São Paulo, terça-feira, 27 de maio de 2008

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Banca privada teme "Petrobras financeira"

Defensores da presença do Estado no setor financeiro falam em competição e política pública, mas analista questiona eficácia

Para Carlos Lessa, ex-presidente do BNDES, o Estado não pode abrir mão de pensar a estratégia de longo prazo no crédito

TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Visto pelos bancos privados como uma tentativa do governo federal de criar uma "Petrobras do sistema financeiro", na definição de um diretor de um grande privado brasileiro, o avanço do Banco do Brasil com a compra da Nossa Caixa reabre a discussão sobre a necessidade de um banco público forte para competir no mercado de crédito brasileiro.
No caso, a comparação com a Petrobras se deve pela exclusividade dos bancos estatais de explorarem os depósitos judiciais -um dinheiro de custo baixo- e o avanço nas contas dos servidores públicos. A Petrobras teve monopólio no setor até 1997 e, segundo os críticos, continuaria até hoje sozinha ou em parceria com empresas privadas na exploração de petróleo.
Entre os argumentos para o Estado manter um banco forte no país, estão desde a necessidade de levar agências às localidades mais distantes e economicamente inviáveis -o que não interessaria aos bancos privados- até a crença de que banco do governo não quebra, como disse em 1861 o então imperador, dom Pedro 2º, ao fundar a Caixa Econômica Federal.
Hoje, o principal argumento dos defensores da presença do Estado no sistema bancário diz respeito à idéia de que as instituições públicas, quando tomam uma decisão de crédito, não olham apenas a lucratividade, mas também seu interesse social. Foi essa a lógica para a criação do BNDES, em 1952.
Também afirmam que geram pressão competitiva e criam concorrência no setor.
Os favoráveis à saída do Estado como competidor no setor financeiro dizem que não é mais verdade que os bancos privados desprezam os pequenos municípios porque, com o avanço da tecnologia, universalizou-se o acesso aos serviços bancários. Um exemplo disso é o banco postal, que em tese chega a todos os endereços.
Também afirmam que não há perspectiva de quebra para os grandes bancos de varejo, que registram lucros recordes.
Estudioso de bancos públicos, o economista Armando Castelar diz que o debate hoje se reduz à necessidade de o governo ter um braço financeiro para fazer política pública e competir com bancos privados.
"Claramente é a posição adotada por esse governo. O problema é que muitas dessas políticas públicas não são tão interessantes assim. Um exemplo são os prejuízos que a Caixa e o próprio BB tiveram. A transparência é reduzida [nos setores que recebem benefício], porque essas operações não passam pela discussão do Orçamento. Sobre a competição, o argumento é que existe rivalidade suficiente no setor", disse Castelar, que acaba de deixar o Ipea e foi trabalhar com Armínio Fraga na Gávea.
Para o ex-presidente do BNDES Carlos Lessa, o Estado brasileiro não pode abrir mão de um banco forte para explorar o crédito, que é "decisivo para a movimentação dos negócios" e para formar o patrimônio das famílias. Lessa afirma que não basta o Estado atuar na regulação para garantir o interesse público.
"A economia de mercado está sempre voltada para o presente, mas a sociedade necessita escolher o futuro que corresponda a suas necessidades e a seus desejos. [Pensar] O futuro escapa do comportamento do setor privado, que está preocupado com a rentabilidade presente e com preservar a sua permanência confortável no mercado que domina. José Serra está certíssimo em transferir a Nossa Caixa para o BB."


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