São Paulo, domingo, 24 de agosto de 2008

Texto Anterior | Índice

Marca produz conteúdo para se promover

Conhecido como "branded content", esse tipo de propaganda cresce no país com rádios como a Mitsubishi FM e a Oi FM

Tendência também existe em outras mídias, como televisão e internet, e pode até se tornar fonte de receita para as empresas

CRISTIANE BARBIERI
DA REPORTAGEM LOCAL

Com poucas alternativas no dial que fujam do padrão pop ou da música religiosa, o paulistano foi surpreendido por duas rádios diferentes. Em junho, entrou no ar a Mitsubishi FM e, no mês passado, a Oi FM.
Além de carregarem nomes de empresas, as músicas e os programas jornalísticos veiculados procuram traduzir a "cara" das marcas e atrair uma audiência que se identifique com elas. "Tocamos músicas vibrantes e para cima, que mostram o espírito 4x4", diz Eduardo Barão, diretor da Mitsubishi FM.
Por trás do movimento está uma nova tendência da publicidade, o "branded content", como é chamada a produção de conteúdo feita por marcas. Em vez de simplesmente patrocinar programas ou fazer propaganda tradicional, as empresas têm, cada vez mais, produzido conteúdo para atrair a simpatia do consumidor mais crítico e arisco dos tempos de internet.
"Propaganda é interrupção de um prazer", diz Hércules Florence, sócio da agência Share Brand Entertainment. "Com controle remoto, podcasts, rádios e TV digitais, cada vez menos o consumidor está disposto a ver propaganda."
Apesar de a face mais recente ser a das rádios, a tendência já chegou ou está se espalhando para outras formas de mídia. De revistas a internet, passando por televisão e canais em trens e táxis, as marcas estão bombardeando o consumidor de maneiras que ele, se consegue detectar, muitas vezes não se importa de ser submetido a esse tipo de propaganda.
Pioneira nas rádios de marca em São Paulo, a SulAmérica FM foi criada por necessidade. Apesar de ser a segunda empresa de seguros em termos de receita, era a quinta marca na lembrança dos paulistanos.
"O paulistano lembra do trânsito 365 dias por ano", afirma Zeca Vieira, diretor de marketing da SulAmérica Seguros. "Conseguimos achar uma fórmula em que juntamos prestação de serviços com rádio, que é extremamente relevante para o nosso público."
"Até mesmo quando, depois de uma campanha, fazíamos pesquisas de recall, os consumidores diziam que nossa propaganda era do concorrente", diz Vieira. "Resolvemos, então, só investir em algo relevante para a população."
No ar há mais de um ano, a rádio SulAmérica atingiu o objetivo: fez com que a marca se tornasse a segunda mais lembrada pelo paulistano. Acompanhada do reposicionamento de vendas, a receita proveniente da cidade cresceu 30%.

Risco
Se por um lado o conteúdo de marca pode aumentar reconhecimento e faturamento, por outro é uma estratégia arriscada: produzir conteúdo atraente não é tarefa simples.
Neste mês, a Locaweb lançou uma série de ficção na internet, que explica os serviços prestados pela empresa de tecnologia. Apesar de alguns capítulos terem tido boa audiência e elogios na rede, diversos internautas aproveitam o espaço interativo para reclamar da qualidade dos serviços prestados pela empresa. Houve, ainda, protestos de entidade das secretárias, uma vez que uma das personagens é uma secretária curvilínea, pouco inteligente e sujeita a cantadas constantes do chefe.
"A relevância e a pertinência do conteúdo em relação à marca são fundamentais para o sucesso da estratégia", diz Giovanni Rivetti, diretor-geral da agência New Content. "Travestir-se de conteúdo sem entregar o prometido é péssimo porque gera expectativa, mas frustra e afasta o consumidor."
Quando bem-sucedido, porém, o conteúdo de marca tem resultados permanentes, que duram muito tempo depois que os investimentos foram feitos. É o caso dos filmes da BMW estrelados por Clive Owen e dirigidos por nomes como Ang Lee, John Woo e Guy Ritchie.
Considerados o marco inicial do conteúdo de marca, os filmes mereceram a criação de uma categoria especial no Festival de Propaganda de Cannes, a dos Cyber Lions, em 2003. Elencos formados por Madonna, Forest Whitaker, Mickey Rourke e Adriana Lima transformaram os episódios -e a marca- em símbolo cult.
Outro efeito benéfico da tendência é que o conteúdo de marca pode se tornar fonte de receita ou, no mínimo, ajudar a reduzir os investimentos na campanha. Com uma média de quase 10 milhões de espectadores por edição, os desfiles da grife de lingerie Victoria's Secret são comprados por dezenas de emissoras de TV e sites.
Concessões públicas, as rádios das marcas têm a programação produzidas por emissoras. Porém, à medida que os anúncios são vendidos, os custos pagos pelas empresas às emissoras caem. "É um bom artifício porque o custo da produção de conteúdo é alto", diz Vieira, da SulAmérica.
A maior parte do mercado encara a tendência como forma de fortalecer a marca. "Os projetos têm de ser vistos como investimento em marketing, e não como fonte de receita", diz Flavio Rozemblatt, diretor-geral da agência Selulloid.
Algumas empresas concordam. "Nosso negócio é vender carros", afirma Renata Souza Ramos, diretora de marketing da Mitsubishi Motors. "Fazemos o rali, a revista e, agora, a rádio, para investir na marca, e não para lucrar."


Texto Anterior: Só incentivo tira projetos de SP, diz secretário
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.