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LUÍS NASSIF
"Foro especial" e reforma radical
A polêmica pode ser um
exercício extraordinário de
inteligência. Havendo bom nível de parte a parte, ambos os lados chegarão ao final da polêmica pensando de maneira diferente em relação ao estágio inicial da discussão.
Vamos aplicar esse belo ideal
grego às nossas polêmicas públicas, o "foro especial", por exemplo, que permitirá a autoridades
e ex-autoridades serem julgadas
por instâncias superiores, sem
passar pelo crivo da primeira
instância.
Os críticos dizem que o "foro
especial" será uma maneira de
evitar a punição aos culpados.
Os defensores acham que, pelo
contrário, é uma defesa dos inocentes. Há casos concretos de
autoridades ou funcionários
que deixam o governo e são submetidos a uma enxurrada de
ações, muitas deles inconsequentes, apenas por vingança
política. Basta encontrar, entre
centenas de juízes de primeira
instância, um apenas que aceite
a ação.
Alguns críticos do "foro especial" aceitam que esse é um problema real, que sua não adoção
permitirá a qualquer juiz de primeira instância do interior expedir ordem de prisão contra
um ex-presidente da República
com base em informações contraditórias.
Nem seria preciso dramatizar
tanto. Dez ações irrelevantes,
mesmo não tendo consequências tão dramáticas como a prisão, podem quebrar financeiramente a vítima pela necessidade
de ela contratar advogados
-especialmente funcionários
de menor escalão, com menores
condições de conseguir bons advogados.
Posto que o problema existe,
qual a solução? Aí entra essa
maravilha da retórica generalista, a proposta da solução genérico-radical: em vez do paliativo do "foro especial", uma reforma radical do Judiciário. Para quê, mesmo? Para impedir
que um juiz de primeira instância do interior possa dar voz de
prisão a ex-autoridades com base em argumentos contraditórios -que é justamente a distorção que o "foro privilegiado"
se propõe a corrigir.
O que parece ser vontade de
radicalizar no fundo nada mais
é do que a dificuldade de refinar
o raciocínio e pensar propostas
alternativas. Há alternativas ao
"foro especial", como, por exemplo, prever punição a juízes que
apliquem penas desproporcionais à falta cometida ou a procuradores que impetrem ações
não fundamentadas. Por que
esses pensadores radicais não
propõem abertamente essa saída? Hipótese 1: não pensaram.
Hipótese 2: até pensaram, mas
ficaram com receio de que a saída não fosse considerada politicamente correta. Afinal, não
deixa de ser uma restrição ao
trabalho dos juízes e procuradores, maior ainda que o "foro especial". E, se apresentarem uma
proposta específica, sujeitam-se
a ser questionados e terão que
dispor de fôlego para defendê-las.
Viva, pois, a reforma radical
do Judiciário.
Custo mídia
A Sadia é dos maiores exportadores brasileiros. Nessa condição, toma financiamento do
BNDES e paga em dia. A notícia
diz que a empresa -presidida
pelo futuro ministro do Desenvolvimento- deve ao BNDES.
Deve, é claro, mas não nega, e
paga em dia, como ocorre com
qualquer bom cliente de banco.
O futuro ministro da Agricultura presidia uma agência do
Estado de São Paulo que fazia
meras recomendações de empresas para planos estratégicos
do Estado. O Banespa concede
financiamentos ruinosos à empresa, e o Ministério Público
abre processo indiscriminado
envolvendo todo mundo. Pouco
importa que recomendação nada tenha a ver com análise de
crédito ou se inquérito não significa condenação.
Aí o correspondente do "New
York Times" no Rio de Janeiro,
para confirmar que a falta de
critério não é coisa nossa, publica texto no seu jornal, com repercussão internacional, tratando como escândalo o que não é,
comprometendo a dura tarefa
de reduzir as desconfianças internacionais em relação ao
governo Lula.
Em cima de fumaça, mais
desconfiança, mais taxa de
risco, mais atraso na retomada dos financiamentos externos.
E-mail - lnassif@uol.com.br
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