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LUÍS NASSIF
A internacionalização da poupança
Há lógica na aparente loucura de propor a livre conversibilidade da poupança doméstica.
Nos últimos meses, os casos
Maluf, Banestado, CVC Opportunity revelaram, claramente, o
processo de transferência de
poupança de grandes investidores brasileiros para o exterior e a
volta na forma de investimento
externo.
Sucessivos planos econômicos,
mais o bloqueio de cruzados e o
fim das contas ao portador, no
governo Collor, provocaram fuga de recursos internos -da
grande poupança legal ao caixa
dois de empresas, de dinheiro de
campanha política ao crime organizado.
Por outro lado, desde os anos
80 o sistema bancário convencional, com seus produtos em
moeda local, deixou de interessar ao capital rentista. Já nos
anos 80 ocorreram as primeiras
tentativas de entrar na jogatina
internacional, no famoso episódio da corretora Tieppo.
No início do Plano Real, havia
a clientela mais rica do país com
recursos lá fora. É a disputa por
esse enorme mercado que explica a lógica do rombo nas contas
correntes e da fixação do câmbio, em 1994. Tratava-se de um
filão inesgotável, já que os grandes bancos, por seu conservadorismo e sua subordinação às
normas do BC, jamais ousariam
competir.
Pequenos bancos, recém-constituídos, com capital ínfimo, subitamente passam a ter acesso a
volumes inacreditáveis de recursos, dezenas de vezes superior a
seu patrimônio. Por mais que
fossem pessoas com trânsito internacional, seria impossível
conseguir acesso àquela montanha de dinheiro, tendo meramente um nome e uma carta patente para oferecer. Só foi possível porque seus clientes eram velhos conhecidos: investidores nacionais com dinheiro lá fora.
Não é coincidência o fato de
praticamente todos os autores
do Plano Real terem se associado, em algum momento, a esses
novos bancos.
Não é coincidência o fato de o
Banco Central ter escancarado o
mercado paralelo de dólares em
1997, permitindo a proliferação
das contas CC5 (depósito em dólares de não-residentes). Tratava-se de ampliar o duto da poupança exportada, para manter a
indústria de reciclagem financeira operando. E não é coincidência o fato de, mal o país consegue equilibrar as contas externas, surgirem os "especialistas"
que defendem a volta dos déficits em conta corrente.
Não tente submeter essa loucura a qualquer teste de lógica
econômica ou de interesse nacional. A lógica é estritamente
negocial.
A meta da conversibilidade é
internacionalizar o grande capital doméstico, tirando-o da jurisdição do Estado nacional. É
por aí que se entende uma cervejaria de 110 anos sendo vendida,
o capital nacional sendo transformado em capital internacional, por mera manobra contábil,
aumentando o passivo externo
brasileiro em quase US$ 5 bilhões, sem que um dólar entrasse. Tudo limpamente, sem doleiro, sem subfaturamento e com
direito a comemoração entusiasmada do presidente do Banco Central como se investimento
fosse.
Eu não sei o que irá acontecer
no dia em que este país tiver governo.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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