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DIAS DE TENSÃO
Economista diz que país já esteve várias vezes "à beira do precipício" e que precisa de mais investimentos
Brasil corre "muito risco", afirma Krugman
DARCY A. CROWE
FERNANDO GUALDONI
DO "EL PAÍS"
Paul Krugman, 51, talvez seja o
economista mais influente de sua
geração. Crítico tenaz das medidas econômicas do governo Bush,
nem Alan Greenspan, presidente
do Federal Reserve (BC americano), escapou de suas observações
sagazes, que em muitos casos vão
na contracorrente nos EUA.
O economista diz acreditar que
o Brasil corra "muito risco". Para
ele, o país esteve várias vezes à beira do precipício e agora precisa de
mais investimentos.
Uma de suas novas preocupações é o ritmo das economias européias. Em sua última visita a
Madri, Krugman participou da
Expomanagement, onde, diante
de cerca de 1.500 executivos, apresentou algumas de suas idéias sobre o futuro da economia internacional. Leia trechos da entrevista.
Pergunta - Greenspan foi nomeado para um quinto mandato na direção do Fed. Ele ainda é o homem
ideal para o cargo?
Paul Krugman - Não. Ele já ficou
tempo demais à frente do Fed.
Deveria ter deixado o cargo havia
alguns anos. Se o tivesse feito, sua
reputação hoje estaria nas nuvens. A realidade, porém, é que
Greenspan cometeu erros gravíssimos no comando da política
monetária dos EUA. No final dos
anos 90, quando as Bolsas estavam claramente supervalorizadas
e vivíamos em uma bolha, ele
atuou como instigador da chamada "exuberância irracional" dos
mercados.
Pergunta - Nos últimos anos, como o senhor qualifica o trabalho
dele?
Krugman - Suas medidas foram
lógicas, rápidas e agressivas. Desde 2001, Greenspan cometeu poucos erros em relação à política
monetária, mas seus comentários
sobre o corte de impostos do governo Bush e a política fiscal da
administração foram equivocados e quase desonestos. Ele usou
seu nome e seu prestígio para defender um corte impositivo, partidarista e muito prejudicial para o
futuro dos EUA, já que põe em jogo as aposentadorias e os serviços
sociais para toda uma geração.
Pergunta - Mas a economia americana parece se recuperar.
Krugman - Sim, mas é uma recuperação muito frágil, à custa de
um gigantesco estímulo fiscal. Eu
não tenho nada contra cortar impostos ou suportar um déficit fiscal para impulsionar uma recuperação econômica. O problema da
política fiscal de Bush é que ele
quer tornar permanentes essas reduções fiscais, algo muito perigoso. Além disso, os beneficiários
são os grupos sociais que menos
necessitam.
Quanto à recuperação, só desfrutamos de um trimestre de crescimento espetacular. Os outros
dados foram bem mais modestos.
Poderia ter sido feito muito mais
para que a economia americana
arrancasse sem tanto custo. O
mais preocupante é que, se os cortes fiscais de Bush se tornarem
permanentes, o resultado será catastrófico para nosso sistema de
aposentadorias.
Pergunta - Parece que o Fed está
prestes a aumentar as taxas de juros. É o momento certo?
Krugman - Temo que não. Aumentar os juros neste momento é
um erro. Para começar, o raciocínio de que a inflação está aumentando e, portanto, é preciso controlá-la aumentando os juros não
me convence, já que a pressão inflacionária é muito pequena e se
deve quase totalmente à alta do
preço do petróleo. Além disso,
nos últimos meses o índice de desemprego ainda é preocupante. É
verdade que estão sendo criados
mais empregos nos Estados Unidos, mas essa cifra é pouco maior
que o crescimento da população.
O verdadeiro objetivo de uma alta
dos juros agora é dar um sinal às
Bolsas para que voltem a subir. O
risco, porém, é que uma alta de juros possa solapar a incipiente recuperação econômica.
Pergunta - A situação das economias européias é diferente da dos
EUA?
Krugman - A Europa tem outros
problemas. Os países da União
Européia não se comportaram
tão bem como deveriam em termos econômicos nos últimos
anos, especialmente se comparados aos EUA. É um quebra-cabeça que muitos economistas analisamos, e creio que conseguimos
entender algumas peças. Uma delas é o mercado de trabalho, que
constitui um dos principais fracassos das economias européias.
Outro defeito da Europa é que
não foi capaz de desfrutar do tremendo aumento dos níveis de
produtividade que se verificou
nos EUA. Do meu ponto de vista,
já sabemos o que é preciso fazer
para reduzir os índices de desemprego até 5% ou 6%. Mas não sabemos o que se deve fazer para
melhorar a produtividade.
Pergunta - Qual é a receita para
reduzir o desemprego?
Krugman - Nisso meus pontos
de vista parecem os de um americano teimoso de direita. A Europa
oferece auxílios-desemprego demais, muito altos, há muito pouca
flexibilidade no mercado de trabalho e os custos de contratação
para as empresas são elevados.
Um país como a Espanha deveria
reformar seu sistema trabalhista e
copiar um pouco o dos EUA.
Pergunta - As repercussões do déficit fiscal da França e da Alemanha
podem ser as mesmas que nos Estados Unidos?
Krugman - A combinação de
pressão demográfica e fiscal é semelhante. Mas na Europa creio
que politicamente será mais fácil
tomar as medidas necessárias para controlar os gastos ou aumentar os impostos e garantir a manutenção da rede de serviços sociais. Esses serviços sociais são tão
generosos que qualquer tipo de
corte pode ter um grande impacto
nas contas do Estado. Nos EUA, o
corte deverá ser mais drástico, a
menos que os políticos decidam
aumentar os impostos. Além disso, na Europa o ambiente político
não é tão polarizado, o que permite uma margem maior para atuar
e tomar as medidas necessárias.
Pergunta - Mas assumir um déficit fiscal para impulsionar a economia não é um erro desses países?
Krugman - Dizer que todo o déficit fiscal se deve ao desejo de impulsionar a economia é incorreto.
O déficit fiscal se deve em parte ao
descontrole dos gastos. Um déficit em curto prazo, porém, é uma
medida perfeitamente válida. Um
déficit fiscal de 4% nos EUA ou na
Europa pode ser justificável.
Pergunta - Sobre América Latina,
o senhor acha que será duradoura
a recuperação que vive a região?
Krugman - Tenho a impressão
de que sim. O caso da Argentina é
esperançoso, sua recuperação foi
muito mais rápida do que imaginávamos e ainda deve fazer muito
para retornar aos níveis de 1998.
Mas creio que o Brasil corra muito risco. Em diversas ocasiões esteve à beira do precipício e agora
precisa de mais investimentos.
Pergunta - E o Japão, também
saiu da recessão em que se encontrava?
Krugman - Parece que finalmente sua economia voltou a decolar.
E, estranhamente, o fez sem aplicar as reformas que eram necessárias, o que demonstra que, se uma
economia agüentar o tempo suficiente, mais cedo ou mais tarde
voltará a crescer.
Tradução de
Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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