|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Memória de crescimento, de Vargas a Lula
GESNER OLIVEIRA
Um estrangeiro que examine os números do crescimento do Brasil, mesmo sem conhecer a rica e complexa evolução histórica do país, percebe dois
fatos interessantes.
Em primeiro lugar, não é por
acaso que a era Vargas ainda esteja tão viva na memória de um
povo que normalmente não dá
muita bola para sua história. Foi
um período de mudança estrutural e institucional no qual o peso
da indústria cresceu de 19% para
24% do PIB (Produto Interno
Bruto).
As taxas de expansão do PIB registraram níveis bem mais elevados nos dois períodos de Vargas
do que nos anos FHC e Lula. O
PIB cresceu a uma taxa média de
quase 4% durante 1930-45, chamado no quadro nesta página de
Vargas 1. Lembre que tal média
inclui a recessão do início da década de 30, que resultou da Crise
de 29 nos EUA, com enorme repercussão na economia mundial
e em particular nos países exportadores de produtos primários
-como o Brasil naquela época.
No segundo governo de Vargas,
chamado de Vargas 2 no quadro,
a taxa média de expansão foi ainda maior, ao superar 6% ao ano.
Como a população crescia a um
ritmo elevado nas décadas de 30 a
50 (entre 2% e 3% ao ano), o PIB
por habitante aumentou em uma
proporção menor durante as fases
Vargas 1 e Vargas 2, mas ainda
assim em níveis que representam
mais que o dobro e o triplo daquilo que se verificou na última década. O PIB por habitante se expandiu a uma taxa anual de
0,95% no governo FHC, diminuindo para uma projeção de
0,73% nos primeiros dois anos do
governo Lula.
Em segundo lugar, nosso observador estrangeiro percebe que,
apesar de o Brasil ter crescido
muito pouco no período recente
-e em particular no governo Lula-, há uma recuperação em
curso. Diferentemente daquilo
que muitos analistas diziam, trata-se de expansão com intensidade razoável comparativamente a
outras fases de crescimento nas
últimas duas décadas.
Tal fato pode ser constatado ao
verificar o comportamento do
PIB trimestral desde 1980. O ritmo da atual recuperação é mais
forte do que as outras fases de expansão, com exceção do crescimento que se verificou logo depois
do Plano Real. No entanto essa
última fase foi abortada pelo advento da crise do México e da elevação da taxa de juros.
O gráfico compara a evolução
de diferentes períodos de expansão nesse período. É possível verificar, por exemplo, que a atual recuperação ocorre em ritmo mais
intenso do que a dos nove trimestres de expansão no período 1999-01.
No entanto, a questão central é
saber se a atual recuperação não
poderá ser frustrada em pouco
tempo em razão de fatores internos ou externos, como o petróleo.
Chama a atenção nesse sentido o
período relativamente longo -de
17 trimestres- da expansão do
segundo trimestre de 1983 até o
segundo trimestre de 1987, interrompido logo após o fracasso do
Plano Cruzado e a crise da dívida
externa. A exemplo daquilo que
ocorreu na atual fase, a retomada
do nível de atividade foi deflagrada pelo aumento das exportações,
mas permaneceram graves desequilíbrios nas contas externas e
públicas.
A mera observação dos números agregados não revela, contudo, as razões pelas quais o Brasil
não logrou apresentar desempenho comparável ao da era Vargas
ou à média do período 1930-80.
Seria preciso entender por que
não foram feitas as mudanças necessárias para crescer. Mas a dificuldade reside precisamente no
fato de que é o crescimento que
anima e viabiliza politicamente
as coalizões de mudança.
Gesner Oliveira, 48, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Comércio: Grandes redes de varejo já registram leve desaceleração Índice
|