São Paulo, sábado, 26 de abril de 2008

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Diretor do Senac diz que cursos custam de acordo com qualidade

DA REPORTAGEM LOCAL

Para Luiz Francisco de Assis Salgado, diretor regional do Sesc (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial) em São Paulo, o Senac não tem mais alunos egressos do sistema público porque, com a educação deficiente, eles não conseguem acompanhar os cursos profissionalizantes. Segundo ele, os cursos são caros porque têm alta qualidade.

 

FOLHA - O Sistema S é pouco transparente na destinação dos recursos, como alega o governo?
SALGADO
- Se o próprio ministro designa um representante do Ministério da Educação para participar do conselho do Senac, se o Ministério do Trabalho também participa desse conselho, se tem representante do Instituto Nacional de Seguridade Social, além do representante dos próprios empresários, como é possível dizer que não somos transparentes? Que ele não acredite no Senac, no Senai, no Sesi, em quem quer que seja, tudo bem. Só não concordo quando ele denigre a imagem da instituição dizendo que isso aqui é uma caixa-preta, que não se sabe onde vai o dinheiro. Sabe sim. O próprio governo tem representantes.

FOLHA - O governo diz querer aperfeiçoar o sistema, dizendo que faltam, por exemplo, critérios de seleção dos alunos.
SALGADO
- O ministro [da Educação Fernando Haddad] diz que falta critério para os atendimentos, só que trabalhadores não são só os operários. Também reclama que não há gratuidade. Só no ano passado, o Senac deu mais de 10 mil bolsas, de um total de 521 mil atendimentos. Desse total, 50% são seminários, palestras e campanhas. O governo também diz que nossos cursos são elitizados. Ele acha que tem de dar curso para pobre, aquela falácia dos egressos do ensino público. O ministro também fala sobre oferta concentrada de cursos de curta duração, como se o curso longo fosse sinônimo de alta qualidade. A pessoa faz oito anos de ensino básico e sai da escola pública sem saber nada.

FOLHA - Os cursos do Senac são criados a pedido do comércio?
SALGADO
- Num documento recente apresentado pelo ministro Haddad, há uma reclamação contra o baixo impacto dos nossos cursos. De onde ele tirou esse dado? Se a pessoa faz um curso de inglês, de espanhol ou de francês, pode modificar sua vida. Depois, o mercado muda, é necessário oferecer cursos de especialização para os profissionais que já atuam. Um ministro não pode falar isso. Ele também reclama que o sistema preserva desigualdades regionais. O que ele quer fazer com isso? Ele acha que no Maranhão, no Piauí, em Xiririca, não sei aonde, é possível ter um curso superior de fotografia? Como é que eu posso dar um curso de engenharia eletrônica numa cidade no interior do Maranhão, da Bahia? Tem cidades em São Paulo onde não se consegue fazer isso. Para resolver esse problema de desigualdades regionais, quem tem de fazer ação é o governo. Criar condições de fábrica, indústria, trabalho, importação e exportação e outras coisas mais. Não é um curso que preserva desigualdades regionais.

FOLHA - Segundo o ministro, a proposta pretende dar maior controle ao sistema, entre outras medidas, por meio de avaliações.
SALGADO
- Você acredita na avaliação periódica do poder público? Quando o governo controla alguma coisa nesse país? Ele não consegue controlar a obrigação dele, que é a universalização da educação. A proposta de ampliar a oferta de cursos gratuitos e presenciais é uma forma de desconhecer a tecnologia, como se os que não fossem presenciais não valessem. Ledo engano. Essa proposta, partindo de um ministro da Educação, é inconcebível.

FOLHA - Outro motivo da proposta é tentar aumentar o número de alunos egressos de escolas públicas. Por que isso não acontece hoje?
SALGADO
- Esse é o maior problema da educação do país. Temos, por força da legislação, obrigatoriedade de dar o que chamam de aprendizagem. Hoje são 5.000 meninos que trabalham meio dia e estudam meio dia no Senac. Por que só temos 5.000 se podíamos ter 300 mil? Primeiro porque o patrão, que é um microempresário, não quer pagar o salário do menino para ele vir estudar no horário de expediente. Depois porque não há interesse no estudo. Os meninos de 16, 17 anos são muito mais preocupados com outra coisa do que em fazer um curso de aprendizagem. O terceiro problema é a qualidade do ensino público. O egresso do ensino público é tão defasado, que ele não consegue acompanhar. De cada 20, só um vai. Isso é como a história em que o sujeito pega a mulher com outro homem no sofá e vende o sofá. O governo está fazendo a mesma coisa. Ele não quer resolver o problema, ele quer vender o sofá. Por que, em vez de melhorar o ensino público, [o governo] começa: "se você é preto, tem tanto de vaga", "se você saiu do ensino público, tem mais 15% superior igual aquele que está lá na USP". Começa com esses remendos todos e vira esse balaio de gatos que é hoje o sistema educacional do país, uma colcha de retalhos. Quem vem ao Senac hoje, é quem veio de um colégio e resolveu seguir uma carreira técnica. É para isso que fomos criados. Não fomos criados para suprir as necessidades governamentais, mas sim para dar o embasamento técnico.

FOLHA - Os cursos do Senac são considerados caros mesmo para a classe média.
SALGADO
- Caros em relação a quê? Me perdoe a Uninove, que vende um curso por R$ 239, e o aluno ganha uma geladeira ou outro curso. É isso que se quer? É essa qualidade de educação que se quer? Ou como fazemos, que são caros pela qualidade? O governo tem mania de dizer que educação é sacerdócio. Não é. É um negócio, tem de pagar bons salários e atualizar profissionais e laboratórios. Senão fica essa coisa de governo que monta, inaugura, corta fita, vai embora e não volta.


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