São Paulo, quarta-feira, 28 de janeiro de 2004

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PÚBLICO E PRIVADO

Presidente critica empresariado brasileiro em discurso na Índia e diz que é preciso diminuir reclamações

Empresário tem que chorar menos, diz Lula

Jorge Araújo/Folha Imagem
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante discurso em Nova Déli, na Índia, em que criticou os empresários brasileiros


GABRIELA ATHIAS
ENVIADA ESPECIAL A NOVA DÉLI

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou ontem os empresários brasileiros, durante discurso realizado em Nova Déli, na Índia. Na platéia, havia aproximadamente 150 empresários indianos e 30 brasileiros.
Lula disse, dirigindo-se ao empresariado, que "o momento que estamos vivendo não é para nenhum empresário ficar dentro do seu país chorando pelo que não está acontecendo".
Ao final de sua fala -que durou 25 minutos e foi feita de improviso-, lançou um "desafio" (nas palavras dele) aos empresários brasileiros: "Aprendam a vender mais do que a reclamar".
Seu discurso foi pontuado de comparações entre os homens de negócio brasileiros e os indianos. "Quero dizer aos empresários brasileiros que os da Índia são mais ousados do que os nossos. Eles já estão montando um escritório no Brasil para tratar dos seus interesses", afirmou.
Mais adiante, o presidente acrescentou: "Não dá para ficar parado na Índia ou no Brasil cobrando do governo investimentos que as pessoas já sabem de antemão que o governo não tem como fazer".
Alguns empresários brasileiros que assistiram ao discurso acharam injustas as declarações de Lula. "Não entendi a posição do presidente. Ele não foi justo com os esforços de exportação que vêm sendo feitos pelas empresas brasileiras", disse Robson Andrade, vice-presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), que foi à Índia a convite de Lula.
Tentando buscar explicação para as críticas, Andrade disse que "o governo não deve ter gostado da reação dos empresários em relação ao fato de o Banco Central [na semana passada] não ter baixado os juros". Na semana passada, o Copom (Comitê de Política Monetária) decidiu manter a taxa de juros básica da economia (Selic) inalterada, em 16,5% ao ano.
Conforme a Folha publicou no domingo, a decisão do BC foi uma retaliação do governo à pressão dos empresários por reajuste de preços. A decisão contou com o aval de Lula, que, desde o final do ano passado, estava preocupado com pressões por reajustes.

Queda-de-braço
Nas últimas semanas, os empresários brasileiros reclamaram de algumas das medidas do governo.
A primeira grande reclamação ocorreu devido ao aumento da alíquota da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), de 3% para 7,6%, a partir de fevereiro. A indústria diz que a elevação ocasionará aumento de custos, que será repassado para o consumidor. O ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, afirma que o aumento acaba com a cumulatividade da Cofins no processo de produção e atende a antiga reivindicação dos próprios empresários.
Neste mês, uma sondagem feita pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) apontou que 4 em cada 10 empresários planejam reajustar os preços de seus produtos neste trimestre. O setor de siderurgia já negocia aumentos acima de 10%.
Diante desse cenário, o Banco Central decidiu não mexer nas taxas de juros, o que provocou forte reação dos empresários. Eles disseram que a decisão era incompatível com a projeção de crescimento de 3,5% do PIB (Produto Interno Bruto) neste ano, feita pelo governo.
Entre as funções do BC está a de cumprir a meta de inflação, que neste ano é de 5,5%, com um intervalo de 2,5 pontos percentuais para cima ou para baixo. Como os reajustes controlados pelo governo (preços administrados e tarifas públicas) devem responder por dois pontos percentuais dessa inflação, há pouca margem para que os preços livres subam. Ao manter os juros altos, o BC busca inibir a produção e o consumo. Sem compradores para seus produtos, os empresários têm pouco espaço para reajustar preços.

Honestidade
Após o discurso de ontem, em entrevista a jornalistas, Lula afirmou ter sido "honesto" em relação aos empresários, mas não explicitou os motivos de ter feito as críticas. "Eles precisam ter força de vontade e abrir um escritório na Índia. O mundo globalizado não permite que um país fique à espera de oportunidades."
Lula também disse aos estrangeiros que quem fizer contrato com o governo não correrá risco de enfrentar, no meio do caminho, uma mudança nas regras previamente acordadas.

Acordos
O presidente chegou a Nova Déli no domingo para assinar acordos entre o Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai) e a Índia. Hoje, Lula reúne-se novamente com empresários em Mumbai, o centro financeiro da Índia. De lá, segue para Genebra.
No mesmo discurso em que criticou os empresários brasileiros, Lula disse aos indianos que o Brasil é um país seguro para investir. Ele disse que o governo irá financiar obras de infra-estrutura com participação da iniciativa privada.


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