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BCs confessam perplexidade com a crise
Relatório do BIS coloca em dúvida sinais atuais de recuperação e mostra preocupação com as economias emergentes
Banqueiros centrais afirmam que melhora depende de retomada do comércio e de fluxos de capital, ainda em retração
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BASILEIA
A rainha Elizabeth da Inglaterra está vingada. Quando se
agravou a crise global, no final
do ano passado, ela chamou os
especialistas da mitológica
London School of Economics
para perguntar-lhes como é
que ninguém antecipara a catástrofe que estava a caminho.
Nove meses depois, os banqueiros centrais do planeta,
responsáveis teóricos por evitar a catástrofe ou, ao menos,
por antecipá-la, entendê-la e
dar resposta a uma leiga como a
rainha, repetem exatamente a
pergunta dela: "Como pôde
ocorrer algo assim? Ninguém
imaginou que o sistema financeiro pudesse vir abaixo" são as
duas primeiras frases do caudaloso relatório anual a ser divulgado hoje, ao término da Assembleia-Geral do BIS (o Banco de Compensações Internacionais). É um texto assinado
pelos homens que, em tese, são
pagos para evitar que o sistema
financeiro venha abaixo.
Pior: nove meses depois da
quebra do banco Lehman Brothers, momento em que "o sistema financeiro mundial se encontrava à beira do colapso", os
banqueiros centrais não se recuperaram de todo da perplexidade demonstrada ante a avalanche. O mais conclusivo que
podem dizer, no relatório, é que
"a recuperação chegará, cedo
ou tarde, mas, enquanto isso,
há riscos importantes".
Ou, como prefere Mario Draghi, presidente do BC italiano e
também do Conselho de Estabilidade Financeira, a instituição que reúne os principais BCs
e teve seu papel contra crises
reforçado durante a cúpula do
G20 de abril em Londres: "Estamos mais ou menos de volta
ao ponto em que estávamos antes [da quebra] do Lehman
Brothers, mas não ainda ao
ponto antes do início da crise".
Completa o relatório do BIS:
"Para que se possa recuperar
plenamente a confiança, primeiro será preciso reconstruir
o sistema financeiro".
Qual é o ponto da situação
nessa área? Responde Henrique Meirelles, o presidente do
BC brasileiro: "Os bancos ainda
não chegaram a um ponto em
que tenham capital suficiente e
ainda não absorveram todas as
perdas, para voltar a emprestar
ao conjunto da economia".
E no Brasil? "Os créditos já
estão aumentando, mas ainda
não estão totalmente normalizados", responde Meirelles.
Mais: "O aumento da taxa de
empréstimos é bastante inferior ao do período pré-crise e a
custos mais elevados".
Segundo ponto para se falar
de recuperação: "A economia
precisa mostrar sinais convincentes de recuperação, que não
existem", diz Draghi.
Já o relatório apresenta outros argumentos para relativizar as perspectivas de recuperação. Diz o texto que "a experiência do século 20 demonstra
que, para que se produza uma
recuperação econômica vigorosa em escala mundial, será
necessária uma expansão do
comércio". Acontece que a Organização Mundial do Comércio acaba de prever que, em vez
de expansão, haverá uma retração de 16% no comércio global.
Mesmo no caso dos países
emergentes, supostamente
mais equipados para sair mais
rápido da crise, o relatório tem
cautelas. "As perspectivas para
os emergentes carregam bastante incerteza. As previsões de
consenso de crescimento do
PIB para a maioria das grandes
economias emergentes são negativas, com exceção de China e
Índia. Prevê-se que o crescimento não volte a ser positivo
para a maioria delas até 2010".
Ressalva adicional: "O caminho da recuperação dependerá
também do ritmo em que os
fluxos internacionais de capital, que tão importantes foram
para o crescimento [dos emergentes], se reponham de sua
aguda retração em 2008".
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