São Paulo, quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

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TURBULÊNCIA GLOBAL

China detona crise nos mercados

  Bolsas caem pelo mundo, e mercados de países emergentes sofrem maiores impactos

  Analistas vêem "ajuste" após ações, títulos e commodities estarem em níveis recordes

Bovespa cai 6,6%, maior queda desde setembro de 2001, e risco-país sobe 12%; em Nova York, índice Dow Jones recua 3,29%


MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Investidores do mundo inteiro venderam ações ontem, em movimento que derrubou todas as grandes Bolsas mundiais. A turbulência global começou na China. A Bolsa de Xangai caiu 8,84%, atingiu os mercados asiáticos, alastrou-se pela Europa e atingiu o mercado americano e os emergentes.
No Brasil, a Bovespa caiu 6,63%, e o risco-país subiu 12%, fechando a 204. Nos EUA, o Dow Jones registrou queda de 3,29%. As quedas nas Bolsas de Brasil e EUA foram as maiores desde os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001.
O movimento de ontem -estimulado por temores de desaceleração nos dois maiores motores da economia global, EUA e China- foi chamado por analistas de "soluço temporário" ou "ajuste de preços". Ele ocorre num momento em que ações, títulos e commodities registram níveis recordes.
As Bolsas asiáticas voltaram a cair no início do pregão hoje, com Tóquio recuando 3,71% (tinha caído só 0,52% ontem) e Xangai recuando mais 1,35%.
O "ajuste" começou no mercado chinês. Nenhum indicador econômico mudou os cenários com que analistas e economistas trabalham para a economia chinesa ou mundial. Foi a possibilidade de Pequim impor restrições às operações no mercado acionário que assustou os investidores. O vice-presidente do Parlamento chinês, Cheng Siwei, já advertira, nos últimos dias, que " há uma bolha" no mercado local.
Ontem, o governo do país anunciou a criação de uma comissão que será responsável por checar a procedência do dinheiro aplicado na Bolsa para detectar fraudes como o uso de informação privilegiada.
O anúncio chamou a atenção de investidores tanto para o risco de os preços estarem muito altos quanto para a possibilidade de intervenção estatal. Resultado: Xangai teve sua maior queda desde 1996.
Para piorar o cenário, nos EUA, logo pela manhã, investidores se depararam com estatística que mostrava que os pedidos de bens duráveis caíram 7,8% em janeiro -o mercado esperava 3%, alimentando a queda nos mercados europeus e, logo depois, em Nova York.
Mas houve notícias positivas também nos EUA, como o aumento na venda de imóveis usados e na confiança de consumidores. Os dados positivos não mudaram o mau humor no mercado, que, um dia antes, já ouvira do todo-poderoso Alan Greenspan, ex-presidente do bc dos EUA, que havia risco de recessão no país.
Prevaleceu, pelo menos ontem, a avaliação de que o cenário para a economia americana pode ser um pouco pior que o esperado. A interpretação mais generalizada é que a turbulência de ontem foi uma correção que pode durar alguns dias, mas que não muda o cenário econômico de crescimento mundial projetado para o ano.
Para Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, alguma correção nos mercados já era esperada. "Não acho que vá ser o fim do mundo, mas não arrisco fazer uma previsão para o curto prazo", disse Armínio (leia entrevista à pág. B2). Já Nuno Câmara, economista do Dresdner Bank em Nova York, vê pouca mudança no cenário mundial e brasileiro, mas, disse, "independentemente dos fundamentos, muitos ativos estão com preços altos".
De fato, 2006 foi o quarto ano seguido de altas na maioria dos mercados acionários mundiais. O último ano de queda mais ou menos generalizada foi 2002. Ações, preços de commodities e outros ativos de risco, como títulos de emergentes, atingiram níveis recordes de preços no ano passado, o que leva muitos economistas a afirmar que os investidores estão subestimando seus riscos.
"O mercado mundial está muito alavancado e com muitos ganhos, é natural que os preços se ajustem", disse Roberto Padovani, do WestLB.
Já analistas estrangeiros ouvidos pelo diário inglês "Financial Times" avaliam que a turbulência de ontem pode afastar estrangeiros dos emergentes. Simon Hayley, do Capital Economics, adverte: "Se os fatos de ontem nos dizem algo, é que o sentimento sobre os emergentes é frágil". Para Mary Ann Bartels, do Merrill Lynch, "os mercados que subiram mais rápido do que outros enfrentarão uma queda mais aguda com fundos "hedge", reduzindo sua exposição a eles".
O mundo parece começar a se adaptar a um novo cenário -2007 deve ser o ano de transição do rápido crescimento recente para uma expansão mais moderada. Transição cheia de incertezas, o que deve, diz Padovani, tornar soluços como o de ontem mais freqüentes.


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