São Paulo, terça-feira, 28 de junho de 2005

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Juro baixo nos EUA pode se manter

EDMUND L. ANDREWS
DO "NEW YORK TIMES"

As autoridades do Fed (Federal Reserve, o banco central americano), que irão se reunir nesta semana, estão começando a suspeitar que a queda desconcertante nos juros de longo prazo é mais do que uma simples aberração temporária.
A possibilidade tem implicações importantes para a economia e, para os responsáveis pelo Fed, gera novas dúvidas sobre como devem reagir.
É quase certo que, na quinta-feira, o Fed eleve os juros de curto prazo em mais um quarto de ponto percentual, para 3,25%. Seria o nono aumento nos últimos 12 meses, e a expectativa é que o BC norte-americano assinale que vai continuar a elevar os juros em ritmo "moderado".
Mas a verdadeira discussão que terá lugar na reunião deverá girar em torno do inesperado declínio dos juros de longo prazo, que vêm mantendo os índices de hipotecas no menor nível das últimas décadas e alimentando o que muitos analistas temem que possa ser uma bolha nos preços de casas.
O presidente do Fed, Alan Greenspan, disse em fevereiro que os juros baixos de longo prazo constituem um "enigma", mas que possivelmente não passem de "aberração de curto prazo".
Agora, Greenspan e outras autoridades estão sugerindo que a mudança talvez seja mais duradoura. O que se discute é o porquê da mudança, e as teorias aventadas conduzem a conclusões inteiramente diferentes quanto à melhor maneira de reagir.
"Minha impressão é que as pessoas pensam que podemos estar diante de uma nova realidade, que isso pode ser algo fundamental e duradouro", disse Laurence H. Meyer, ex-presidente do Fed e atual vice-presidente da firma de previsões econômicas Macroeconomic Advisers.
Depondo no Congresso no início do mês, Greenspan descreveu a tendência como importante e "de origem claramente internacional". Ele acrescentou: "Estamos dedicando tempo considerável ao estudo de como integrá-la à estrutura básica subjacente da política monetária".
O prêmio por prazo -ou seja, o pagamento adicional exigido pelos investidores para cobrir a incerteza de lidar com títulos de longo prazo- se reduziu para quase nada. Os investidores parecem estar supondo que a taxa de juros chegará a 3,75% até o final do ano. Mas o rendimento dos títulos do Tesouro de dez anos continua a ser de mais ou menos 4%.
Uma linha de pensamento afirma que os rendimentos baixos dos títulos são indicativos de uma desaceleração do crescimento econômico, o que reduziria a demanda futura por crédito. Outra linha sugere que os investidores globais hoje têm expectativas de inflação menores do que no passado, o que reduz o risco dos títulos de longo prazo.
Se qualquer uma das teorias estiver correta, o Fed teria menos necessidade de combater a inflação e poderia parar de elevar os juros num nível muito mais baixo do que no passado, possivelmente abaixo dos 4%.
Mas ainda outra teoria afirma que os juros de longo prazo podem ter sido reduzidos em função de outros fatores, incluindo um "superávit de poupança" em todo o mundo e pelos esforços feitos pelos bancos centrais asiáticos para manter baixo o valor de suas moedas, para isso comprando títulos do Tesouro dos EUA.
Se isso for verdade, o fluxo de moeda estrangeira que chega aos EUA pode estar diluindo o esforço do Fed para prevenir a inflação. Isso significaria que o Fed precisaria elevar os juros mais do que prevêem muitos investidores.
Depondo diante do Congresso em 20 de junho, Greenspan manifestou ceticismo com relação às teorias baseadas nas expectativas de inflação baixa ou de desaceleração econômica próxima. "Uma disparidade estreita entre juros de curto e longo prazo freqüentemente é interpretada, erroneamente, como sinal de que estamos prestes a cair em recessão", disse. "Se for esse o caso, então a hipótese de que é a economia fraca que vem puxando os juros para baixo provavelmente não é correta."
Ele também disse que os juros baixos de longo prazo teriam contribuído para causar incertezas e podem estar alimentando pressões inflacionárias.
Outras autoridades vêm se mostrando mais otimistas. William Poole, diretor do Federal Reserve Bank de St. Louis, já afirmou em diversas ocasiões que os juros de longo prazo são movidos sobretudo pelas expectativas dos investidores em relação à inflação de longo prazo. Embora o Fed tenha elevado os juros de curto prazo, disse Poole em discurso feito em 14 de junho, no último ano os investidores não tiveram razões para prever uma inflação maior no longo prazo. "As surpresas econômicas têm sido mínimas no último ano e não há razão para rever os juros de curto prazo no futuro previsível", disse ele.
Jeffrey Lacker, presidente do Federal Reserve Bank de Richmond, sugeriu em 20 de junho que as incertezas em relação à inflação podem ser menores hoje. "É importante manter em mente que não se deve esperar que o prêmio por prazo se comporte como se comportou nos ciclos de pós-guerra, quando a inflação era irregular", disse ele. "A explicação mais provável disso é que a inflação está baixa, e as expectativas de inflação, também."
Os economistas de Wall Street estão tão divididos quanto os representantes do Fed sobre a interpretação mais acertada.
James Glassman, economista sênior do JP Morgan, afirma que os juros de longo prazo refletem os efeitos deflacionários da globalização. "Se pensarmos em termos econômicos, a Ásia oriental e o Nafta [Acordo de Livre Comércio da América do Norte] foram anexados aos EUA. Isso significa mais capacidade excedente e tempo maior para se voltar ao nível de emprego pleno."
Segundo essa interpretação, o Fed poderia parar de elevar os juros de curto prazo quando chegassem aos 3,75%. Mas outros prevêem que o Fed vai continuar a preocupar-se com pressões inflacionárias, o nível crescente da dívida externa dos EUA e o perigo de uma bolha habitacional.
Quando congressistas lhe pedem que especifique a taxa "neutra" de juros -que não acelere nem desacelere a economia-, Greenspan responde que as pessoas a reconhecerão quando a virem. Em seu depoimento mais recente, porém, acrescentou uma variante: que as pessoas a reconhecerão porque "vamos observar um certo equilíbrio não observado até agora" na economia.


Tradução de Clara Allain

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