|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Governo admite "fato consumado"
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A medida provisória editada pelo presidente Luiz Inácio Lula da
Silva para evitar que uma parcela
da safra de soja fosse para o lixo,
com reflexos até nas contas externas do país, dificilmente conterá o
cultivo de sementes transgênicas
no país, como sugere uma primeira leitura.
Reservadamente, integrantes
do próprio governo Lula reconhecem como um "um fato consumado" o cultivo e a comercialização de soja transgênica, que representaria algo entre 5% e 30%
da produção nacional do grão.
Os números são estimativas.
Como o plantio está proibido por
uma liminar concedida pela Justiça em 1999 a pedido de duas organizações não-governamentais (o
Idec e o Greenpeace), a expansão
das culturas de soja transgênica
aconteceu, em grande parte, de
forma clandestina.
Só no Rio Grande do Sul os produtores assumiram recentemente
e de forma aberta o cultivo, que
domina a região nos últimos
anos, inclusive entre pequenos
produtores e até em assentamentos do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).
Esse foi, aliás, um dos aspectos
levados em conta na decisão do
governo Lula. Na primeira reunião que cuidou do assunto no
Palácio do Planalto, em 6 de março, a ministra do Meio Ambiente,
Marina Silva, maior opositora dos
transgênicos no governo, chegou
a defender a punição imediata
dos produtores de transgênicos.
"É como dor de dente, tem de sofrer", argumentou. O ministro José Dirceu (Casa Civil) ponderou
em seguida: "Mas é gente nossa".
O não-escoamento da safra -a
primeira em que se admite a presença de transgênicos- quebraria muitos agricultores.
O mapeamento de todas as culturas de soja transgênica no país é
tarefa difícil a esta altura. Mas, segundo depoimentos de produtores de soja e de produtores de sementes convencionais, elas estão
presentes na região Centro-Oeste
e em Estados como Piauí e Bahia.
"O setor de sementes convencionais já está sendo afetado", afirma
o presidente da Abrasen (Associação Brasileira de Sementes),
que trabalha apenas com as sementes convencionais, João Lenine Sousa. No Rio Grande do Sul, a
preferência é por sementes transgência; em outros Estados, a venda de sementes convencionais
não acompanhou a expansão das
lavouras, avalia.
A comercialização das culturas
transgênicas também tem ocorrido sem maiores problemas nos
últimos anos, atesta o presidente
da Abiove (Associação Brasileira
das Indústrias de Óleos Vegetais),
Carlo Lovatelli. "Para todos os
efeitos, a indústria nunca se preocupou. Há uma conivência generalizada, a soja transgênica é um
fato e não dá para parar esse processo", disse.
Na véspera de assinar a medida
provisória, o presidente Lula falou da dificuldade de o governo
agir no caso dos transgênicos. "A
posição mais fácil é proibir a venda, mas falar é fácil, fazer é difícil:
tem muita soja misturada e nós
sabemos o que isso implica. Se
não mudar a lei, vamos fazer
cumprir a lei que existe", afirmou.
Lula reagia a uma intervenção de
opositores da soja transgênica em
reunião a portas fechadas do
Consea (Conselho Nacional de
Segurança Alimentar).
O Congresso já se movimenta
para mudar a legislação. "Paliativos não dão certo, o produtor vai
para o contrabando e planta", diz
o relator de projeto na Comissão
de Agricultura para o qual se busca votação em regime de urgência, deputado Confúcio Moura
(PMDB-RO).
Texto Anterior: Para a CNA, não há como rotular toda a produção Próximo Texto: Frases Índice
|