São Paulo, Quinta-feira, 27 de Janeiro de 2000


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LUÍS NASSIF
Os meandros da reforma tributária

A novela da reforma tributária pode ser entendida a partir da identificação dos três principais personagens: a Comissão de Tributação, os Estados e a União. No início, o governo federal pouco se envolveu com a reforma. A comissão decidiu, então, criar o fato sem retorno, aprovando o relatório Mussa Demes. O governo federal reagiu de maneira virulenta. Pacificados os ânimos, passou-se ao período de negociação, procurando identificar os principais fatores de conflito entre as três partes e buscando soluções para cada um.
Um dos fatores de conflito foi a questão do fim do imposto interestadual -o imposto que é pago ao Estado que produz a mercadoria, quando vendida para outro Estado. É medida que prejudicará todos os Estados exportadores líquidos internos. Só o Estado de São Paulo perderá cerca de R$ 4,3 bilhões com o fim das operações interestaduais. Mas aceitou o acordo, por ser o preço do fim da guerra fiscal.
A guerra fiscal dá-se basicamente em cima dessa alíquota interestadual. O processo funciona mais ou menos assim: 1) a Bahia concede isenção de ICMS para a Ford; 2) a Ford produz um carro a um preço de 100; 3) o carro é vendido para São Paulo (ao atravessar a divisa, passa a custar 112,12 devidos à Bahia); 4) quando chega a São Paulo, o revendedor fixa o preço em 116, paga 16 de ICMS para o Estado, mas se credita dos 12 que foram pagos à Bahia; 5) a Bahia devolve os 12 que recebeu para a Ford. Assim, a operação é financeiramente neutra para a Bahia.
Com o novo sistema do IVA (Imposto sobre Valor Agregado) -de pagamento do imposto no destino-, a Bahia deixa de receber os 12, ficando sem ter como ressarcir a Ford. A saída encontrada será congelar os benefícios concedidos até dezembro passado. A distribuição do IVA será feita automaticamente pelos bancos, de acordo com uma matriz que não leve em conta as isenções fiscais. Assim, o custo do incentivo seria bancado pelo conjunto dos Estados. No fundo, seria o preço pelo fim da guerra fiscal.
Para os Estados perdedores, definiram-se três formas de compensação. A primeira, de a extinção da alíquota interestadual ser de forma gradativa. Depois de carência de dois anos, se reduzirá a alíquota interestadual em 25% ao ano. A segunda compensação é a possibilidade de introdução do setor de serviços na tributação estadual. Com isso, só no caso paulista a perda cairia para R$ 2,4 bilhões, mas que não apareceria de uma só vez, devido ao período de transição. A terceira compensação é a devolução aos Estados da capacidade de fazer política tributária.
No relatório Mussa Demes, há uma alíquota padrão de 15% para o IVA e uma banda de mais 40% e menos 40%, correspondendo à alíquota reduzida e à ampliada de uma cesta de produtos. Os Estados propuseram uma banda adicional de 20% para fazer política tributária. Ou seja, cada Estado poderia aumentar em até 20% a alíquota média de cada um dos itens, para compensar eventuais perdas com a reforma.
Entre Estados e União, houve um impasse. O governo federal concordou em acabar com o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), mas queria taxar produtos seletivos -telecomunicações, energia e petróleo. Os Estados discordaram, por representar mais de um terço de sua arrecadação. Entre Estados e governo federal, o acordo foi em torno de um IVA para Estados e outro IVA para a União.
Persistiu o problema entre a comissão e o governo federal em torno da manutenção de impostos em cascata, como a Cofins, que respondem por R$ 60 bilhões de arrecadação.
O governo federal queria que incidisse sobre faturamento total. A comissão reagiu. Uma primeira alternativa era a fórmula imposto contra imposto, retirando da base tributável os impostos que foram pagos ao longo da cadeia. Outra fórmula é a chamada base contra base, retirando do faturamento os custos de produção. Anteontem, o ministro Pedro Malan, da Fazenda, informou ter encontrado uma solução técnica.
A comissão julga que houve avanços, mas ainda não se chegou à solução final.

E-mail: lnassif@uol.com.br


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