São Paulo, sexta-feira, 28 de setembro de 2007

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Crise! Que crise?

Quando olhamos para os mercados emergentes, podemos hoje fazer uma outra indagação: que crise?

A CRISE financeira que assustou o mundo inteiro está praticamente superada. Quem nos mostra isso, de maneira clara, são as taxas de juros de curto prazo nos mercados monetários americano, europeu e inglês. Essas taxas de financiamento privado de curto prazo subiram fortemente nos momentos mais agudos da crise. Os juros de financiamento privado de um dia, denominados em dólar e em euro, chegaram a ser 0,70% mais elevados do que a taxa equivalente nas operações com títulos do Tesouro americano, o que é uma enormidade em relação ao que seria a condição normal de mercado.
Esse fosso entre taxas nas operações envolvendo títulos públicos e papéis privados assustou a todos que vivem as questões financeiras.
Para o analista de mercado é algo como uma febre de 40 graus para um médico. O setor do mercado mais atingido foi o de títulos de curto prazo emitidos por empresas privadas, financeiras ou não, com ou sem garantia real. Chamados de "commercial papers", eles são um elemento vital no processo de desintermediação financeira ocorrido nos últimos anos. Essa fatia de mercado sofreu de forma brutal a fuga de investidores por conta da crise e teve, além do aumento de taxas, seu tamanho reduzido em poucos dias em mais de US$ 300 bilhões.
Nos últimos dias, principalmente depois da corajosa ação do Fed, esses mercados começam a voltar à racionalidade, separando o joio do trigo, com os investidores voltando a comprar os títulos não vinculados à aventura do segmento chamado "subprime" residencial. É claro que o retorno à normalidade nos mercados de crédito está se dando com forte diferenciação e redobrada atenção aos critérios de concessão.
A recuperação será lenta, principalmente para as modalidades mais especulativas, e com taxas de juros mais altas, melhor refletindo o real risco de crédito.
Entretanto, quando olhamos para os mercados emergentes, podemos hoje responder a uma pergunta sobre os efeitos deletérios da crise com uma outra indagação: QUE CRISE?
Os preços dos ativos de países como o Brasil, Turquia, África do Sul já estão em níveis iguais ou superiores aos de antes do estouro da bomba do "subprime". Até as Bolsas dos países desenvolvidos recuperaram quase a totalidade das perdas, mesmo tendo em conta a forte queda das ações nos setores de construção civil e consumo, no caso dos EUA. Como explicar isso?
O otimismo com as economias emergentes, das quais o Brasil é uma das que provocam maior atenção, está relacionado com a dinâmica da economia chinesa e seus satélites asiáticos. Essa linguagem, que parecia ter sido enterrada pela queda do Muro de Berlim, começa novamente a aparecer com a emergência como QUASE POTÊNCIA da China. O crescimento da China tem mudado a face da economia global, pelo efeito em preços relativos de commodities e a persistente -e ainda viva- força deflacionista em número cada vez maior de cadeias industriais. Os países emergentes têm sido beneficiados de forma geral, assim como qualquer setor, em qualquer país, que esteja exposto a essa dinâmica.
Há uma tendência de descolamento em relação aos EUA que tem se mostrado incrivelmente firme. Se a economia norte-americana não entrar em recessão -minha hipótese central-, nesses próximos três trimestres a festa dos mercados emergentes parece já estar contratada.
Para alguns, é a próxima bolha especulativa que vai ser criada...


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).

lcmb2@terra.com.br


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