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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Comendo no prato em que cuspiram
As regras de leilões de 3G e os altos ágios foram os mesmos de há dez anos, só que desta vez não houve denúncias
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ESCREVO hoje minha última
coluna de 2007. Peço ao meu
leitor que me permita um desabafo, colocando para fora um sentimento que me acompanhou solitário neste ano que agora termina. A
gota d'água que fez transbordar minha indignação foi o resultado do
leilão de licenças para explorar a
chamada terceira geração da telefonia celular. Um sucesso incrível,
com uma disputa acirrada entre as
empresas privadas que já operam no
Brasil. A intensa disputa levou a
ágios expressivos em relação ao preço mínimo fixado pela Anatel
(Agência Nacional de Telecomunicações) e rendeu quase R$ 6 bilhões
para o Tesouro Nacional. Lula não
perdeu tempo para se pavonear desse sucesso de seu governo.
A exploração do serviço celular
nos moldes mais avançados da tecnologia disponível -chamada de
3G- abre um período de significativos investimentos na área das telecomunicações. A criação de novos
serviços e o desenvolvimento de
produtos mais sofisticados abrem
um novo espaço para que o governo
arrecade mais impostos e para que
os brasileiros encontrem novas possibilidades de emprego em setores
de altos salários. A sociedade como
um todo vai ganhar com essa nova
fronteira econômica e tecnológica
que se abre diante de nós.
As regras dos leilões dos celulares
3G seguiram os padrões estabelecidos em 1997 e 1998 pelo governo
Fernando Henrique Cardoso e seu
ministro Sérgio Motta. Exploração
privada de freqüências de telecomunicações, obedecendo as cláusulas
pétreas da concorrência e da universalização dos serviços. Nenhuma
mudança em relação ao roteiro que
presidiu a privatização do monopólio estatal da antiga Telebrás. Inclusive o mecanismo de colocar em
uma mesma licença regiões mais
pobres e mais ricas é o mesmo usado
dez anos antes.
A única diferença de agora é que
não ocorreram as denúncias de entrega de serviços públicos à sanha
dos interesses privados. Também
estiveram ausentes as milhares de
ações populares e civis, patrocinadas por sindicatos e líderes de movimentos sociais ligados ao PT, contra a "entrega do patrimônio público".
Até a grande mentira que ainda é repetida hoje sobre os preços de banana está embutida nos valores pagos
pelas concessionárias privadas agora. Os ágios elevados seriam -na linguagem de uma década atrás- uma
prova de que os preços mínimos estabelecidos eram baixos demais.
Uma observação que precisa ser
lembrada aqui é que nos leilões de
agora o Brasil já tem um mercado de
celulares conhecido e representado
por mais de 135 milhões de terminais em operação. Em 1997 e 1998,
quando a privatização foi realizada,
os celulares eram apenas símbolos
caríssimos de status e o potencial
desse mercado ainda era uma grande incógnita. Com a passagem de
um monopólio estatal para um sistema com intensa competição e regras draconianas de universalização
forçada, introduzia-se uma incerteza muito grande para que os interessados pudessem avaliar os preços a
serem pagos nos leilões. Mesmo assim, ocorreram ágios expressivos e
intensa disputa pelas 12 empresas
privatizadas.
A privatização da Telebrás, demonizada até hoje na oratória petista,
foi a origem do sucesso desse grande
programa de modernização do nosso setor de telecomunicações de
massa. A entrada em serviço, agora
no governo Lula, de um novo padrão
tecnológico, é apenas mais uma etapa dessa caminhada corajosa iniciada dez anos atrás.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS , 64, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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