São Paulo, segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

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Economista critica a falta de transparência

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O resultado ruim da Caixa no terceiro trimestre e a polêmica em torno da divulgação dos números oficiais reacenderam a discussão sobre o uso social dos bancos públicos e a transparência da prestação de suas contas.
Para o economista Armando Castelar, o desempenho ruim de um dos maiores bancos do país, controlado 100% pela União, só se justificaria se fosse em razão de políticas públicas, devidamente anunciadas pelo governo e com total transparência nos resultados.
"A Caixa ter lucro pequeno em relação aos bancos privados ou um prejuízo deveria ser por políticas definidas no Orçamento, e não uma surpresa. Todo mundo deveria saber, e o governo deveria mostrar a evidência de que esse resultado foi fruto de projetos de interesse público e com retorno para sociedade. Mas isso não se discute no Brasil. A população não sabe nem para onde vai o dinheiro", afirma Castelar, pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), órgão vinculado ao governo, e um dos organizadores do livro "Mercado de Capitais e Bancos Públicos", coletânea de artigos sobre o tema lançado há pouco.
Ele diz que uma análise da atuação dos bancos federais entre 1995 e 2004 mostra que não há comprovação de que essas instituições geraram crescimento adicional nos locais onde investiram. "Os empréstimos feitos por Caixa, Banco do Brasil e BNDES não explicam o desempenho das cidades. Não há comprovação de que quem recebeu mais, cresceu mais."
Segundo ele, num país que tem hoje um dos sistemas financeiros mais avançados no mundo, os bancos públicos servem a todo tipo de discurso oficial. Se dão lucro, é prova de que é possível ser público e lucrar como os privados. Se têm resultado ruim, é porque não estão no mercado só pensando em lucro e têm funções sociais.
"Mas onde estão as evidências de que um resultado eventualmente ruim foi fruto de uma opção de política, e não por incompetência ou má gestão?", questiona. "Por que não deixar claro o que é o resultado de banco comercial e o de um banco social?", completa.
O caso da Caixa ilustra bem a questão. A Folha apurou que a instituição vive hoje uma espécie de "crise de identidade", ao misturar os custos das suas políticas sociais com a imagem que tenta vender de um banco comercial nos mesmo moldes do BB e de outros privados.
Um exemplo é o setor imobiliário. Durante anos, o governo avaliou que era uma distorção a Caixa ser praticamente o único agente financeiro na área, sensível aos gestores públicos. Como não havia interesse privado, a Caixa cumpriu esse papel e externou sua vocação.
Agora que seus concorrentes começam a explorar também esse nicho, o que deveria aliviar a Caixa para atuar em outras áreas também lucrativas, com retornos mais rápidos, a concorrência virou uma polêmica entre executivos do banco que não admitem perda de participação no ramo imobiliário.
Segundo integrante do governo ligado ao banco ouvido pela Folha, o problema é que a Caixa, ao mesmo tempo em que tem fontes cativas de recursos baratos, carrega atribuições que pesam na sua contabilidade e não quer assumir isso publicamente. Em vez disso, luta para manter a imagem, ao lado do BB, como exemplo de "banco comercial, grande, público e com resultados gordos".
Talvez isso justifique a confusão gerada com a divulgação do balanço do terceiro trimestre. Na coletiva para apresentar os dados, a Caixa divulgou o resultado acumulado em nove meses, com lucro de R$ 1,778 bilhão. E só apresentou parcialmente os números do trimestre, mostrando o lucro pífio de R$ 63 milhões, após queixa dos jornalistas.


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