São Paulo, domingo, 27 de abril de 2008

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Concessionárias limitam área de venda

Com mercado aquecido, lojas estão restringindo comercialização de carros a consumidores de sua região, diz Ministério Público

Ao menos dez marcas estariam direcionando a venda, apuram promotores; para Fenabrave, não existe limitação de concorrência

FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI

DA REPORTAGEM LOCAL

Com o aquecimento do mercado automobilístico, a disputa pela compra de um carro aumentou, e as concessionárias estão dando preferência a consumidores que residem em suas áreas de atuação.
Reclamações de consumidores deram origem a investigações do Ministério Público Federal em Joinville (SC) e em Novo Hamburgo (RS). A suspeita é que essa prática estaria ocorrendo em todo o país.
Ao menos dez marcas estariam limitando a venda de carros a consumidores próximos de suas áreas de atuação, segundo informam procuradores dos dois ministérios públicos.
Neste mês, o MPF em Joinville ouviu representantes de concessionárias de várias marcas, como BMW, Citroën, Fiat, Ford, GM, Honda, Hyundai, Mitsubishi, Peugeot, Renault e Volks. Deve agora convocar as montadoras para verificar se existe e por que existe limitação de mercado, se o consumidor está sendo lesado e se há prejuízo às concessionárias.
"De 11 concessionárias ouvidas em Joinville, 7 informaram que trabalham com reserva de mercado. Se ficar comprovado que essa prática realmente ocorre, vou estudar as suas razões. Se não concordar com elas, vou propor uma ação civil pública questionando essa prática. O consumidor tem o direito de comprar onde quiser e sem precisar pagar mais por isso", afirma Mário Sérgio Ghannagé Barbosa, procurador da República em Joinville.
Na investigação, iniciada em janeiro, o procurador constatou que concessionárias de Joinville que vendem a consumidores fora de sua área de atuação podem ser punidas pelas montadoras e pelas associações de concessionárias.
"Vamos estudar se essa prática é legal ou não. Em alguns casos, a sanção é tão alta que inviabiliza a venda a consumidores de outras regiões", diz.
A Folha apurou que, entre essas punições, estão multas de até 12% do preço do veículo. A reportagem visitou concessionárias de São Paulo e telefonou para revendas em várias regiões do país e constatou que há reserva de mercado.
Uma revenda da Mitsubishi do interior paulista orientou, por telefone, um cliente residente em São Paulo a procurar uma das revendas da marca na capital paulista. Uma loja da Peugeot em São Paulo informou à Folha que, se vender para consumidores fora de sua área, tem de pagar R$ 2.000 por veículo à montadora.
A nova edição da Lei Ferrari (lei nº 6.729, de 1979) -que dispõe sobre a relação entre as montadoras e as concessionárias e foi alterada pela lei nº 8.132/90- cita em seu artigo 5º a liberdade que o consumidor tem para escolher onde quer adquirir seu veículo.
Marcos Diegues, do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), diz que o cliente não pode ser punido com repasse no preço.
Em Novo Hamburgo, a investigação sobre reserva de mercado é conduzida pelo procurador da República Júlio Carlos Schwonke de Castro Júnior. "Recebemos denúncia de consumidores residentes em Novo Hamburgo (RS) e Erexim (RS) que não teriam conseguido comprar carros em Porto Alegre (RS). Essa prática limita a concorrência e, portanto, prejudica o consumidor."
Sérgio Reze, presidente da Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores), diz que não existe limitação de mercado: "o cliente pode comprar onde quiser". Afirma que, "no caso de clientes especiais, como taxistas, as concessionárias oferecem descontos maiores para os que estão em sua área de atuação, como dispõem regras estabelecidas pelo governo".
Maria Inês Dolci, coordenadora da Pro Teste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor), diz que a investigação é "importante" e "oportuna". "Não pode haver tratamento desigual para consumidores."
André Beer, consultor para a indústria automobilística, diz que a Lei Ferrari disciplina a relação entre montadora e concessionária. "Nenhuma concessionária do interior de São Paulo, por exemplo, quer que o cliente da sua região vá para São Paulo comprar um carro e depois só use a sua revenda para manutenção. Então, disciplinar o mercado está correto. Mas nada impede que um consumidor compre fora."


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