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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Exportação de emergentes causa um círculo vicioso
GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas
O dólar está recuando, a inflação
tem sido surpreendentemente baixa, os juros começaram a cair e o
governo já admite que está entrando no mercado para evitar uma revalorização muito rápida do real.
Uma peça, entretanto, parece não
encaixar nesse roteiro de normalização da situação econômica brasileira: as exportações estão demorando a reagir.
Surge assim uma espécie de arritmia econômica. No curto prazo, as
coisas melhoram. Mas a recuperação da capacidade de crescimento
e financiamento, ou seja, as bases
do longo prazo, está ainda longe de
uma restauração.
Há várias e crescentes dificuldades impedindo uma recuperação
mais rápida das exportações, que
seria o caminho para a geração de
saldos comerciais, vitais para trazer dólares que não dependam de
juros altos e benefícios fiscais.
Em parte, os problemas vêm dos
países desenvolvidos. Os EUA, por
exemplo, estão passando por uma
das mais fortes fases protecionistas de sua história recente. As suas
importações de aço não param de
cair e o Congresso aprovou medidas contra o que os políticos consideram "dumping" dos emergentes.
Mas, em boa medida, os problemas são gerados pela própria crise
nos emergentes. No momento
mesmo em que ocorrem as crises
cambiais que, até certo ponto,
acontecem porque as contas externas estavam desequilibradas, os
mercados reagem antecipando
uma inundação de produtos baratos, postos à venda pelo país em
crise.
No caso de mercadorias agrícolas, o efeito é uma depressão imediata dos preços (afinal, os mercados interpretam que haverá um
excesso de oferta).
Com a queda nos preços, os exportadores dos países emergentes
precisam vender mais quantidades
se quiserem gerar a mesma receita
em dólares.
Resultado: a "profecia" dos mercados se realiza, ou seja, ocorre
mesmo um excesso de oferta, o
que leva os preços a caírem mais,
dificultando novamente a geração
de receitas em dólares para os países em crise.
Esse excesso de oferta torna-se
ainda mais agudo num contexto de
queda no crescimento ou mesmo
recessão em vários mercados importantes, nos países desenvolvidos e nos antigos emergentes.
A Ásia, por exemplo, que nas últimas duas décadas vinha funcionando como uma espécie de devorador global de commodities agrícolas, continua patinando.
A Rússia, além de ter reduzido
muito seu consumo, tornou-se
também um necessitado fornecedor de mercadorias, numa busca
desesperada por dólares.
Nesse contexto, a notícia de que
o Brasil terá uma safra agrícola recorde nesse ano, se pode ajudar no
combate à inflação, apenas piora
as coisas quando se trata de examinar as perspectivas de exportação.
Afinal, é mais oferta.
Em alguns casos, o efeito da oferta brasileira chega a ser dramático,
como no do açúcar (o país tem 14%
do mercado global). Para complicar, houve uma queda importante
no consumo de álcool combustível
na economia brasileira nos últimos anos, o que contribui para aumentar ainda mais a oferta do produto.
Voltamos assim a debates antigos, dos anos 40 e 50, quando alguns economistas denunciavam a
desigualdade fundamental do comércio entre as nações. Os pobres
exportam bens cujos preços tendem a ser vítimas do dinamismo
do próprio mercado. Enquanto isso, os países ricos dominam as
fronteiras tecnológicas da produção industrial e de serviços.
É, portanto, ótimo que estejamos
em plena fase de alívio depois da
trapalhada cambial. Mas, para melhor avaliar o seu alcance, é oportuno lembrar de velhas limitações
estruturais.
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