São Paulo, domingo, 25 de janeiro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LEITE DERRAMADO

Polícia e Receita Federal suspeitam que associação no futebol tenha sido usada para enviar recursos ao exterior

Parceria Palmeiras-Parmalat é alvo da PF

JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
DA REPORTAGEM LOCAL

Apontada pela Fifa (federação que rege o futebol mundial) como um dos dez casos mais bem-sucedidos da história do marketing no futebol, a parceria Palmeiras-Parmalat, que, entre 1992 e 2000, deu ao clube os principais títulos de sua história, será alvo de devassa da Receita e da Polícia Federal.
A suspeita é que o futebol tenha sido usado pela Parmalat Brasil para desviar recursos ao exterior. A Parmalat Participações, uma das três divisões do grupo Parmalat e que depois originaria a Carital Brasil, teria recebido dinheiro da Parmalat Administração, responsável pelo setor de alimentos, e depois o remetido para fora do país pela venda de atletas.
Segundo a diretoria palmeirense, recursos da transação de pelo menos três jogadores negociados pela Parmalat com o exterior passaram pelo Uruguai, tido como o paraíso fiscal da América do Sul.
O dinheiro teria sido depositado em uma das contas da Wishaw Trading, empresa uruguaia que recebeu R$ 583,8 milhões da Parmalat do Brasil e está sob investigação depois das denúncias de Gianfranco Bocchi.
O ex-contador da Parmalat Itália afirmou à Justiça que a Carital Brasil e a Wishaw realizaram negócios estranhos e receberam "sacos de dinheiro" da matriz.
Segundo a promotoria italiana, parte dos US$ 15 milhões que o Parma diz ter investido na contratação do meia brasileiro Alex, hoje no Cruzeiro, teria ido parar na empresa uruguaia.
No período da co-gestão com o Palmeiras, que durou de 1992 a 2000, o clube entrava com a tradição e a estrutura, e a empresa, com uma verba mensal de R$ 800 mil -valores atualizados-, além do compromisso de reforçar o time, comprando e vendendo jogadores. E é aí que a versão das duas partes não bate.
Como, pela legislação esportiva, empresas não podiam ser donas de jogadores de futebol, oficialmente o Palmeiras era o detentor dos direitos federativos dos atletas e responsável por registrá-los na CBF (Confederação Brasileira de Futebol). O contrato com a Parmalat, porém, assegurava-lhe que, na hora de vender o jogador, a negociação não só seria encabeçada pela empresa como os recursos da transação ficariam com ela.
Segundo o Palmeiras, quando um atleta era contratado pela Parmalat, quem sempre ficava à frente das negociações era a multinacional, que fazia os depósitos nas contas de quem estivesse vendendo. Na hora de se desfazer do jogador, idem. Os depósitos eram feitos diretamente na conta da Parmalat ou da empresa que ela indicasse e não passavam pelo Palmeiras. Segundo o clube, então, qualquer irregularidade na compra e venda de reforços é de responsabilidade da ex-parceira.
A Parmalat conta outra história. Diz que todo o dinheiro passava pelo caixa do Palmeiras. Era o clube quem pagava pela compra do jogador com o dinheiro depositado em sua conta pela empresa e, na venda, ele fazia o depósito na conta da Parmalat Participações.
Outra divergência entre as partes diz respeito à relação com a Carital Brasil, empresa citada pelo ex-contador da Parmalat no depoimento à Justiça italiana sobre o rombo de cerca de 10 bilhões nos cofres da multinacional.
José Carlos Brunoro, que foi o diretor da Parmalat para o Palmeiras entre 1992 e 1997, diz que nunca ouviu falar da Carital, que tinha como um dos objetivos justamente cuidar dos investimentos da Parmalat no esporte.
O Palmeiras, porém, afirma que não só conhecia a Carital como diz que ela chegou a lhe pagar algumas das parcelas do contrato de patrocínio com a Parmalat.
Segundo dirigentes do Palmeiras, o clube, especialmente a partir de 1995, passou a se relacionar com uma série de empresas ligadas à Parmalat, já que a parceria criou uma espécie de labirinto societário no Brasil.
Em 1998, a Carital, que já trabalhava com Palmeiras e Juventude (RS), também controlado pela Parmalat, deu origem à Carital Prosport, que teve como sócio Gianni Grisendi, então presidente da Parmalat Brasil.
Foi a Carital Prosport que comprou, em parceria com a Parmalat Participações, o Etti Jundiaí.
Em 2000, quando encerrou o contrato com o Palmeiras, a Parmalat Participações transferiu R$ 44,7 milhões, saldo de seu patrimônio no clube, para o Etti.
No ano seguinte, ela deixou o time de Jundiaí e a Carital Prosport transferiu suas cotas para a Carital Brasil e a Santal Prosport, também do grupo Parmalat. Em 2002, as duas saíram do clube, que voltou a se chamar Paulista.
Fora do futebol brasileiro, a Parmalat já saiu da história para a Fifa. O "case" com o Palmeiras não será mais usado como exemplo de sucesso na faculdade que a entidade mantém na Europa.



Texto Anterior: Painel S. A.
Próximo Texto: Era o clube
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.