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São Paulo, domingo, 28 de dezembro de 2003

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CONFLITO TRABALHISTA

Levantamento do tribunal mostra que 15% dos recursos em tramitação envolvem instituições financeiras

Bancos lideram ranking de processos no TST

CLAUDIA ROLLI
MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Cinco entre os dez empregadores campeões de reclamação trabalhista no TST (Tribunal Superior do Trabalho) são instituições financeiras. Esses cinco bancos respondem por 25 mil ações individuais e coletivas, que, juntas, representam 15% dos processos em tramitação atualmente no tribunal -165.342 em dezembro.
No TST, a chamada 3ª instância da Justiça do Trabalho, chegam duas entre dez ações de empregados e patrões que não conseguiram resolver seus conflitos em instâncias inferiores -Varas do Trabalho (1ª) e Tribunais Regionais do Trabalho (2ª).
"Quem tem maior poder econômico segura a ação até a terceira instância", diz o ministro Vantuil Abdala, vice-presidente do TST. "As instituições financeiras têm sempre grandes advogados orientados para resistir [ao pagamento do débito trabalhista] até a última instância."
Encabeçam a lista do tribunal, divulgada pela primeira vez, o Banco do Brasil, com 9.437 reclamações, e a Caixa Econômica Federal, com 5.929 ações. Em terceiro lugar no ranking está a fabricante de veículos Fiat (4.506). Em seguida, aparecem Petrobras (3.975), Companhia Estadual de Energia Elétrica (3.621), Banespa (3.527), Unibanco (3.117), INSS (3.041), Bradesco (2.976) e Rede Ferroviária Federal S.A. (2.850).
Além dessas cinco instituições financeiras, outros 14 bancos aparecem na lista dos 50 empregadores com mais ações trabalhistas. Entre eles estão: Santander (18º), ABN Amro Real (27º), Itaú (32º) e HSBC (38º). As reclamações envolvendo esses 14 bancos representam 45% do total de ações desses empregadores (92.290).

Juros "light"
Um dos principais motivos para os empregadores adiarem o pagamento dos débitos é o fato de a Justiça do Trabalho cobrar juros menores do que as ações que não têm natureza trabalhista, avaliam advogados de trabalhadores e alguns juízes.
"Hoje, quase se tornou um bom negócio deixar para pagar por último a dívida do trabalhador", diz o vice-presidente do TST. Na Justiça do Trabalho, as ações são corrigidas com juros de 1% ao mês mais correção monetária pela TR (Taxa Referencial). Na Justiça Federal, os índices acompanham a taxa Selic -16,5% ao ano.
"O Brasil é um país tão maluco que perder o processo é mais barato. Os empregadores já colocaram as contas [referentes ao pagamento das ações trabalhistas] na ponta do lápis: é mais barato deixar o processo correr do que reconhecer e pagar a dívida", afirma o advogado e presidente da Associação Latino-americana de Advogados Trabalhistas, Luis Carlos Moro.
O advogado trabalhista Amílcar Aquino Navarro, conselheiro da seccional paulista da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), afirma que os bancos fazem estudos econômicos, de viabilidade financeira, e "descobrem que vale mais a pena protelar o pagamento de ações trabalhistas e deixar o dinheiro render".
A Febraban (Federação Brasileira dos Bancos) informa que não existe uma orientação aos bancos para protelar os conflitos trabalhistas até a última instância do Judiciário.
Por essa razão, a Justiça do Trabalho defende a adoção da taxa Selic para corrigir os débitos trabalhistas. O projeto de lei nº 4.696, proposto pelo ministro Vantuil Abdala para alterar a cobrança de juros, aguarda a votação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal.
"A nossa proposta é que os juros na fase normal da ação sejam equivalentes a todos os outros. Já na fase de execução, ou seja, após a condenação definitiva do réu, os juros devem ser duplicados", diz o vice-presidente do Tribunal Superior do Trabalho. "A cobrança em dobro tende a evitar o retardamento do pagamento devido ao empregado."
O pagamento de horas extras e a equiparação salarial aparecem como os principais motivos das reclamações trabalhistas que chegam à terceira instância. O TST estima que 80% das ações trabalhistas referentes ao sistema financeiro são relativas a horas extras trabalhadas e não-pagas.
Isso porque a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) garante aos bancários jornada de seis horas e aos funcionários com cargo de confiança (como gerentes e chefes de seção), jornada de oito horas diárias. "O problema é que todo mundo é registrado como gerente", afirma Moro.
A Febraban (Federação Brasileira dos Bancos) estima que 50% dos empregados do sistema financeiro ocupem cargos de confiança e defende a alteração da lei que garante a jornada reduzida aos bancários (veja ao lado).
Entre os demais motivos que aparecem nas ações trabalhistas em tramitação no TST estão ainda pedidos de complementação de aposentadoria -o trabalhador reivindica o mesmo valor do salário da ativa-, terceirização, adicional de insalubridade e passivo trabalhista em razão de falência.

Lentidão
A demora de anos para resolução de conflitos trabalhistas não ocorre só no setor financeiro.
O coordenador-geral da FUP (Federação Única dos Petroleiros), Antônio Carrara, afirma que "já aconteceu de se resolver conflitos nas primeiras instâncias, mas é muito raro".
"A maior parte dos trabalhadores da Petrobras que recorre à Justiça do Trabalho leva anos para receber o que é seu direito. Muitas pessoas acabam retirando uma ação contra a empresa para conseguir uma promoção, por exemplo", diz Carrara.
Na opinião do sindicalista, a maior parte das ações coletivas contra a Petrobras, movidas por sindicatos de trabalhadores, são pedidos de expurgos de planos econômicos.
"No caso dos processos individuais, a maioria é motivada pelo fato de a empresa ter mudado sua dinâmica de promoções e aumentos por mérito [espécie de plano de carreira]." Nos últimos meses, afirma Carrara, a direção da estatal tem dado maior abertura aos sindicatos para conversas sobre as reclamações.
O objetivo do TST, ao divulgar a lista, diz o ministro Abdala, é agilizar a resolução dos conflitos. "Ao constatar que existe um grande número de ações envolvendo uma empresa, podemos tomar algumas medidas para evitar essas ações e tentar a conciliação."



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