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MARTIN FELDSTEIN
Queda do dólar é teste global
A boa notícia é que a
poupança dos domicílios
norte-americanos está
começando a subir
Recentes declarações vindas
de líderes do G7 e do Fundo
Monetário Internacional colocam em destaque a crescente
pressão pela redução do imenso déficit internacional dos Estados Unidos. Fazê-lo requereria tanto uma
elevação no índice de poupança norte-americana como um valor mais
competitivo para o dólar. Mas nenhuma das duas coisas seria suficiente por si só.
O déficit em conta corrente dos
EUA chegou aos US$ 900 bilhões
anuais no final de 2005, o equivalente a 7% do PIB (Produto Interno
Bruto) do país. Esse enorme desequilíbrio reflete o fato de que o investimento dos EUA excede a poupança interna em 7% do PIB. Reduzir o déficit comercial dos EUA a um
patamar sustentável requereria
substancial elevação da poupança
interna.
A boa notícia é que a poupança dos
domicílios norte-americanos está
começando a subir, e é provável que
a tendência ganhe ímpeto em 2007.
O índice de poupança começou a
cair no começo dos anos 90, com o
aumento do consumo domiciliar em
resposta ao patrimônio ascendente,
tendência inicialmente gerada pela
alta nos mercados de ações e, posteriormente, por um aumento de
100% no valor das residências. Mais
recentemente, esse efeito patrimonial foi reforçado pela alta no número de hipotecas renegociadas com a
queda nos juros.
Os domicílios conseguiram extrair trilhões de dólares em dinheiro
para gastos devido ao aumento do
valor patrimonial das casas. Parte
substancial desse montante foi destinada ao consumo.
As forças que reduziram o índice
de poupança dos EUA estão agora
sendo revertidas. Os preços da habitação em todo o país vêm caindo em
relação ao pico do terceiro trimestre
de 2005. O Federal Reserve (Fed, o
banco central dos EUA) reverteu
sua política de baixas taxas de juros,
fazendo com que os juros subissem
em quase um ponto percentual nos
últimos 12 meses. O volume de refinanciamento de hipotecas caiu 20%
ante o registrado em 2005. É apenas
questão de tempo para que o índice
de poupança domiciliar retorne ao
nível de 2,4%, registrado em 2002.
Para converter essa poupança
mais elevada em redução no déficit
em conta corrente, será preciso ampliar as exportações e promover
uma alteração nos padrões de consumo dos norte-americanos, priorizando produtos e serviços nacionais
em detrimento dos importados. A
queda do dólar oferecerá incentivo
suficiente para que essas duas mudanças aconteçam.
As forças naturais de mercado já
estão fazendo com que o dólar caia
diante do euro, do iene e de outras
divisas. A queda do dólar responde
ao diferencial cada vez menor entre
as taxas de juros dos EUA e as que vigoram na Europa e Japão. Reflete
também uma alteração no foco do
mercado, que está se voltando das
condições cíclicas de curto prazo ao
desequilíbrio nos fundamentos do
comércio externo.
A experiência ensina que um dólar mais competitivo é capaz de reduzir de maneira substancial o déficit comercial. Uma redução no déficit dos EUA significará uma queda
nas exportações de nossos parceiros
comerciais em todo o mundo. Os
países que perderão exportações
precisam adotar políticas que estimulem os gastos domésticos, a fim
de prevenir uma queda em seu PIB e
nível de emprego.
Determinar onde isso tudo vai
acabar dependerá não só de forças
de mercado mas também de políticas governamentais e das atitudes
dos bancos centrais da Europa e da
Ásia. Seria tentador para eles, mas
errado, resistir ao declínio do desequilíbrio no comércio externo norte-americano por meio de uma
combinação de política monetária e
intervenções nos mercados de câmbio para impedir que o dólar atinja
um nível competitivo.
Sem um dólar competitivo, o índice de poupança americano mais elevado significará crescimento mais
lento e desemprego mais alto nos
EUA. Caso isso aconteça, o processo
político norte-americano pode resultar em medidas protecionistas.
Em lugar de tentar resistir à queda
do dólar, os governos da Europa e da
Ásia deveriam se concentrar em determinar medidas que mantenham
a demanda agregada em suas economias, à medida que as exportações
em seus países começarem a cair.
Resolver os maciços desequilíbrios comerciais sem uma desaceleração cíclica mundial é possível, mas
apenas se os países abordarem esse
desafio de maneira construtiva.
MARTIN FELDSTEIN é professor de economia na Universidade Harvard. Este artigo foi publicado originalmente
pelo Financial "Times"
Excepcionalmente, hoje, a coluna de MARCOS CINTRA não
é publicada.
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