São Paulo, terça-feira, 24 de setembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

EM TRANSE

Mercado faz poucos negócios devido à incerteza na transição política; vencimento de dívida pública ajuda a derrubar real

Lula e dívida pública levam dólar a recorde


O dólar chegou ontem à maior cotação do Plano Real. O cenário eleitoral e as incertezas da conjuntura internacional -retração de investimentos, queda nas Bolsas e alta do petróleo- fazem aumentar a procura pela moeda dos EUA


ANA PAULA RAGAZZI
FABRICIO VIEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

A duas semanas das eleição presidencial, o dólar bateu novo recorde do Plano Real. A moeda norte-americana subiu 4,85%. Para comprar um dólar, eram necessários R$ 3,57 no final do dia. O recorde anterior eram os R$ 3,47 de 31 de julho passado.
O risco Brasil subiu 9,7%, para 2.175 pontos.
A pesquisa Datafolha, divulgada no final de semana, foi o principal motivo para a alta de ontem. O resultado mostrou que são grandes as chances de o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, vencer a disputa já no primeiro turno. Esse cenário desagrada aos investidores, o que fez crescer a procura por dólares. O candidato do mercado é o candidato do governo, José Serra (PSDB), associado à manutenção da atual política econômica.
As incertezas são muitas. Não se sabe se haverá segundo turno e, em caso da confirmação da vitória de Lula, qual serão os rumos da economia. Além disso, há a deterioração da economia americana, abalada por lucros baixos e escândalos, e o temor de uma guerra entre os EUA e o Iraque. Tais fatores aumentam a aversão do investidor ao risco e diminuem o fluxo de dólares para o país.
"Indefinição é o que menos agrada ao mercado", afirma Álvaro Bandeira, da corretora Ágora Sênior. "Quando o investidor não consegue enxergar o futuro, forma-se um ambiente propício a qualquer tipo de boato."
Nesse cenário, ninguém quer se desfazer de dólares. Com isso, qualquer operação concluída pressiona o câmbio. "No começo da tarde, o telefone já nem tocava mais. Foi um dia muito ruim para fechar negócios, que ficaram concentrados nas mãos de tesourarias", diz Miriam Tavares, diretora de câmbio da corretora AGK.
Segundo operadores, os negócios ontem movimentaram apenas pouco mais de US$ 600 milhões, metade do normal.
O Banco Central não conseguiu deter a queda do real. Vendeu dólares no mercado à vista e realizou leilão de linha de exportação, de US$ 48 milhões.
O dólar subiu também devido ao vencimento de US$ 1,5 bilhão de dívida cambial, amanhã. Na semana passada, o BC optou por não fazer a rolagem desses papéis. Como a liquidação é feita pelo Ptax (preço médio do dólar, medido diariamente pelo BC) de hoje, quanto mais alto estiver o câmbio maior será o ganho do detentor dos títulos. Segundo operadores, os bancos estariam tentando pressionar a cotação. O dólar pode ter mais um dia de alta hoje, por esse motivo.
Para hoje também é esperada a divulgação de nova pesquisa eleitoral do Ibope. Se a sondagem confirmar os números do Datafolha,o nervosismo deverá crescer.
Se o mercado der como certa uma vitória de Lula, analistas avaliam que o petista deverá agir rápido para acalmar a situação: "Lula precisaria anunciar a sua equipe econômica logo, para dar um parâmetro ao mercado", diz Clive Botelho, do banco Santos.
Em especial porque em outubro há forte concentração de vencimentos de dívidas dos setores público e privado -aproximadamente US$ 6 bilhões em dívida do governo atrelada ao dólar e cerca de US$ 1,3 bilhão em débitos de empresas.
"Não adianta, em um mercado como o atual, o BC sair queimando mais reservas para tentar segurar o câmbio. O mercado está sem vendedor. Ninguém quer se desfazer de dólares neste momento, o que faz a cotação subir com tanta facilidade", diz Luis Henrique Didier, presidente da Abracam (Associação Brasileira das Corretoras de Câmbio).


Texto Anterior: Painel S.A.
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.