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Desde 2001, crescimento favorece pobres
Rendimento de famílias de classes mais baixas aumentou mesmo durante períodos de estagnação, diz estudo da FGV e da ONU
Movimento teve como impulso a alta dos gastos sociais, mas, a partir de 2004, emprego também favoreceu baixa renda
MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL
O crescimento econômico
brasileiro continua anêmico,
mas há uma parcela da população para a qual a renda cresceu
a taxas muito superiores às da
economia. Ao contrário dos
anos 70 e até 80, quando o Brasil crescia ou se estagnava concentrando riqueza, os anos
2000 inauguraram um período
de crescimento "pró-pobres".
Entre 2001 e 2004, a renda
dos mais pobres cresceu a um
ritmo muito superior ao da renda per capita, tendência que se
repete em 2005 e, provavelmente, neste ano.
O economista Marcelo Neri,
do Centro de Políticas Sociais
da FGV, calculou, junto com os
economistas Nanak Kakwani e
Hyun H. Son, das Nações Unidas, as taxas de crescimento
que refletem a evolução da renda dos mais pobres.
Os números mostram que,
apesar do desempenho decepcionante da economia, a população de baixa renda obteve, em
período de relativa estagnação,
o que Neri chama de "experimento de crescimento chinês".
Entre 2001 e 2004, mostra o
estudo, a taxa de crescimento
da renda per capita "pró-pobre", ou seja, aquela que reflete
os ganhos da população de baixa renda, foi, em média, de 3,1%
ao ano. No mesmo período, a
renda per capita caiu a um ritmo de 1,35% ao ano.
A contradição entre o desempenho ruim do ponto de vista
econômico e o bom desempenho do ponto de vista social é
explicada pelo fato de, mesmo
em período em que a economia
patinou, o governo ter destinado mais recursos aos programas de combate à pobreza
-que, na prática, aumentam a
renda dos mais pobres.
Os números podem ser olhados de outra maneira também:
eles refletem a queda na desigualdade de renda brasileira, já
que os pobres conseguiram,
ainda que timidamente, reduzir o abismo que os separa dos
mais ricos. Neri ainda faz as
contas para os anos de 2005 e
2006. Ele avalia que a melhora
de distribuição de renda ocorreu, mas em velocidade menor
do que a de, por exemplo, 2004.
Em 2005, lembra ele, a renda
dos mais pobres cresceu 8,5%,
contra 6% da renda média.
"Ano espetacular"
Já é um ganho. Mas um ganho que empalidece quando a
comparação é com 2004. Naquele ano, em que a economia
cresceu 4,9%, a taxa de crescimento da renda per capita para
os mais pobres, estimada por
Neri, foi de nada menos do que
14,1%, enquanto a renda per capita média cresceu 3,6%. "2004
é o grande ano da queda da desigualdade no Brasil, um ano
espetacular", diz o economista.
A pesquisa mostra o quanto o
gasto social tem sido importante para a redução da desigualdade e a melhoria das condições de vida dos mais pobres,
mas sugere também que nada
melhor do que o crescimento
econômico para ajudá-los.
Em 2004, uma conjunção de
fatores "pró-pobres" contribuiu para a redução da desigualdade. O aumento dos gastos sociais, presente em todo o
período, ajudou, mas em 2004
a estrela foi mesmo o mercado
de trabalho: o aumento do emprego e da renda beneficiou
proporcionalmente os mais pobres. "O desempenho é muito
puxado pela renda do trabalho.
O que é muito importante, porque é algo que não acontecia."
Aliás, o ano de 2004, quando
a recuperação do mercado de
trabalho beneficiou muito os
pobres, foi inédito não apenas
pelo fato de o Brasil ter crescido
mais que a média dos últimos
anos, mas também por ter crescido e desconcentrado riqueza.
Ficou famosa no Brasil a tese
de que "o bolo precisa crescer
para ser dividido", frase de Delfim Netto, que, de alguma maneira, tentava justificar o fato
de, nos anos 70, com forte crescimento, o Brasil ter passado
também por processo de forte
concentração de riqueza.
Crescimento, dizem os economistas, leva à concentração,
a não ser que o Estado aja de
maneira a torná-lo mais justo.
Ainda há dúvidas se esse é o caso do Brasil e sobre o que ocorrerá quando e se o país voltar à
rota do crescimento. Mas os resultados de 2004 parecem sugerir que não é impossível, no
caso da economia brasileira,
conseguir crescer e, ao mesmo
tempo, repartir melhor a riqueza, mostra o estudo.
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