São Paulo, sábado, 26 de setembro de 2009

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ROBERTO RODRIGUES

Novo velho


O trabalho do IAC corre o risco de ser interrompido caso permaneçam as condições de remuneração dos cientistas


OS GRANDES saltos de competitividade alcançados pela agropecuária brasileira se devem essencialmente aos avanços tecnológicos, seja com novas variedades cultivadas ou práticas de cultivo, seja com o uso racional de insumos, novos equipamentos etc., e é reconhecido o extraordinário papel da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) no processo de geração de conhecimento para o campo. Criada em 1973, ela é hoje referência mundial em excelência tecnológica.
No entanto, muito antes dela, instituições hoje centenárias deram início à moderna agricultura brasileira extensiva substituindo o velho modelo extrativista ou de subsistência pela nossa atual competência alicerçada em conhecimentos científicos. É histórico o papel desempenhado pela Esalq/USP e pelo IAC, fundado em 1887, entre outras importantes instituições paulistas de ensino, pesquisa e extensão rural.
O legado do Instituto Agronômico de Campinas é extenso: o estabelecimento da cultura diversificada em contraposição à monocultura do café; a importância do conhecimento do ambiente agrícola (solo, clima, recursos hídricos); a adubação em bases científicas; o melhoramento genético de culturas de interesse econômico e a expansão do cultivo de espécies de clima temperado no ambiente tropical são exemplos notáveis.
Hoje, o IAC trabalha no melhoramento genético de espécies de interesse energético, como cana-de- -açúcar, mandioca, mamona, amendoim, girassol, pinhão-manso, soja; e de espécies de interesse alimentício, como arroz, feijão, trigo, mandioca, batata e frutas cítricas. Esse melhoramento genético é um trabalho de longo prazo e de extrema precisão e envolve a resistência às doenças existentes no Brasil, estresses do ambiente, limitações de fertilidade do solo etc. Isso tudo é auxiliado pelo estudo do ambiente agrícola, como dados meteorológicos, recursos hídricos disponíveis, a aplicação das ferramentas de biologia molecular para o conhecimento das características genéticas, seja das plantas, seja dos organismos causadores de doenças.
Há esforços na calibração do uso de macro e micronutrientes, permitindo maior economia, menor desperdício de insumos e menor agressão ao ambiente. A Secretaria da Agricultura e o governo do Estado de São Paulo reconhecem a excelência do trabalho desenvolvido no IAC e estão aportando recursos crescentes na infraestrutura para pesquisa. Agências de fomento, como o CNPq e a Fapesp, fazem o mesmo.
Todo esse trabalho corre o risco de ser interrompido caso permaneçam as condições atuais de remuneração dos cientistas. Dos 196 pesquisadores do IAC, 190 têm pós-graduação, mas em três anos cerca de 40% deles terão tempo para aposentadoria, o que já é um problema para a continuidade dos trabalhos. Pior: o salário inicial de um pesquisador do IAC é de R$ 2.700,00, enquanto na Embrapa chega a R$ 6.900,00. Viva a Embrapa, que fará um concurso no final deste ano para contratar cerca de 700 pesquisadores.
Seria natural que os excelentes técnicos do IAC mudassem de time, rompendo a bela história que nos lançou no cenário agrícola global. Temos um extraordinário secretário da Agricultura em São Paulo, jovem, entusiasmado, lutador, que se preocupa com esse cenário. É preciso dar a ele todo o apoio para fortalecer o IAC e os outros órgãos de pesquisa e extensão do Estado, base do nosso progresso.

ROBERTO RODRIGUES, 67, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura (governo Lula). Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.

rr.ceres@uol.com.br


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