São Paulo, segunda-feira, 27 de agosto de 2007

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Turbulência testa empresas que estrearam na Bovespa

Apesar da apreensão, diretores dizem que crise é restrita a mercado de capitais

Período de instabilidade foi causado em boa parte pela falta de experiência dos operadores do mercado, afirmam alguns executivos

CRISTIANE BARBIERI
DA REPORTAGEM LOCAL

Da primeira crise, a gente nunca esquece. Pelo menos é o que dizem alguns diretores de RI (relações com investidores) de empresas que abriram capital nos últimos dois anos e, até este mês, só tinham vivido o mercado sob céu de brigadeiro.
De olhos colados no monitor ou simplesmente ignorando a oscilação dos papéis, os comportamentos variaram nos dias em que a Bovespa -e as empresas- perderam mais de R$ 200 bilhões em valor de mercado. O discurso, no entanto, era um só: as companhias foram a mercado para concretizar planos de negócios estruturados, devem crescer na vida real e a crise é restrita ao mercado de capitais.
"O que compete à companhia é entregar o que prometeu", afirma Gustavo Junqueira, diretor financeiro e de RI da construtora Eztec. "Essa era uma crise financeira, mas não dava para ficar completamente alienado ao que acontecia."
Há menos de dois meses na Bolsa, a Eztec captou R$ 540 milhões para incorporar prédios residenciais de classe média na capital paulista e em cidades num raio de até 500 quilômetros de distância. Os controladores, que sempre tiveram em mãos uma empresa familiar, ficaram assustados com a oscilação. Os papéis caíram 2,3% no dia 14 de agosto, mais 4% no dia 15 e despencaram 9% no dia 16.
Junqueira, que já tinha enfrentado crises quando era diretor financeiro da Gradiente, tomou a iniciativa de falar com seus 20 maiores investidores, brasileiros e estrangeiros. Na colocação dos papéis, 70% ficaram com investidores internacionais. "Minha intenção foi mostrar que, se eles estavam procurando um porto seguro, nossa companhia era exatamente esse porto", diz ele.
O resultado talvez não tenha sido direto, mas os papéis da empresa deram um salto de 7,7% na terça-feira, 21, e de 9,9% na última sexta, dia 24. A cotação voltou ao mesmo patamar do dia da oferta pública, apesar de o Ibovespa ter encolhido. "O mercado é soberano, mas o relacionamento direto e transparente sempre ajuda."
Em outras empresas, principalmente as familiares, a primeira crise também deixou marcas. Diretores de RI evidentemente não gostam de parecer inseguros, mas confessam o frio na espinha nos dias mais tensos.
Um deles, que pede para não ser identificado, brincou com o controlador da companhia no dia em que viu a rentabilidade acumulada em oito meses ir embora em horas, dizendo que iria para casa tomar uma vodca e voltava só no dia seguinte. Outro acordou às 3h para acompanhar os mercados asiáticos, que poderiam influenciar o brasileiro naquele dia.
Alguns diretores, no entanto, disseram que nem sequer deram bola para o movimento de sobe-e-desce. "Lá eu tenho tempo para olhar ação despencando 10%, 12% por causa de movimentos exclusivamente financeiros?", pergunta Henrique Bastos, gerente de RI da Dasa. A empresa de medicina diagnóstica anunciou uma aquisição em julho, viu os papéis subirem 10% e caírem pouco mais de 4% durante a crise.
Bastos não foi o único a dizer ter se importado pouco com a crise. "Ficar olhando a tela é perder tempo", afirma José Roberto Pacheco, diretor de controladoria e RI da empresa de planos odontológicos OdontoPrev. "Fui cuidar da vida real."
O solavanco, dizem eles, foi causado em boa parte pela inexperiência dos operadores. "Essa geração é muito preparada, mas não viveu as crises que afetaram o mundo na década de 90", afirma Bastos. "Eles jamais viram o "circuit breaker" [interrupção dos negócios na bolsa, em caso de fortes oscilações] ser acionado. Sem experiência, os movimentos são mais exagerados."

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