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OPINIÃO ECONÔMICA
"Gigante pela própria natureza"
BENJAMIN STEINBRUCH
O "financial Times" publicou na semana passada (dia
21, pág.11) uma foto emblemática.
Ao lado de um enorme poço, com
uns dez metros de diâmetro, centenas de pessoas do Estado indiano
de Gujarat tentam "pescar" água
potável com jarros amarrados em
cordas.
A foto ilustrava um texto sobre a
falta de água, que, segundo a análise do jornal britânico, é um dos
problemas que podem segurar o
crescimento econômico da Índia,
da China e da Ásia, em geral, nas
próximas décadas. Volto ao tema
dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e
China) para enfatizar a idéia de
que não faz sentido o Brasil continuar crescendo menos do que os
outros três grandes emergentes da
economia mundial.
China e Índia são os dois países
mais populosos da Terra, ambos
com mais de 1 bilhão de habitantes. Estão predestinados, portanto,
a ser os grandes consumidores do
século 21. Pela escassez de terras
férteis e até pela exaustão de recursos hídricos -a produção de
uma tonelada de grãos exige aproximadamente mil toneladas de
água-, não podem ser pensados
como supridores mundiais de alimentos e de produtos naturais. Essa tarefa caberá certamente ao
Brasil e à Rússia, os dois grandes
emergentes com recursos naturais
abundantes e com grandes áreas
disponíveis para a agricultura e
para a produção de proteína animal.
China e Índia terão de importar
um volume cada vez maior de alimentos por causa desse esgotamento de suas áreas de produção
agrícola. No Brasil, os limites ainda estão muito distantes. Um estudo do Ministério da Agricultura
mostra que existe uma área cultivada de 62 milhões de hectares no
Brasil. Mas estão ocupados com
pastagens outros 200 milhões de
hectares, dos quais 90 milhões são
aptos à agricultura. Ou seja, o país
tem um potencial agrícola enorme, sem que precise avançar sobre
áreas florestais da Amazônia Legal (Estados do Norte mais Maranhão e Mato Grosso). Em menos
de dez anos, segundo o estudo, o
país estará produzindo 170 milhões de toneladas de grãos, quase
30 milhões de toneladas de carnes
de boi e de frango e 24 milhões de
toneladas de açúcar -números
conservadores, em minha opinião.
Há duas semanas, mostrei neste
espaço que o Brasil começa a ficar
para trás em relação aos outros
Brics. De 2000 a 2006, deve crescer
apenas cerca de 15%, bem menos
que os 63% da China, os 43% da
Índia e os 41% da Rússia. Não há
razões objetivas para que essa inferioridade brasileira continue.
Além de possuir recursos naturais
maiores do que os demais grandes
países, o Brasil é competitivo internacionalmente em vários setores,
como mineração, metalurgia, veículos, aviões, madeira, papel e celulose, calçados, têxteis e uma
enorme variedade de produtos
agroindustriais, como açúcar, álcool e os derivados de soja.
O ex-premiê britânico John Major, que esteve no Brasil recentemente, lembrou duas vantagens
brasileiras: as grandes reservas
minerais, principalmente de ferro,
e a auto-suficiência em petróleo,
que está sendo alcançada neste
momento. A questão energética
não é simples para nenhum país.
Mas, certamente, por depender
mais de fontes externas, Índia e
China têm a continuidade do seu
crescimento econômico mais
ameaçada do que o Brasil por essa
variável. "Toda vez que você vê
um chinês no exterior, ele tenta assinar um acordo sobre energia",
disse Major. Na semana passada,
durante a visita de Vladimir Putin
à China, a Rússia se comprometeu
a construir uma rede de gasodutos
para ligar os campos produtores
da Sibéria ao território chinês.
Nas áreas de papel, celulose e
madeira, o Brasil também é considerado o grande fornecedor do futuro, pelo fator clima e pela excelente produtividade das florestas
cultivadas -40 m3 de madeira
por hectare/ano, em comparação
com 25 m3 no Uruguai, 20 m3 na
Indonésia e 15 m3 nos EUA.
Não existe razão, portando, para o cultivo de nenhum complexo
de inferioridade brasileiro em relação aos Brics. Se o Brasil der
prioridade a políticas de crescimento e a planos que resgatem
uma mentalidade desenvolvimentista, terá condição de crescer de
forma tão sustentada quanto China, Índia ou Rússia. Ou mesmo
ganhar essa corrida ao longo das
próximas décadas.
Hoje, o Brasil é a 14ª economia
do mundo, levando em conta o
PIB a preços de mercado. Segundo
um estudo da Confederação Nacional da Indústria, se o país mantiver o atual ritmo de crescimento,
levará cem anos para atingir o nível de renda que a Coréia tem hoje. Sai, urucubaca!
Prefiro apostar em outro estudo,
da PriceWaterHouseCoopers, publicado pela Folha (4 deste mês,
pág. B3), o qual previa que o Brasil
poderá ser a 5ª economia do mundo em 2050, superado apenas por
EUA, China, Índia e Japão. É uma
previsão perfeitamente realizável.
Basta acreditar na evidência de
que o país, em várias áreas, como
diz o hino, é "gigante pela própria
natureza".
Benjamin Steinbruch, 52, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho
de administração da empresa e primeiro
vice-presidente da Fiesp (Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo).
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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