|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Nuvens no horizonte...
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Depois de mais de um ano de
euforia com a economia
brasileira, entramos, mais uma
vez, em um tempo de incertezas.
A mudança de algumas palavras-chaves do comunicado, que se segue a cada reunião do comitê de
Open Market do Federal Reserve
nos Estados Unidos, trouxe de
volta turbulências aos mercados
financeiros mundiais. Para usar
uma imagem que tem freqüentado esta coluna: parece que o vulcão vai estragar um piquenique
que já dura mais de ano no mundo global em que vivemos.
Foi esse clima de alegre piquenique, criado pelos juros baixos nos
Estados Unidos e pela expansão
extraordinária da economia chinesa, que embalou o governo do
presidente Lula a partir da segunda metade de 2003. A China fez
com que os preços das commodities, que dominam nossa pauta
de exportação, atingissem valores
inimagináveis há alguns anos. Já
os juros baixos nos Estados Unidos fizeram com que os investidores buscassem alternativas mais
exóticas, como os títulos da dívida externa brasileira, para aplicarem seus recursos.
Com a expansão de nossas exportações e a queda no custo da
rolagem de nossa dívida externa,
a conta corrente do balanço de
pagamentos do país entrou no
azul, depois de décadas de um
monótono tom vermelho. Em um
mundo em que o dólar norte-americano passou a ser olhado
com desconforto, o real atingiu o
estado de moeda forte e ajudou o
Banco Central a reduzir a inflação inchada pelo medo que a vitória de Lula trouxe aos mercados em 2003.
Com a melhora de nossos fundamentos econômicos e a convicção que o ex-líder sindical do
ABC tinha se transformado em
um político conservador, o sistema bancário brasileiro saiu de
sua atitude de cautela e passou a
expandir de forma vigorosa o crédito ao consumidor. Depois do sufoco de dois anos com desemprego
crescente e renda em queda, o
brasileiro passou a uma posição
mais agressiva em suas compras.
Estimulado pelas exportações, e
pelo consumo interno, o PIB expandiu-se de forma vigorosa em
2004, o que provocou -dada
uma carga tributária construída
para tempos de vacas magras-
uma verdadeira derrama fiscal
nos cofres do governo do PT. O
aumento dos gastos de consumo e
transferências colocou mais lenha
na fogueira do crescimento econômico. O céu de nossa economia, depois de vários anos de feições carrancudas e de poucos
amigos, virou "céu de brigadeiro".
Mas esse cenário róseo estava
sendo construído a partir de um
desequilíbrio macroeconômico
mundial crescente e muito perigoso. Entretanto não vivíamos
dias de pessimismo e o espaço para "cassandras" era muito pequeno tanto lá fora como aqui.
Apesar dos avanços indiscutíveis na qualidade dos chamados
fundamentos de nossa economia,
era preciso perceber os riscos que
ainda corríamos. Os juros reais,
em níveis recordes, eram um indicador que não podia ser ignorado, murmuravam poucas vozes
corajosas que se aventuravam pelo caminho do dissenso, como o
ex-presidente do Banco Central
Ibraim Eris.
Já o economista Fernando
Montero alertava para a verdadeira "farra do boi" fiscal do governo Lula, patrocinada por uma
carga fiscal recorde para o nível
de atividade nesses novos tempos
de bonança. O retorno de grandes
projetos polêmicos, como o da
transposição das águas do rio São
Francisco, por tanto tempo adiado, era um indicador importante
dessa falta de cuidado com o futuro.
Quem tem um pouco de experiência com a economia global de
hoje sabia que esses pequenos pecados, esquecidos em tempos de
euforia, seriam lembrados quando a situação conjuntural fosse
menos favorável. Isso está acontecendo agora, com o reconhecimento de que a política de juros
do Fed vai ser mais agressiva do
que o esperado pelos mercados.
Nesta última semana, a questão
fiscal brasileira já fez parte do noticiário internacional. Uma das
agências de "rating" de crédito,
que avalia a situação brasileira,
enviou uma mensagem clara: a
tão esperada melhora na nota
brasileira só vai ocorrer quando a
questão dos gastos do governo estiver mais clara.
Mas como enfrentar essa euforia de gastos quando sabemos
que o governo perdeu o controle
da situação política no Congresso
e já entrou em campanha eleitoral para a reeleição de Lula? Basta ter ouvido o porta-voz da Presidência da República, após a última reunião ministerial, quando
fez um balanço dos principais
projetos do presidente para o restante de 2005, para encontrar
uma resposta muito clara a essa
pergunta.
A economia brasileira estará
dependente do que vai acontecer
com a inflação nos Estados Unidos durante os próximos meses.
Se a inflação se mantiver sob controle, poderemos ter uma nova
acomodação nos mercados financeiros e a volta do otimismo com
o Brasil. Mas, se o pior vier a
acontecer, e o Fed vier a aumentar com mais intensidade os juros, preparem-se, meus leitores,
para dias complicados.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 62,
engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
Texto Anterior: "Maior desafio é acabar com as filas", diz Jucá Próximo Texto: Tendências internacionais - Aviação: Embraer fecha venda de cinco jatos na China Índice
|