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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Crise! Que crise?
Quando olhamos para os mercados emergentes, podemos hoje fazer uma outra indagação: que crise?
A CRISE financeira que assustou
o mundo inteiro está praticamente superada. Quem nos
mostra isso, de maneira clara, são as
taxas de juros de curto prazo nos
mercados monetários americano,
europeu e inglês. Essas taxas de financiamento privado de curto prazo subiram fortemente nos momentos mais agudos da crise. Os juros de
financiamento privado de um dia,
denominados em dólar e em euro,
chegaram a ser 0,70% mais elevados
do que a taxa equivalente nas operações com títulos do Tesouro americano, o que é uma enormidade em
relação ao que seria a condição normal de mercado.
Esse fosso entre taxas nas operações envolvendo títulos públicos e
papéis privados assustou a todos
que vivem as questões financeiras.
Para o analista de mercado é algo como uma febre de 40 graus para um
médico. O setor do mercado mais
atingido foi o de títulos de curto prazo emitidos por empresas privadas,
financeiras ou não, com ou sem garantia real. Chamados de "commercial papers", eles são um elemento
vital no processo de desintermediação financeira ocorrido nos últimos
anos. Essa fatia de mercado sofreu
de forma brutal a fuga de investidores por conta da crise e teve, além do
aumento de taxas, seu tamanho reduzido em poucos dias em mais de
US$ 300 bilhões.
Nos últimos dias, principalmente
depois da corajosa ação do Fed, esses mercados começam a voltar à racionalidade, separando o joio do trigo, com os investidores voltando a
comprar os títulos não vinculados à
aventura do segmento chamado
"subprime" residencial. É claro que
o retorno à normalidade nos mercados de crédito está se dando com
forte diferenciação e redobrada
atenção aos critérios de concessão.
A recuperação será lenta, principalmente para as modalidades mais especulativas, e com taxas de juros
mais altas, melhor refletindo o real
risco de crédito.
Entretanto, quando olhamos para
os mercados emergentes, podemos
hoje responder a uma pergunta sobre os efeitos deletérios da crise com
uma outra indagação: QUE CRISE?
Os preços dos ativos de países como
o Brasil, Turquia, África do Sul já estão em níveis iguais ou superiores
aos de antes do estouro da bomba do
"subprime". Até as Bolsas dos países
desenvolvidos recuperaram quase a
totalidade das perdas, mesmo tendo
em conta a forte queda das ações nos
setores de construção civil e consumo, no caso dos EUA. Como explicar
isso?
O otimismo com as economias
emergentes, das quais o Brasil é uma
das que provocam maior atenção,
está relacionado com a dinâmica da
economia chinesa e seus satélites
asiáticos. Essa linguagem, que parecia ter sido enterrada pela queda do
Muro de Berlim, começa novamente a aparecer com a emergência como QUASE POTÊNCIA da China. O
crescimento da China tem mudado
a face da economia global, pelo efeito em preços relativos de commodities e a persistente -e ainda viva-
força deflacionista em número cada
vez maior de cadeias industriais. Os
países emergentes têm sido beneficiados de forma geral, assim como
qualquer setor, em qualquer país,
que esteja exposto a essa dinâmica.
Há uma tendência de descolamento
em relação aos EUA que tem se
mostrado incrivelmente firme. Se a
economia norte-americana não entrar em recessão -minha hipótese
central-, nesses próximos três trimestres a festa dos mercados emergentes parece já estar contratada.
Para alguns, é a próxima bolha especulativa que vai ser criada...
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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