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São Paulo, quinta-feira, 25 de setembro de 2003

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OPINIÃO ECONÔMICA

Novo acordo com o FMI?

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

Discute-se neste momento se o Brasil deve ou não negociar um novo acordo com o FMI para 2004. É uma discussão melancólica. Afinal, o Brasil assinou nada menos que três acordos com o Fundo desde fins de 1998. Esse seria o quarto empréstimo num período de apenas cinco anos!
Os defensores de mais um acordo argumentam que o aporte de dinheiro ajudaria a financiar as contas externas em 2004 e que a renovação do aval do FMI fortaleceria a credibilidade da política econômica.
Esses argumentos não são, contudo, inteiramente convincentes. Houve notável melhora do balanço de pagamentos do Brasil desde meados de 2002. O superávit comercial, acumulado em 12 meses, é superior a US$ 20 bilhões. A conta corrente chega a apresentar um pequeno superávit.
Quanto à questão da credibilidade, a negociação de um quarto acordo seria um sinal ambíguo. Indicaria uma certa "Fund-dependence" do Brasil e poderia ser tomada como indício de fraqueza.
De qualquer maneira, não se pode esquecer que o aval do FMI nunca sai de graça. As recomendações da tecnocracia do Fundo nem sempre são as melhores (para dizer o mínimo). O FMI tem, por exemplo, uma inclinação por políticas monetárias e fiscais pró-cíclicas, isto é, costuma insistir em taxas de juro e superávits primários elevados mesmo para economias estagnadas ou em recessão.
É o que estamos vendo no Brasil em 2003. Submetida a políticas fiscais e monetárias severamente restritivas, a economia brasileira entrou em recessão. A queda da atividade e do emprego contribuiu para reduzir a arrecadação tributária. A diminuição da arrecadação, por sua vez, colocou em risco as ambiciosas metas de superávit primário e levou o governo a promover novos cortes de gastos, reforçando a pressão recessiva e prejudicando ainda mais as condições de funcionamento de diversos setores da máquina pública.
Além disso, essas negociações têm, às vezes, aspectos não-escritos ou não-revelados. O FMI é, ao mesmo tempo, um órgão técnico e político, controlado por um pequeno grupo de países desenvolvidos, com influência preponderante dos EUA. A experiência recente mostra que os EUA e outros países desenvolvidos não se constrangem em usar os programas do FMI para impor os seus interesses a países devedores vulneráveis.
Ora, o Brasil tem um contencioso apreciável com os EUA em negociações comerciais de importância estratégica (OMC e, sobretudo, Alca). Podemos descartar o risco de que Washington tente, em determinado momento, estabelecer uma vinculação entre as negociações financeiras e comerciais?
O melhor, assim, é não depender de favores em Washington.
Não é tão difícil tornar-se independente desses favores. O Brasil precisaria atuar de forma sistemática para consolidar o superávit comercial e o ajustamento do balanço de pagamentos em conta corrente, mantendo uma taxa de câmbio competitiva e acionando instrumentos extra-cambiais de estímulo às exportações e à substituição de importações. Precisaria, também, disciplinar os movimentos de entrada e saída de capitais na economia e aproveitar todas as oportunidades para reforçar as reservas internacionais.
São condições indispensáveis para que o Brasil possa crescer com segurança, gerar empregos e sustentar uma política externa independente.


Paulo Nogueira Batista Jr., 48, economista, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).

E-mail - pnbjr@attglobal.net


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