São Paulo, segunda-feira, 29 de junho de 2009

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BCs confessam perplexidade com a crise

Relatório do BIS coloca em dúvida sinais atuais de recuperação e mostra preocupação com as economias emergentes

Banqueiros centrais afirmam que melhora depende de retomada do comércio e de fluxos de capital, ainda em retração

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BASILEIA

A rainha Elizabeth da Inglaterra está vingada. Quando se agravou a crise global, no final do ano passado, ela chamou os especialistas da mitológica London School of Economics para perguntar-lhes como é que ninguém antecipara a catástrofe que estava a caminho.
Nove meses depois, os banqueiros centrais do planeta, responsáveis teóricos por evitar a catástrofe ou, ao menos, por antecipá-la, entendê-la e dar resposta a uma leiga como a rainha, repetem exatamente a pergunta dela: "Como pôde ocorrer algo assim? Ninguém imaginou que o sistema financeiro pudesse vir abaixo" são as duas primeiras frases do caudaloso relatório anual a ser divulgado hoje, ao término da Assembleia-Geral do BIS (o Banco de Compensações Internacionais). É um texto assinado pelos homens que, em tese, são pagos para evitar que o sistema financeiro venha abaixo.
Pior: nove meses depois da quebra do banco Lehman Brothers, momento em que "o sistema financeiro mundial se encontrava à beira do colapso", os banqueiros centrais não se recuperaram de todo da perplexidade demonstrada ante a avalanche. O mais conclusivo que podem dizer, no relatório, é que "a recuperação chegará, cedo ou tarde, mas, enquanto isso, há riscos importantes".
Ou, como prefere Mario Draghi, presidente do BC italiano e também do Conselho de Estabilidade Financeira, a instituição que reúne os principais BCs e teve seu papel contra crises reforçado durante a cúpula do G20 de abril em Londres: "Estamos mais ou menos de volta ao ponto em que estávamos antes [da quebra] do Lehman Brothers, mas não ainda ao ponto antes do início da crise".
Completa o relatório do BIS: "Para que se possa recuperar plenamente a confiança, primeiro será preciso reconstruir o sistema financeiro".
Qual é o ponto da situação nessa área? Responde Henrique Meirelles, o presidente do BC brasileiro: "Os bancos ainda não chegaram a um ponto em que tenham capital suficiente e ainda não absorveram todas as perdas, para voltar a emprestar ao conjunto da economia".
E no Brasil? "Os créditos já estão aumentando, mas ainda não estão totalmente normalizados", responde Meirelles. Mais: "O aumento da taxa de empréstimos é bastante inferior ao do período pré-crise e a custos mais elevados".
Segundo ponto para se falar de recuperação: "A economia precisa mostrar sinais convincentes de recuperação, que não existem", diz Draghi.
Já o relatório apresenta outros argumentos para relativizar as perspectivas de recuperação. Diz o texto que "a experiência do século 20 demonstra que, para que se produza uma recuperação econômica vigorosa em escala mundial, será necessária uma expansão do comércio". Acontece que a Organização Mundial do Comércio acaba de prever que, em vez de expansão, haverá uma retração de 16% no comércio global.
Mesmo no caso dos países emergentes, supostamente mais equipados para sair mais rápido da crise, o relatório tem cautelas. "As perspectivas para os emergentes carregam bastante incerteza. As previsões de consenso de crescimento do PIB para a maioria das grandes economias emergentes são negativas, com exceção de China e Índia. Prevê-se que o crescimento não volte a ser positivo para a maioria delas até 2010".
Ressalva adicional: "O caminho da recuperação dependerá também do ritmo em que os fluxos internacionais de capital, que tão importantes foram para o crescimento [dos emergentes], se reponham de sua aguda retração em 2008".


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