões de reservas serão
um eficiente guarda-costas para todos nós.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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