São Paulo, sábado, 28 de setembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ENCONTRO ANUAL

Ex-vice do FMI, hoje banqueiro do Citi, diz que próximo governo terá "tempos difíceis" para evitar o calote

Piora a situação da dívida do país, diz Fischer

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

Stanley Fischer, que ocupou até o ano passado o segundo cargo mais importante do FMI (Fundo Monetário Internacional), disse ontem que o tempo conspira contra a economia brasileira. "O problema que realmente (o Brasil) defronta é que, a cada dia, a trajetória da dívida [pública" torna-se mais difícil de se sustentar e, qualquer que seja o próximo governo, ele enfrentará tempos difíceis para evitar uma reestruturação da dívida." Reestruturar significa modificar prazos e montantes da dívida a serem pagos. O termo é interpretado como calote pelos mercados financeiros.
Fischer, que ocupa hoje o cargo de vice-presidente do Citigroup (o maior conglomerado financeiro dos Estados Unidos), falou num seminário sobre globalização e América Latina, durante o encontro anual do FMI e do Banco Mundial, em Washington.
Embora Fischer tenha dito que é possível evitar o calote, o economista claramente distanciou-se do otimismo retórico da equipe econômica brasileira.
Segundo o banqueiro, a reestruturação é um cenário plausível para a economia brasileira, dependendo da dinâmica da dívida e da definição das políticas do próximo governo. "As coisas podem ficar muito ruins", disse ele. "Qualquer governo pode optar pelo "default" (calote). Qualquer governo, a qualquer momento, pode escolher isto. Além disso, se alguma coisa se torna inevitável, você tem que fazê-la. E é o fim da história. Não é obviamente inevitável neste ponto."
Fischer, que foi fiador dos pacotes do FMI ao Brasil em 1998 e 2001, comentou ainda o estudo sobre a sustentabilidade da dívida brasileira preparado no final de julho por Ilan Goldfajn, diretor de Política Econômica do BC.
Esse documento é hoje o principal instrumento do governo brasileiro para defender tecnicamente a tese de que, se a responsabilidade fiscal for mantida pelo próximo governo sob determinadas condições de mercado, a dívida brasileira é pagável.
Para Fischer, ainda é possível obter uma diferença de sete pontos percentuais entre a taxa de juros reais e o crescimento do PIB brasileiro - uma das condições descritas pelo estudo. No entanto, segundo ele, as condições de mercado pioraram muito desde que aqueles cálculos foram feitos.
"Desde que eles escreveram aquele documento, o mercado moveu-se negativamente. Ainda pode ser possível obter a diferença de sete pontos percentuais, mas está ficando mais difícil, como resultado deste período duradouro de incerteza."
Fischer afirmou que, se a reestruturação for inevitável, é melhor que ela seja feita de forma "rápida e ordenada". E acrescentou que, "se necessária", uma maior ajuda financeira "faria sentido para o Brasil e para os mercados emergentes em geral", em um cenário específico. Segundo o banqueiro, isso ocorreria "num contexto de um programa convincente de outro governo, que fortaleça as políticas com maior chance de sucesso".
Fischer disse, no entanto, que o pacote atual do FMI para o Brasil, de US$ 30,4 bilhões, foi muito bem formulado e seria suficiente, ao menos sob as atuais condições. "Se a próxima administração, seja ela qual for, assegurar os mercados esclarecendo o tipo de políticas econômicas que vai seguir, veremos a taxa de câmbio se fortalecer, o que ajuda a reduzir a probabilidade de um "default" da dívida. Poderia ser necessário um período temporário de política fiscal mais forte também."


Texto Anterior: A marretadas
Próximo Texto: Malan e Armínio dizem que estudo do BC sobre dívida é válido e atual
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.