São Paulo, domingo, 28 de setembro de 2008

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Sem crédito, empresas reavaliam projetos

Intensificação da crise financeira internacional interrompe grandes operações de financiamento para investimentos no país

Governo sustenta tese de que BNDES vai atender a demanda, mas mercado diz que banco não tem como substituir recursos privados

AGNALDO BRITO
DENYSE GODOY
TONI SCIARRETTA

DA REPORTAGEM LOCAL

A crise financeira internacional diminuiu brutalmente a disponibilidade de crédito no mercado brasileiro e está forçando a reavaliação de projetos e investimentos por parte das empresas. A situação neste momento levou à interrupção quase total no andamento das negociações. O recente período de intensa liquidez de capital, que gerou disputas por projetos financiáveis, deu lugar, nas últimas semanas, a um ambiente de completa desconfiança e de semiparalisia.
Diante da indefinição do cenário internacional, apenas empreendimentos urgentes e considerados de altíssima qualidade estão conseguindo fechar as negociações para obtenção de crédito. As instituições, entretanto, estão pedindo um preço alto para garantir aval financeiro.
O governo tem refutado a avaliação de que o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) será atingido com a restrição de crédito internacional, mas sabe que, se de um lado pode irrigar o caixa do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para a concessão de créditos para investimentos, do outro não tem muito o que fazer em relação à situação dos financiadores privados.
Uma parte dos financiamentos para obras do PAC virá da contrapartida das empresas, seja com a alocação de recursos próprios nos projetos, seja tomando recursos no mercado financeiro. O BNDES informa que tentará suprir a demanda por crédito e prevê gastar R$ 85 bilhões neste ano. Já anunciou também que dispõe de mais R$ 30 bilhões para começar 2009. A expectativa é que a circulação do dinheiro volte logo.
Segundo o executivo de um importante banco, só um bem-sucedido pacote de ajuda nos Estados Unidos pode tirar do imobilismo atual o mercado de crédito. Ele disse à Folha que nem o melhor projeto de infra-estrutura no Brasil neste momento conseguirá financiamento, dada a desconfiança.
Para Marcelo Salomon, economista-chefe do Unibanco, o período de incertezas só passará quando houver maior definição sobre como serão os preços dos títulos resgatados nos EUA. "Essa restrição de liquidez vai continuar muito forte. Há uma incerteza generalizada que está abraçando o sistema financeiro. E essa incerteza vem da principal economia do mundo. A gente continua sofrendo uma volatilidade importada", disse.
Segundo Aldo Mendes, vice-presidente financeiro do Banco do Brasil, a baixa liquidez internacional afetou os mercados como um todo, mas não chegou a adiar os projetos maiores. A maior parte do dinheiro captado pelo banco vem de operações compromissadas, nas quais são entregues títulos do governo em troca de dólares.
Mendes afirma que o BB costuma falar com cerca de 50 a 60 instituições estrangeiras todos os dias e percebeu que o pouco dinheiro atualmente disponível está mais caro e com prazos muito curtos. O banco tem uma vantagem competitiva, que é a captação internacional no varejo por suas agências na Ásia e na Europa.
Por esse motivo, o BB recebeu mais demanda de crédito por parte das empresas que tiveram pedidos negados em outros bancos. Para Mendes, a expectativa do BB é que a situação se resolva em até três semanas. "A crise passa daqui a pouco. Então, é só administrar essa demanda", disse.

Mercado fechado
E se o freio no crédito perdurar mais? Em São Paulo, um megaplano de concessões rodoviárias já tem data marcada e está sob risco. No dia 29 de outubro, o governo paulista leiloa cinco corredores rodoviários no Estado. As empresas correm para obter linhas de crédito que somam R$ 3,47 bilhões para o pagamento da concessão.
A pouco mais de um mês do leilão, o mercado está completamente fechado. "Estou tentando marcar reunião com um fundo, para negociar financiamento de R$ 200 milhões para uma empresa participar de um leilão, mas não consigo", diz Erotides Guimarães, diretor da Vae Consultores.
Como o BNDES financia investimentos, mas não a outorga, as empresas não têm outra opção a não ser os bancos privados. O secretário dos Transportes de São Paulo, Mauro Arce, não descarta a suspensão do leilão das rodovias.
Para piorar a situação, as empresas voltaram a se preocupar com o risco cambial. Segundo Sidnei Nehme, diretor da corretora de câmbio NGO, a disparada do dólar decorre da retração das linhas internacionais e do forte movimento especulativo no mercado futuro. Os efeitos sobre Sadia e Aracruz são reflexos desse problema.
Outro efeito já previsto será o corte nos investimentos em P&D. Para Ricardo Mendes, sócio-diretor da Consultoria Prospectiva, a aplicação em pesquisa e em desenvolvimento é invariavelmente a primeira a ser atingida com a restrição de capital.


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