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Diretor do Senac diz que cursos custam de acordo com qualidade
DA REPORTAGEM LOCAL
Para Luiz Francisco de Assis
Salgado, diretor regional do
Sesc (Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial) em
São Paulo, o Senac não tem
mais alunos egressos do sistema público porque, com a educação deficiente, eles não conseguem acompanhar os cursos
profissionalizantes. Segundo
ele, os cursos são caros porque
têm alta qualidade.
FOLHA - O Sistema S é pouco transparente na destinação dos recursos,
como alega o governo?
SALGADO - Se o próprio ministro designa um representante
do Ministério da Educação para participar do conselho do Senac, se o Ministério do Trabalho também participa desse
conselho, se tem representante
do Instituto Nacional de Seguridade Social, além do representante dos próprios empresários, como é possível dizer
que não somos transparentes?
Que ele não acredite no Senac,
no Senai, no Sesi, em quem
quer que seja, tudo bem. Só não
concordo quando ele denigre a
imagem da instituição dizendo
que isso aqui é uma caixa-preta,
que não se sabe onde vai o dinheiro. Sabe sim. O próprio governo tem representantes.
FOLHA - O governo diz querer aperfeiçoar o sistema, dizendo que faltam, por exemplo, critérios de seleção dos alunos.
SALGADO - O ministro [da Educação Fernando Haddad] diz
que falta critério para os atendimentos, só que trabalhadores
não são só os operários. Também reclama que não há gratuidade. Só no ano passado, o Senac deu mais de 10 mil bolsas,
de um total de 521 mil atendimentos. Desse total, 50% são
seminários, palestras e campanhas. O governo também diz
que nossos cursos são elitizados. Ele acha que tem de dar
curso para pobre, aquela falácia
dos egressos do ensino público.
O ministro também fala sobre
oferta concentrada de cursos
de curta duração, como se o
curso longo fosse sinônimo de
alta qualidade. A pessoa faz oito
anos de ensino básico e sai da
escola pública sem saber nada.
FOLHA - Os cursos do Senac são
criados a pedido do comércio?
SALGADO - Num documento recente apresentado pelo ministro Haddad, há uma reclamação contra o baixo impacto dos
nossos cursos. De onde ele tirou esse dado? Se a pessoa faz
um curso de inglês, de espanhol
ou de francês, pode modificar
sua vida. Depois, o mercado
muda, é necessário oferecer
cursos de especialização para
os profissionais que já atuam.
Um ministro não pode falar isso. Ele também reclama que o
sistema preserva desigualdades regionais. O que ele quer fazer com isso? Ele acha que no
Maranhão, no Piauí, em Xiririca, não sei aonde, é possível ter
um curso superior de fotografia? Como é que eu posso dar
um curso de engenharia eletrônica numa cidade no interior
do Maranhão, da Bahia? Tem
cidades em São Paulo onde não
se consegue fazer isso. Para resolver esse problema de desigualdades regionais, quem tem
de fazer ação é o governo. Criar
condições de fábrica, indústria,
trabalho, importação e exportação e outras coisas mais. Não
é um curso que preserva desigualdades regionais.
FOLHA - Segundo o ministro, a proposta pretende dar maior controle
ao sistema, entre outras medidas,
por meio de avaliações.
SALGADO - Você acredita na
avaliação periódica do poder
público? Quando o governo
controla alguma coisa nesse
país? Ele não consegue controlar a obrigação dele, que é a universalização da educação. A
proposta de ampliar a oferta de
cursos gratuitos e presenciais é
uma forma de desconhecer a
tecnologia, como se os que não
fossem presenciais não valessem. Ledo engano. Essa proposta, partindo de um ministro
da Educação, é inconcebível.
FOLHA - Outro motivo da proposta
é tentar aumentar o número de alunos egressos de escolas públicas. Por
que isso não acontece hoje?
SALGADO - Esse é o maior problema da educação do país. Temos, por força da legislação,
obrigatoriedade de dar o que
chamam de aprendizagem. Hoje são 5.000 meninos que trabalham meio dia e estudam
meio dia no Senac. Por que só
temos 5.000 se podíamos ter
300 mil? Primeiro porque o patrão, que é um microempresário, não quer pagar o salário do
menino para ele vir estudar no
horário de expediente. Depois
porque não há interesse no estudo. Os meninos de 16, 17 anos
são muito mais preocupados
com outra coisa do que em fazer um curso de aprendizagem.
O terceiro problema é a qualidade do ensino público. O
egresso do ensino público é tão
defasado, que ele não consegue
acompanhar. De cada 20, só um
vai. Isso é como a história em
que o sujeito pega a mulher
com outro homem no sofá e
vende o sofá. O governo está fazendo a mesma coisa. Ele não
quer resolver o problema, ele
quer vender o sofá. Por que, em
vez de melhorar o ensino público, [o governo] começa: "se você é preto, tem tanto de vaga",
"se você saiu do ensino público,
tem mais 15% superior igual
aquele que está lá na USP". Começa com esses remendos todos e vira esse balaio de gatos
que é hoje o sistema educacional do país, uma colcha de retalhos. Quem vem ao Senac hoje,
é quem veio de um colégio e resolveu seguir uma carreira técnica. É para isso que fomos
criados. Não fomos criados para suprir as necessidades governamentais, mas sim para
dar o embasamento técnico.
FOLHA - Os cursos do Senac são
considerados caros mesmo para a
classe média.
SALGADO - Caros em relação a
quê? Me perdoe a Uninove, que
vende um curso por R$ 239, e o
aluno ganha uma geladeira ou
outro curso. É isso que se quer?
É essa qualidade de educação
que se quer? Ou como fazemos,
que são caros pela qualidade? O
governo tem mania de dizer
que educação é sacerdócio. Não
é. É um negócio, tem de pagar
bons salários e atualizar profissionais e laboratórios. Senão fica essa coisa de governo que
monta, inaugura, corta fita, vai
embora e não volta.
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