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OPINIÃO ECONÔMICA
A escalada do dólar
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
A tecnocracia "globalizada" que comanda a Fazenda
e o Banco Central vive no mundo da lua. A escalada do dólar em
2002 é, fundamentalmente, o resultado prático de realidades que
ela tanto relutou em aceitar.
País em desenvolvimento, que
apresenta, enquanto tal, problemas e vulnerabilidades estruturais, o Brasil não pode seguir as
regras e os modelos que os países
desenvolvidos concebem (e nem
sempre aplicam) à luz das suas
próprias condições e prioridades.
Não deve, em particular, imaginar que a sua moeda possa flutuar sem controles e precauções
especiais.
A flutuação é, sem dúvida, um
regime mais adequado do que o
sistema de banda cambial que o
Brasil adotou até o início de 1999.
O governo Fernando Henrique
Cardoso demorou quatro anos
para chegar a essa conclusão
mais ou menos óbvia. E só chegou
a ela, recorde-se, depois que a
banda cambial foi destroçada por
um ataque especulativo de rachar
quarteirão.
Desde o início, entretanto, a flutuação padeceu de deficiências
graves, que não chegaram a ser
inteiramente enfrentadas. O déficit do balanço de pagamentos em
conta corrente continuou alto demais, a conta de capitais ficou excessivamente aberta e as reservas
internacionais do país nunca alcançaram níveis satisfatórios. Em
consequência, a taxa de câmbio
apresentou vários períodos de alta volatilidade e o real ficou sujeito a surtos recorrentes de depreciação.
Com o passar dos anos e a repetição das crises, essas deficiências
estão se tornando cada vez mais
evidentes. A mais comentada é o
elevado déficit do balanço de pagamentos em conta corrente. Só
agora, em 2002, é que o Brasil começa, finalmente, a produzir superávits comerciais expressivos e
registrar uma diminuição mais
acentuada do seu desequilíbrio
externo corrente. A julgar pelas
tendências recentes, é perfeitamente possível que o déficit em
conta corrente de 2002 represente
menos da metade do déficit de
US$ 33 bilhões observado em
1998, último ano calendário antes
do início da flutuação.
Essa acentuada redução do desequilíbrio corrente não é, entretanto, suficiente para estabilizar
a taxa de câmbio -como estamos vendo. Por quê? As explicações mais comuns, repetidas "ad
nauseam" nos meios de comunicação, dão ênfase a fatores ligados à conjuntura imediata (escândalos corporativos nos EUA,
aversão generalizada ao risco nos
mercados financeiros internacionais, eleições no Brasil, crise na
Argentina, ameaça de guerra
contra o Iraque etc.).
Todos esses fatores são inegavelmente relevantes. Mas, convenhamos: esta não é a primeira
vez, e nem será a última, em que o
Brasil terá de se defrontar com
choques externos ou turbulências
políticas internas. Para além da
conjuntura atual, a questão fundamental é a seguinte: por que a
economia brasileira revela, há
tantos anos, uma extraordinária
suscetibilidade a choques?
Há vários motivos. Um dos
mais importantes, e ainda insuficientemente reconhecido, é a inexistência de controles adequados
sobre os movimentos de capital
na economia brasileira. Se o Banco Central não se preparar para
reforçar a regulamentação e os
controles nessa área, será muito
difícil, talvez impossível, diminuir
a volatilidade do câmbio e proteger o real contra pressões especulativas.
Naturalmente, propostas desse
tipo provocam grande repulsa
nos meios financeiros domésticos
e estrangeiros. Não é recomendável, afirma-se, interferir com a liberdade dos mercados.
Parece evidente, entretanto, que
a liberdade dos fluxos financeiros
não pode se sobrepor à segurança
da economia no seu conjunto. Se
a economia brasileira continuar
submetida a recorrência de episódios de aguda instabilidade cambial, a retomada do crescimento e
a geração de empregos, prometida por todos os candidatos à Presidência da República, continuará longe do nosso alcance.
Repare, leitor, que diversos países em desenvolvimento têm demonstrado uma capacidade muito maior de resistir às ondas de
instabilidade internacional. Como lembrou o Prêmio Nobel de
Economia Joseph Stiglitz, em seu
livro mais recente, "Globalization
and its Discontents", "não é por
acaso que os dois países em desenvolvimento de grande porte que
foram poupados da destruição
provocada pela crise econômica
global -a Índia e a China- tinham controles de capital".
Por essas e outras razões é que
eu venho repetindo há tantos
anos e volto a repetir agora, pensando, é claro, no próximo governo: Pelo amor de Deus e pela Santíssima Trindade, CONTROLEM
OS MOVIMENTOS DE CAPITAL!
Paulo Nogueira Batista Jr., 47, economista, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP e professor da FGV-SP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A Economia como Ela é..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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