São Paulo, quinta-feira, 26 de dezembro de 2002

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OPINIÃO ECONÔMICA

Integração: saber e fazer

LUIZ GONZAGA BERTELLI

A empresa é a unidade da produção de bens e serviços. Por outro lado a universidade é a unidade da produção do capital humano e, como tal, exerce um papel extremamente relevante no processo do desenvolvimento sustentável de um país.
Como diria o professor Jerome Wiesmer: "Um bom sistema educacional pode ser a flor do progresso das nações, mas é, também e principalmente, sua semente".
Até recentemente, a universidade brasileira e as nossas organizações empresariais seguiam rotas paralelas, sem o esforço maior de sinergismo. Atualmente, graças aos programas do Centro de Integração Empresa-Escola (Ciee), das iniciativas das escolas superiores e de outras instituições, milhares de empresas, em todo o país, estão abrindo suas portas visando a uma conjugação de esforços com os educadores, na interação da juventude estudantil no mercado de trabalho e na sociedade brasileira.
Dessa forma, a indústria, o comércio, a agroindústria, os bancos e outras atividades exercidas pela iniciativa privada ou pública passam a emprestar realismo à universidade, inserindo-a no contexto social, para usarmos a feliz expressão do ex-ministro Roberto Campos (1917-2001), em vez da universidade "torre de marfim".
No plano prático, a integração do mundo do saber (as universidades) com o universo do fazer (as empresas) ocorre por intermédio do estágio e do treinamento dos estudantes do ensino médio e superior nos mencionados estabelecimentos e na atividade pública. Constituem praxes, que permitem o estabelecimento de um efetivo elo entre o ensino teórico e o prático, complementando-se, operacionalmente, assim, a formação e a experiência profissional do estudante.
Desde a sua fundação, há quase quatro décadas, o Ciee já concedeu mais de 3 milhões de estágios, com o pagamento de bolsas-auxílio aos estudantes de ensino médio e superior, por intermédio de suas 200 unidades espalhadas pelo país.
É inquestionável, em decorrência, o entendimento que o esforço de integração da escola com a empresa situa-se na raiz do processo do desenvolvimento sustentável nacional, a partir da premissa maior de que o desenvolvimento dos povos não acontece como um acidente, fortuitamente ou como subproduto dos recursos naturais.
Felizmente, o ensino superior brasileiro experimenta um período de expansão acelerado, com aumento de 43% no número de matrículas entre 1994 e 2000. Caso mantenha essa expressiva taxa de crescimento, haverá mais de 3 milhões de alunos matriculados nos cursos superiores. Contudo, nos dias atuais, apenas 17% dos brasileiros, de 18 a 24 anos, encontram-se nas escolas superiores.
Esse índice é um dos menores da América Latina. Na Argentina, 42% das pessoas nessa faixa etária são universitários. No Chile, 31% e na Bolívia, 24%.
No final de 2002, as instituições superiores particulares respondem por mais de 70% do total das matrículas contra 30% das universidades públicas, que deixaram de crescer nos últimos anos. A grande maioria dos universitários brasileiros é de família de renda e grau de instrução modestos.
A elitização do ensino brasileiro aparece nas instituições mais procuradas. Públicas em sua maioria, elas têm a maior parte das suas vagas preenchidas por candidatos oriundos das melhores escolas do ensino médio particulares, acessíveis apenas a uma minoria.
Por outro lado os jovens estudantes de renda mais baixa, que cursaram gratuitamente escolas governamentais, acabam ingressando nas faculdades pagas e particulares e, na sua média, com o ensino de qualidade inferior. No último vestibular da Fuvest, três em cada quatro calouros (76%) concluíram o ensino médio em escolas particulares.
O fortalecimento do sistema de ensino, em todos os níveis, é condição sine qua non para que possamos pensar num desenvolvimento auto-sustentado, concedendo ao Brasil efetivas condições para apresentar produtos atraentes e de melhor qualidade no disputado, competitivo e cada vez mais exigente mercado internacional.
Precisamos, ainda, melhorar a condição salarial dos nossos professores, pois em uma amostragem de 38 países, Peru e Indonésia são os que ainda pagam salários mais baixos do que os do Brasil. Nessas nações, os salários anuais médios são, respectivamente, de US$ 4.752 e de US$ 1.624 e, entre nós, o valor chega a US$ 4.818, conforme a matéria publicada na revista "Educação" de novembro deste ano.


Luiz Gonzaga Bertelli, jornalista e advogado, é diretor da Federação e do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp) e da Associação Comercial de São Paulo e presidente-executivo do Ciee (Centro de Integração Empresa-Escola).


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