|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
VINICIUS TORRES FREIRE
Sem números, está lindo
Reforma tributária de Lula parece razoável e consensual. Mas falta explicar os números e dizer quem pagará a conta
É MUITO BOM que o governo Lula pareça empenhado na reforma tributária. Planos de
mudanças institucionais relevantes
haviam se tornado raridade nos últimos três anos, por aí. De resto, a linha geral do projeto de mudança faz
sentido e reflete o senso comum na
praça. Mas quede os números?
Quem vai ceder quanto a quem?
O primeiro problema de reformas
dos impostos no Brasil é a fragmentação federativa de poderes tributários. União, Estados e mais de 5.000
cidades têm poderes e interesses tão
entrincheirados que abortaram as
tentativas de mudança depois da ditadura e da Constituição de 1988.
O ICMS é uma barafunda que encarece negócios, prejudica exportações, propicia fraudes e ilegalidades
oficializadas à base do grito e do favor políticos, além de estabelecer
pelo país variações de alíquotas quase, digamos, feudais. A reforma colocaria ordem nisso. Alguns Estados,
porém, vão perder dinheiro, em geral para regiões mais pobres. O governo diz que compensará a perda,
ao menos num período de transição.
Estranhamente, está todo mundo
quieto, governadores em especial. A
gente poderia imaginar que Lula já
acertou os ponteiros com os Estados. Não foi o caso. Os governadores
de Estados mais ameaçados de perda de receita estão esperando números e detalhes para reclamar.
Quais números? O governo propôs a criação de um Fundo de Equalização de Receitas para compensar
as perdas dos Estados que "exportam" para outras partes do Brasil.
Tal fundo depende de lei complementar à reforma. Vai dar rolo.
De quanto será o fundo? Como será financiado? Quem vai geri-lo? Como serão calculadas as perdas e como será a distribuição do dinheiro?
Vai ser objeto de disputa política, ou
quase isso, como a Lei Kandir?
A fim de simplificar o sistema e reduzir custos administrativos (e fraudes) nas empresas, o governo pretende unificar tributos federais. O
dinheiro de Cofins, PIS, Cide e salário-educação será cobrado via IVA.
A CSLL virá por meio do Imposto de
Renda das empresas. Quais as alíquotas? Ou, ao menos, qual o método para calibrar a receita? Em geral,
quando governos mudam o modo de
cobrança de tributos, chutam as alíquotas para cima, a fim de não perder dinheiro. Num primeiro momento, pode ser prudente. Mas vai
haver uma norma para "devolver" o
eventual excesso de arrecadação?
Outro problema difícil é a redução
de impostos sobre a folha de salários. Trata-se de mudança essencial
para aumentar a formalização do
trabalho (e assim também a proteção social dos trabalhadores). O governo propõe reduzir em um terço o
peso desses impostos. Mas não sabemos como a Previdência Social
será compensada pela perda de receita, que de resto terá de ser reposta
por algum imposto cuja arrecadação
esteja correlacionada com as variações do mercado de trabalho.
Por fim, o governo quer fazer média. Começou com a história de mudança no Imposto de Renda da pessoa física. Quanto mais se mexer,
mais difícil aprovar a reforma, técnica e politicamente. Seria um avanço
enorme dar cabo da confusão do
ICMS, unificar impostos federais e
reduzir a tributação sobre a folha de
salários. Se começar a perfumaria
demagógica, a coisa não anda.
vinit@uol.com.br
Texto Anterior: Redução do IR pessoa física está indefinida Próximo Texto: Projeto eleva carga fiscal, diz tributarista Índice
|